Em entrevista, Helder Barbalho diz que Lula é o mediador adequado sobre polêmica da exploração de petróleo na foz do Amazonas

Governador do Pará é o presidente do Consórcio da Amazônia Legal desde janeiro
Presidente do Consórcio da Amazônia Legal desde janeiro, o governador do Pará, Helder Barbalho, afirma que o governo federal deve dar prioridade e acelerar uma solução para o impasse

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Brasília Presidente do Consórcio da Amazônia Legal, desde janeiro passado, o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), afirma que o governo federal deve dar prioridade e acelerar uma solução para o impasse a respeito da exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas. Para ele, a classe política deve assegurar que a Petrobras e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) dialoguem, de forma que a companhia possa elucidar as dúvidas que levaram à negativa dada pelos técnicos do Ibama. Este esforço, disse, deve incluir até mesmo o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). As declarações foram dadas em entrevista publicada no jornal Valor Ecômico, do Grupo Globo.

“Acho, inclusive, que o presidente da República em algum momento terá que atuar como mediador. Isto não é nada atípico, faz parte de agendas que conflituem”, disse. “Nós não podemos deixar que divergências políticas sejam empecilho e impedimento. Temos que afastar aqueles que querem conflito”.

 O governador disse ser favorável à pesquisa que a ministra Marina Silva insiste em chamar de “perfuração”, e rebateu as críticas de que a exploração da região prejudicará o processo de transição energética. Para ele, a Petrobras é totalmente capacitada para responder aos questionamentos do órgão ambiental. “Se a pesquisa disser que a exploração desta bacia não tem viabilidade ambiental, está encerrado o assunto.” A seguir os principais pontos da entrevista:

Valor: Como governador do Pará e presidente do Consórcio da Amazônia Legal, que reúne os Estados da região, qual a sua avaliação a respeito da decisão do Ibama?

Helder Barbalho: Nós sempre defendemos o diálogo entre as instâncias envolvidas. Por um lado, a Petrobras, como demandante ao direito à pesquisa, e, por outro lado, o Ibama como agente licenciador. O que nós defendemos é que seja mitigado todo e qualquer item pendente para permitir a pesquisa. Nós não estamos discutindo, e ainda não chegou a este momento, para saber qual o impacto ambiental da extração de petróleo a 540 quilômetros da foz do rio Amazonas. O que nós estamos discutindo neste momento é um direito à Petrobras e para que, elucidado a partir da pesquisa, se possa tomar a decisão do Brasil se é conveniente para a estratégia energética e econômica do Brasil fazer a exploração. Quando não se dá o direito a pesquisar, se vai na contramão ao que nós temos defendido não especificamente apenas neste episódio, mas inclusive como solução de transição do uso do solo para nossa região, para pesquisar a biodiversidade e incrementar um novo modelo econômico.

Valor: Essa posição não colide com a tendência de transição energética?

Helder: Fazer a opção pela matriz energética do petróleo é uma decisão de Estado. Entendo que o Brasil está caminhando na diversificação da sua matriz energética para ser autossuficiente de outras matrizes que possam permitir, nas décadas futuras, uma virada de chave. Mas compreendo que este momento ainda não chegou. Se este momento ainda não chegou, não me parece ser minimamente razoável coibir que se faça pesquisa e se subsidie o Estado brasileiro para uma tomada de decisão. Se a pesquisa disser que a exploração desta bacia não tem viabilidade ambiental, está encerrado o assunto. Agora, se a pesquisa disser que é viável mediante condicionante X, Y ou Z, aí não creio que se tenha o direito de cercear o estado do Amapá e o estado do Pará de ter uma oportunidade econômica.

Valor: Há quem argumente que a iniciativa irá estimular o consumo de combustíveis fósseis no país.

