Estudo identifica aumento nas despesas obrigatórias do governo; confira os números

Se esse gasto passar de 95% da despesa total, o governo pode ser proibido de conceder novos benefícios fiscais e contratar pessoal. É o que aponta a Consultoria do Congresso
Quando o governo federal não tem recursos em caixa, imprime dinheiro para se autofinanciar. Foto: Casa da Moeda o Brasil

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Foi divulgado nesta terça-feira (23), por consultores de Orçamento da Câmara e do Senado, que se debruçaram nos números informados no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 (PLN n° 3/2024), uma nota técnica conjunta (NT) sobre o que encontraram. A NT é a segunda etapa no rito de tramitação do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2025 (PLDO 2025) — segundo orçamento do governo Lula.

Consultores de Orçamento da Câmara e do Senado se debruçaram nos números informados no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 (PLN n° 3/2024) e produziram uma nota técnica conjunta (NT) sobre o que encontraram. A NT é a segunda etapa no rito de tramitação da PLDO 2025 

O governo estimou as despesas primárias (aquelas destinadas à oferta de bens e serviços públicos para a população) em R$ 2,348 trilhões para 2025. Desse total, apenas R$ 231,2 bilhões seriam discricionárias, ou seja, de execução não obrigatória. Entre as despesas obrigatórias, a maior parte do dinheiro vai para o custeio de pagamento de benefícios previdenciários, de pessoal, e despesas mínimas para saúde e educação.

Novo regime fiscal

Os consultores lembram que o novo regime fiscal (Lei Complementar n° 200/2023) determina que, caso a despesa obrigatória supere 95% da despesa total, sejam aplicadas vedações previstas na Constituição como a proibição de novos benefícios fiscais e contratação de pessoal.

Na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO 2025), o total de benefícios fiscais previstos para 2025 é de R$ 536,4 bilhões ou quase 20% da arrecadação.

Déficits previdenciários

O projeto lista os déficits dos diversos regimes previdenciários para o ano que vem:

• R$ 271,8 bilhões (2,19% do PIB) para o Regime Geral da Previdência Social;
• R$ 94,3 bilhões (0,76% do PIB) para o Regime Próprio de Previdência Social dos servidores públicos federais;
• R$ 19,2 bilhões (0,17% do PIB) para as pensões militares.

Gráfico obtido na nota técnica conjunta sobre o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 (PLN n° 3/2024)

Emendas parlamentares

A nota dos consultores sobre a LDO de 2025 destaca ainda que o texto não prevê o caráter impositivo das emendas parlamentares de comissões da Câmara e do Senado ao Orçamento do ano que vem.

A LDO de 2024 trouxe essa inovação ao fixar o valor destas emendas em pelo menos 0,9% da receita líquida do ano anterior. O Executivo vetou o dispositivo, mas a manutenção do veto ainda depende de votação no Congresso Nacional. Está convocada para essa quarta-feira (24), sessão conjunta do Congresso Nacional, para deputados e senadores votarem Vetos Presidenciais, dentre eles, o Veto a R$ 5,6 bilhões em emendas parlamentares (Comissões) ao Orçamento de 2024. O Orçamento já foi sancionado pelo presidente Lula com esse veto.

Dinheiro para o setor privado

Em relação às transferências para o setor privado, o projeto beneficia ações do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. A nota da consultoria informa que foi incluída a possibilidade de subvenções sociais para associações, serviços sociais autônomos ou organizações da sociedade civil de interesse público, que atuem no desenvolvimento ou na produção de:

• fármacos e medicamentos;
• produtos de terapia celular;
• produtos de engenharia tecidual;
• produtos de terapia gênica;
• dispositivos médicos estabelecidos em legislação específica;
• outros produtos e serviços prioritários do Complexo Econômico-Industrial da Saúde para o SUS.

Também foram liberadas as transferências para investimentos no setor.

Dilema

O principal dilema do governo é controlar os gastos públicos, entretanto, os números apontam para a direção contrária.

Um candidato ao Governo de uma cidade, estado ou país, quando ganha uma eleição, recebe a responsabilidade da maioria do eleitorado para colocar em prática seu plano de governo. Mas, e quando não há caixa para gastar o que foi prometido? E somente o governo federal tem a prerrogativa de mandar imprimir dinheiro?

Fonte: Banco Central

As contas do governo central apresentaram uma piora de R$ 185,8 bilhões no acumulado de janeiro a novembro de 2023. Esta é a diferença quando se compara o superavit primário de 2022 com o deficit de 2023.

