Num país onde a fiscalização é invariavelmente insuficiente, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 72/2023, que isenta do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) os veículos terrestres de passageiros, caminhonetes e mistos com 20 anos ou mais de fabricação, tem sua efetividade questionada. Se for aprovada, o Congresso Nacional autoriza latas-velhas a continuar circulando nas ruas e estradas do país, em tempos em que se busca a eficiência e redução de emissão de gases que provocam o efeito estufa.
Esses argumentos, elementares para o debate da matéria foram desconsiderados pelos senadores, que aprovaram o texto do projeto em março deste ano.
Apresentada pelo senador Cleitinho (Republicanos-MG), a PEC está em análise na Câmara dos Deputados e deve abrir a discussão que não foi considerada durante a tramitação anterior. “Trata-se de matéria populista, e com graves efeitos ao meio ambiente,” criticou um deputado que prefere não se identificar.
Segundo o texto, a regra não valerá para micro-ônibus, ônibus, reboques e semirreboques, e vai atingir principalmente os estados onde ainda não existe a isenção, como Minas Gerais, Pernambuco, Tocantins, Alagoas e Santa Catarina.
A PEC amplia a isenção pela via da imunidade tributária, que é matéria de índole constitucional.
Ao apresentar a proposta, o senador Cleitinho disse que a medida assegura justiça social. “Para a população de baixa renda proprietária de automóveis mais antigos, a despesa com o IPVA consome parcela relevante de suas receitas,” justificou.
A reforma tributária aprovada pelo Congresso Nacional estabeleceu a incidência de IPVA sobre veículos aéreos, terrestres e aquáticos, mas concedeu imunidade para aviões agrícolas, barcos de pesca, plataformas de petróleo, tratores e máquinas agrícolas.
O autor da PEC defende sua aprovação alegando que tal iniciativa resolveu uma antiga incongruência no Sistema Tributário Nacional, que permitia a tributação de automóveis, desde os mais simples, mas impedia a tributação de barcos e aeronaves, veículos geralmente pertencentes a pessoas com maior poder aquisitivo.
“A despeito do avanço, a nosso ver faltou à reforma [tributária] lidar com outro aspecto importante relativo à justiça fiscal: a tributação de automóveis terrestres de passageiros com muitos anos de fabricação,” destacou Cleitinho, desconversando porém, sobre os efeitos nocivos e o aumento de emissões por esses veículos antigos, cujos motores são altamente poluentes e com alto consumo de combustíveis fósseis.
Lata-velhas entopem as ruas das cidades
Em recente pesquisa realizada pelo Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças), constatou-se que a frota de veículos em circulação no Brasil é a mais velha desde 1995. De 2020 a 2021, veículos com mais de 20 anos passaram de 2,5 para 3,6 milhões. Esse cenário se deveu, principalmente, à pandemia da covid-19, que ocasionou um aumento considerável no preço dos veículos, inclusive em relação aos usados, e à queda do poder aquisitivo da população.
Mas, para o senador Cleitinho a avaliação tem outro viés: “Entendemos, diante disso, que os princípios da justiça fiscal e o da capacidade econômica requerem deste Congresso a tomada de medidas para assegurar a esses brasileiros a manutenção da propriedade de seus veículos. E nesse contexto a tributação é fator de grande importância, haja vista que para a população de baixa renda, proprietária de automóveis mais antigos, a despesa com o IPVA consome parcela relevante de suas receitas”.
Próximos passos
Se for admitida pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados, a proposta será analisada por uma comissão especial a ser criada e, em seguida, votada em dois turnos pelo Plenário da Câmara.
Se aprovada, será promulgada pelo presidente do Congresso Nacional e se transformará em lei.
Por Val-André Mutran – de Brasília