Helder: Se o Estado brasileiro continuará por algumas décadas avançando nesta matriz, eu não posso achar minimamente aceitável o romantismo da frase “ah, então nós vamos estimular…”. Não estamos estimulando nada, nós estamos apenas dizendo o seguinte: se o Brasil ainda haverá pelas próximas décadas de avançar neste segmento, por que, em sendo mediante pesquisa e demonstrada a sustentabilidade da operação, nós da Amazônia, a 540 quilômetros distante da foz do rio Amazonas e em alto-mar, não teremos o direito a essa experiência? O Rio de Janeiro pode. São Paulo pode. Uma parte do Nordeste pode. Na mesma região, o Suriname e a Guiana, podem. E nós não podemos? Isso que está em pauta, volto a dizer, mediante pesquisa. Nada do que a pesquisa disser que inviabilize segue-se adiante.

Valor: O senhor já tem alguma simulação sobre o que essa atividade pode representar em termos de recursos para o Estado?

Helder: Não, porque não se sabe ainda qual é a dimensão do que está sendo discutido. É importante ressaltar que nós estamos diante de um pedido de pesquisa para uma perfuração. Aí é que nós vamos verificar o tamanho, quantos barris serão possíveis. O que nós temos convicção é que, estando comprovada a viabilidade ambiental, abre-se uma viabilidade econômica extraordinária para serviços, para incremento de receita para os estados e municípios envolvidos. Eu defendo a pesquisa e espero que a Petrobras, ao reapresentar o pedido de avaliação dos estudos, possa ter uma conversa técnica com o Ibama. Não creio que a Petrobras não seja capaz de apresentar e dê segurança no sentido de fazer a pesquisa com todas as condicionantes que preocupam – e devem preocupar – os órgãos licenciadores.

Valor: Na sua opinião, isso deve se dar de forma célere? A ministra Marina Silva disse que pode levar dois anos…

Helder: Entendo que essa é uma decisão estratégica do governo, e tudo o que é estratégico o governo deve elevar o assunto à prioridade. Pelo que tem sido apresentado pela Petrobras, ela não tem condição de esperar, pelos custos de mobilização. Diariamente o custo é absolutamente extraordinário. Estamos falando de um leilão de 2013. Para a Agência Nacional do Petróleo colocar esse bloco em leilão, pressupõe que o Ibama e o ICMbio permitiram. A agência nacional não vai colocar a leilão algo que não tenha minimamente a anuência dos órgãos licenciadores. Olha os custos desse processo e as incertezas. Acho, inclusive, que o presidente da República em algum momento terá que atuar como mediador. Isto não é nada atípico, faz parte de agendas que conflituem.

Valor: Qual poderia ser o caminho para um entendimento?

Helder: Acho que o termo da conciliação é o Ibama colocar quais são as condicionantes e a Petrobras demonstrar que tem capacidade de cumpri-las. Daí em diante, a partir de um estudo técnico e a partir da pesquisa, vai se sustentar ou não a viabilidade do passo seguinte.

Valor: Isso é consenso no consórcio dos governadores da Amazônia Legal?

Helder: Todos os governadores coadunam desta ideia. Inclusive os secretários de meio ambiente dos Estados e os governadores são signatários de uma mensagem uníssona a respeito da defesa da pesquisa e do direito a sabermos qual é a oportunidade e em que condições essa oportunidade pode ser sustentável.

Valor: Isso pode atrapalhar a mensagem de que o Brasil passou a adotar uma nova postura em relação ao meio ambiente? O senhor vem defendendo um discurso de muita preocupação com essa agenda.

Helder: Não estamos aqui para defender ilegalidade ambiental. Nós estamos aqui para defender a pesquisa. Se a pesquisa disser que é viável, vamos adiante. Se a pesquisa disser que não é viável, nós adotaremos aquilo que o estudo permitirá. Agora, não fazer a pesquisa e não estudar isto, compreendo que é um equívoco.

Valor: Quais devem ser os próximos passos?