Eis os dados no período de janeiro a novembro dos 2 anos:

• 2022 – houve um superavit de R$ 48,8 bilhões;
• 2023 – houve deficit de R$ 137 bilhões.

Quando são consideradas as contas públicas consolidadas (União, Estados, cidades e estatais), o resultado é ainda pior. A diferença de 2022 para 2023 é um rombo de R$ 257,4 bilhões. De novo, eis os dados para o período de janeiro a novembro dos 2 anos:

• 2022 – superavit de R$ 137,8 bilhões;
• 2023 – deficit de R$ 119,6 bilhões.

Lula não indica cortar gastos

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já sinalizou que não quer cortar investimentos e que, assim, trabalhará para fortalecer o PT nas cidades, antiga fórmula eleitoral do partido para ganhar eleições. Há um aditivo para 2024: as eleições para prefeituras, base para novo voo do partido em 2026 para tentar a reeleição.Considerado inexequível por economistas, o objetivo de alcançar R$ 168,5 bilhões em receitas extras para zerar o déficit primário neste ano fica cada vez mais distante. Estados e municípios adotam caminho semelhante quanto ao aumento de gastos.

Recuo nas contas dos governos locais

Os Estados e os municípios registraram superávit de R$ 20,6 bilhões no acumulado de janeiro a novembro de 2023. O resultado, no entanto, representa uma queda de 75,3% em relação ao mesmo período em 2022, quando teve saldo positivo de R$ 83,5 bilhões.Quando são considerados só os Estados, houve superávit de R$ 41,6 bilhões em todo o ano de 2022. O resultado foi 65,7% menor que o obtido pelos governos locais em 2021, quando o saldo positivo foi de R$ 121,5 bilhões.Os dados estão no Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais do Tesouro Nacional. Eis a íntegra.

Mais funcionários públicos

União, Estados e municípios aumentaram seu quadro de funcionários (leia aqui, criar um link para o doc 5.pdf) em aproximadamente 403 mil pessoas nos últimos 12 meses, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Esse é o saldo entre os novos contratados, já descontados os aposentados e demitidos em 2023. E Vem aí o Enem dos Concursos, com o preenchimento de milhares de vagas no serviço público federal em todo o Brasil.

Vamos precisar emitir moeda?

A pergunta ronda conversas e em alguns casos, pesadelos de congressistas e o alto Escalão do governo federal.

Fatos que pode servir de lição. O histórico brasileiro de emitir moeda nova como forma de se autofinanciar são traumáticos. O mais conhecido deles aconteceu durante a presidência de Juscelino Kubitschek. Para construir Brasília, ele optou por imprimir dinheiro. O resultado foi o início do processo de hiperinflação, que se acentuou durante os governos militares e só acabou debelado com o Plano Real, nos anos 1990 — três décadas perdidas para a economia nacional.

Aquela não foi a única aventura desastrosa do tipo na história da República. Em 1890, houve o episódio do Encilhamento, quando Rui Barbosa, o primeiro ministro da Fazenda do regime, permitiu a bancos privados emitirem moeda. O resultado fora o mesmo: forte inflação.

Durante as últimas décadas, a emissão de dinheiro virou carta fora do baralho. Em parte, devido à memória inflacionária brasileira, que permanecia rondando a economia e que parece ter se apagado apenas com a grande crise de déficit público deflagrada em 2014. E recentíssimo, com a crise causada pelo novo coronavírus e com o risco de depressão, que faz a possibilidade de alta da inflação deixar de ser um problema, e o mecanismo voltou à discussão.

Afinal, foi necessária pesada injeção de recursos para salvar empresas e trabalhadores, seja queimando reservas ou criando dívidas. A vantagem, desta vez, é que uma inovadora forma de colocar dinheiro novo na economia foi desenvolvida: o afrouxamento quantitativo, tradução literal para o termo em inglês quantitative easing, que prevê a compra de títulos. Ainda que polêmico, ele foi primeiramente utilizado no Japão em 2001, para combater o estouro de uma bolha imobiliária. Mas, só se popularizou globalmente quando aplicado em larga escala pelos EUA e Europa na crise de 2009.

“Hoje existe mecanismo que permite emitir e depois se consegue recolher a moeda”, afirma Luiz Felipe Figueiredo, CEO da gestora Mauá Capital e que, como diretor de política monetária do Banco Central, enfrentou a crise iniciada com os atentados de 11 de setembro de 2001. “O impacto é diferente”, o que dá a impressão que dinheiro dá em árvore.

“O arsenal que temos hoje é muito grande. Podemos fazer novas liberações de compulsórios” Roberto Campos Neto, Presidente do Banco Central

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.