Senado reage à Medida Provisória que reonera 17 maiores setores da economia

Pacheco convoca reunião com líderes para tratar do assunto. Será o primeiro embate do ano com o Executivo
Senador Efraim Filho, líder do União Brasil no Senado, cochicha com o presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG)

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O presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), começa a cumprir o que prometeu: acionou a consultoria legislativa da Casa e convocou uma reunião semipresencial com todos os líderes partidários para o dia 9 de janeiro. Com base no parecer encomendado, ele abrirá a reunião e contabilizará a opinião de cada um dos caciques sobre o destino da Medida Provisória (MP) enviada pelo governo no apagar das luzes de 2023. Amedida reonera os 17 setores da economia que mais empregam no Brasil, surpreendendo até partidos aliados. ‘’A decisão será no voto’’’, prometeu

Na semana passada, Pacheco deu a primeira pista do que será o primeiro embate entre o Poder Legislativo com o Executivo, mesmo em pleno recesso de final de ano.

Desde que assumiu o comando do país, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) insiste em enviar ao Congresso Nacional uma quantidade recorde de medidas provisórias — prerrogativa especial do Executivo que deve ser usada apenas em condições especiais.

As normas sobre edição de Medida Provisória (MP) estão no artigo 62 da Constituição Federal. Ela é um instrumento com força de lei, adotado pelo presidente da República, em casos de relevância e urgência para o país. Produz efeitos imediatos. Ou seja, passa a valer ao mesmo tempo em que tramita no Congresso, mas depende de aprovação da Câmara e do Senado para que seja transformada definitivamente em lei.

O prazo de vigência da MP é de 60 dias, prorrogável uma vez por igual período. Depois do 45º dia da publicação, se não tiver sido votada, a MP tranca a pauta de votações da Casa em que estiver tramitando. Na Câmara, o trancamento ocorre se a MP já tiver sido votada na comissão mista e lida no Plenário. Sem isso, considera-se que não chegou à Casa, já que a comissão mista é um órgão do Congresso Nacional e não da Câmara.

Ao chegar ao Congresso Nacional, a medida provisória é analisada por uma comissão mista — formada por deputados e senadores — que vai aprovar um parecer sobre ela. Se o texto original for alterado, a MP passa a tramitar como projeto de lei de conversão.

Aprovado o parecer na comissão mista, o texto segue para o Plenário da Câmara e, em seguida, para o Plenário do Senado. Depois de aprovada nas duas Casas, se houver projeto de lei de conversão, ele deve ser enviado à Presidência da República para sanção. O presidente tem a prerrogativa de vetar o texto parcial ou integralmente, caso discorde de eventuais alterações feitas no Congresso. O prazo é de até 15 dias.

Caso a MP seja aprovada sem alteração pela Câmara ou pelo Senado, ela é promulgada pelo Congresso Nacional, sem exigência de sanção presidencial.

Mas no caso da MP que reonera os 17 maiores setores econômicos que mais empregam no país, a solução que virá da reunião no próximo dia 9 de janeiro é ainda mais radical: devolver a proposta ao Executivo. Pelo menos é o que defendem alguns líderes partidários com temperamento mais equilibrado:

“A edição da medida provisória contraria uma decisão do Congresso Nacional, tomada por ampla maioria em ambas as Casas. Certamente enfrentará resistências desde a sua largada. Já encaminhamos ao gabinete do ministro da Fazenda o sentimento de que o ideal é que essas propostas venham por projeto de lei, até mesmo com urgência constitucional. Porque dá prazo e tempo para que o diálogo possa acontecer”, disse o senador Efraim Filho (União-PB), autor do Projeto de Lei n° 334/2023, que prorroga até 2027 a desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia.

Mesmo derrotado duas vezes, governo insiste

Enviando uma enxurrada recorde de medidas provisórias ao Congresso Nacional, a prática do governo tem irritado os congressistas: “Esse governo, como não tinha nenhuma ideia do que faria se ganhasse as eleições, o que acabou acontecendo por pequena margem de votos. [Agora] Acha que vai colar governar o Brasil de costas para o Parlamento, editando medidas provisórias sem limites”, criticou um senador do círculo de consulta de Rodrigo Pacheco.

Pacheco afirmou que a MP “causa estranheza”. Pacheco deve reunir líderes partidários de forma semipresencial, ou seja, com alguns políticos participando virtualmente, para decidir se mantém a MP tramitando no Congresso ou se devolve ao governo.

Marcada para a próxima terça-feira (9), um dia depois do ato para relembrar os Atos 8 de Janeiro, quando extremistas invadiram e depredaram as sedes do Legislativo, do Executivo e do Judiciário na mesma data em 2023. Pacheco deve comparecer ao evento.

O desconforto dos congressistas se dá em razão da insistência do governo em resolver o assunto com uma MP mesmo após duas derrotas inequívocas no Parlamento, cujos termos contraria o que já foi decidido no final do ano no Congresso que, em sessão conjunta derrubou os vetos do presidente Lula ao PL 334/2023.

A desoneração da folha de pagamentos venceria no fim de dezembro, no dia 31 de dezembro. O projeto do senador Efraim foi aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado, com apoio de parlamentares do governo e da oposição, prorrogando a medida até 2027. Ela permite que empresas de 17 setores intensivos em mão de obra, com mais de 9 milhões de trabalhadores, substituam a alíquota previdenciária, de 20% sobre os salários, por uma alíquota de 1% a 4,5%, sobre a receita bruta. O projeto também incluiu a desoneração dos municípios com até 142 mil habitantes.

O autor do PL (projeto de lei) que prorroga a desoneração da folha de pagamento, o senador Efraim Filho (União Brasil-PB), disse que a medida anunciada pelo Planalto era “muito ruim”. Ele é líder do União Brasil e vai participar da reunião da próxima semana. Efraim defende o caminho político, com a discussão do tema entre os congressistas.

A FPE (Frente Parlamentar do Empreendedorismo), com 205 deputados e 46 senadores, pediu na sexta-feira (29/12) que a MP fosse devolvida. Há pressão de outros grupos políticos e setores empresariais e por isso a reunião de líderes atípica deve ser realizada.

Chegou-se a discutir com mais intensidade a possibilidade de devolver a MP assim que ela foi publicada. Porém, com a regra prevista para abril, a ideia perdeu força e a discussão sobre o tema de forma mais profunda deve ficar para ser debatido durante a tramitação da proposta.

O que diz a MP?

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) publicou na sexta-feira (29/12) a MP n° 1.202/2023 com mudanças que visam a aumentar a arrecadação de impostos. O texto inclui temas distintos em uma única medida provisória, tais como:

• o aumento da tributação sobre a folha de pagamento de 17 setores da economia;

• limitação de compensação de créditos tributários obtidos pelas empresas;

• aumento de impostos por meio da redução gradativa do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos).

A medida provisória foi assinada por Lula e pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O texto determina que as novas regras para desoneração entrem em vigor em abril de 2024.

A MP define que a tributação sobre a folha voltará a incidir a partir de abril de 2023. Haverá uma “desoneração parcial” para o 1º salário mínimo. A remuneração que ultrapassar essa faixa sofre a tributação normal (de até 20%) ao INSS (contribuição patronal).

O governo criou dois grupos de “atividades econômicas” com tributação diferenciada sobre a folha de salários, atingindo 42 segmentos.

Como contrapartida, as empresas terão que manter a quantidade igual ou superior de empregados ao verificado em 1º de janeiro de cada ano.

Haddad pretende discutir os benefícios para os municípios separadamente. Circula que a Fazenda quer dialogar com as prefeituras para buscar uma “solução alternativa”.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.