Helder: Neste momento, exclusivamente, o que se aguarda é uma solução entre Ibama e Petrobras, que está sobrestada a partir da decisão dos últimos dias. O passo seguinte é a Petrobras reencaminhar [o pedido] e nós, agentes públicos, colaborarmos com o diálogo e com a construção de pontes que possam elucidar as dúvidas que deixaram os técnicos do Ibama em condição incômoda e provocaram a negativa. Nós devemos ser os construtores de diálogo para esclarecer e buscar visualizar se é ou não viável essa oportunidade. Celeridade não deve levar à supressão de qualquer etapa, mas celeridade requer que se eleve o assunto para deliberação no nível de prioridade e isto deve ser mediado pelo governo.

Valor: Esse episódio ocorre em meio a outros casos em que a ministra Marina Silva e a área ambiental do governo se encontram sob pressão, tanto dentro do Executivo quanto no Congresso. Como esse ambiente político pode afetar o desfecho neste caso?

Helder: Eu entendo que nós devemos todos buscar pregar o diálogo. Naquilo que couber exclusivamente ao Executivo, há que ter habilidade para que não reverbere nas agendas legislativas. Se não houver diálogo, corremos o risco de, até mesmo quando houver uma convergência de opiniões, as divergências políticas trazerem prejuízos. Prego o diálogo porque entendo que o Brasil vive um momento absolutamente extraordinário de oportunidade na diplomacia ambiental e na gestão, a partir do compromisso do presidente Lula, com esta pauta. Nós não podemos deixar que o ruído político inviabilize esta agenda.

Valor: Por exemplo.

Helder: Cito comando e controle. Um ponto muito importante é a redução do desmatamento. O estado do Pará representou 36% das emissões no ano de 2021 para 2022. Nós reduzimos 21% das emissões no ano passado. Neste ano, até abril nós reduzimos em 45% as emissões comparado com janeiro a abril de 2022. Só no mês de abril reduzimos 71%, comparado com abril de 2022. E o mês de maio, até o dia de ontem [quarta-feira 24], nós tínhamos reduzido 44% comparado com maio de 2022. Mas nós temos uma pauta que está no Congresso que é a legislação do mercado regulado de carbono. Nós dependemos do Congresso Nacional. O Brasil tem que cuidar, por um lado, de combater ilegalidade, mas não pode ser só reativo. Nós temos que propor soluções que sejam sustentáveis para consolidar a lógica da mudança do uso do solo para um novo viés econômico, de floresta viva e de floresta em pé. Tudo isso requer diálogo. O mundo inteiro espera e provoca o Brasil a esta dimensão de protagonismo. O Brasil não deve perder esta oportunidade.

Valor: Essa turbulência ocorre em meio à expectativa do anúncio de Belém como sede da COP e também da realização da cúpula amazônica na cidade.

Helder: O Brasil pode liderar o mundo a partir da agenda ambiental e pode ser pária se renunciar a esta agenda. O presidente Lula tem compromisso e agido com o governo neste sentido. Portanto, todos devem compreender que temos uma missão elevada ao nível máximo de responsabilidade para construir pontes necessárias para o fortalecimento desta agenda. Nós não podemos deixar que divergências políticas sejam empecilho e impedimento. Temos que afastar aqueles que querem conflito.

Novo pré-sal

Desde a negativa da licença de perfuração negada pelo Ibama, o blog vem acompahando o desdobramento do imbróglio. A região da Foz do Amazonas é chamada de “novo pré-sal” e tem sua exploração defendida por políticos da região amazônica como o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (AP), que deixou a Rede Sustentabilidade após a decisão do Ibama com apoio de Marina.

O presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho decidiu barrar o pedido da Petrobras na última quarta-feira (17). A estatal se mostrou surpresa com a decisão e assegurou que vai recorrer, o que acontecerá ainda nesta semana. A decisão de Agostinho seguiu a área técnica do órgão. O Ibama apontou haver “inconsistências identificadas sucessivamente” e “notória sensibilidade socioambiental da área de influência e da área sujeita ao risco”, destacando a necessidade de “avaliações mais amplas e aprofundadas”.

Presidente da República, Luiz Inacio Lula da Silva, durante declaração à imprensa. Hiroshima, Japão. Foto: Ricardo Stuckert/PR

O presidente Lula declarou que, se riscos reais forem identificados, haverá veto à exploração. “Se extrair petróleo na Foz do Amazonas, que é a 530 quilômetros, em alto mar, se explorar esse petróleo tiver problema para a Amazônia, certamente não será explorado. Mas eu acho difícil, porque é a 530 quilômetros de distância da Amazônia, sabe?”, disse o presidente a jornalistas em Hiroshima, após encerrar sua passagem pela cúpula do G-7 no Japão, na semana passada.

Apesar da sinalização contrária aos ambientalistas, Lula voltou a dizer que seu governo tem compromisso com a sustentabilidade e vai atingir a meta de desmatamento zero na Amazônia até 2030. A temática ambiental foi um dos temas-chave do G7.

O petista disse que o País “está de volta” ao cenário internacional e quer ajudar o mundo a cumprir as metas de combate a mudanças climáticas. Segundo o presidente, o Brasil tem “autoridade moral” para discutir o tema com o mundo, mas os países ricos precisam cumprir seus compromissos, inclusive financeiros, acordados em cúpulas multilaterais.

Lula também disse que os indígenas podem ser “guardiões” da Amazônia no Brasil e em países vizinhos, e voltou a defender uma aliança com Congo e Amazônia para proteger florestas.

Cobrança

Para o presidente Lula, os países mais ricos do mundo precisam honrar os compromissos feitos nas Conferências do Clima (COP). Segundo ele, nem o Protocolo de Kyoto e nem o Acordo de Paris são respeitados, e cobrou o cumprimento dos acordos assumidos pelas nações mais desenvolvidas. “Em todas as COPs, as pessoas falam que vão doar 100 bilhões de dólares ao ano para que os países em desenvolvimento possam preservar a natureza. Nós estamos aguardando”.

A iniciativa da Alemanha e da Noruega em formar o Fundo Amazônia, além das recentes contribuições do Reino Unido e dos Estados Unidos, foram reconhecidas pelo presidente Lula. No entanto, segundo ele, ainda não é o suficiente.

Para o presidente brasileiro, a efetividade de medidas de âmbito mundial, tais como conferências e convenções, deve passar por uma maior representatividade dos países mais pobres nas tomadas de decisões globais. “De qualquer forma, o Brasil vai fazer por conta própria aquilo que o Brasil tem que fazer. Preservar a Amazônia é dever e responsabilidade do povo brasileiro”, afirmou.

Como parte do esforço de aproximar os países da América do Sul das discussões sobre preservação, o presidente citou a Cúpula da Amazônia, a ser realizada em agosto, no Brasil pela Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). A OTCA é composta pelos oito países amazônicos (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela). Segundo o presidente, a França também tem parte nessa discussão, em razão de sua soberania sobre a Guiana Francesa. É justamente na Colônia da França, ao lado do Amapá, que foram descobertos 11 bilhões de barris de petróleo. O PIB do país cresceu 62% em 2022.

O presidente Lula também citou recentes contatos com a Indonésia e a República Democrática do Congo (RDC), ambos detentores de vastas áreas de floresta tropical na Ásia e na África, respectivamente. “Para que a gente possa, enquanto mundo que ainda tem floresta, oferecer uma possibilidade de tratar seriamente a manutenção dessas florestas, desde que o mundo rico cumpra com os compromissos que têm firmado”, afirmou o presidente.

Na cúpula de Hiroshima, participaram Brasil, Japão, Austrália, Canadá, Comores, Ilhas Cook, França, Alemanha, Índia, Indonésia, Itália, Coreia do Sul, Reino Unido, Estados Unidos, Vietnã e União Europeia.

Com informações do jornal Valor.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.

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