Desestatização da Eletrobras é aprovada sob protestos da oposição

“Bolsonaro vai impor aumento da conta de luz ao povo”, acusaram
Câmara conclui votação da MP que permite a desestatização da Eletrobras e medida vai a sanção

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Brasília – Sob protestos dos partidos de oposição que entraram em obstrução, acusaram o governo de “trair o povo” entregando a Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras) “de graça” para a iniciativa privada que vai impor ao consumidor aumento da conta de luz; a Câmara dos Deputados aprovou, em longa sessão extraordinária na noite de terça-feira (22), a medida provisória (MP 1031/2021) que permite a desestatização da 6ª maior estatal do país. A MP foi votada um mês atrás pela Câmara e aprovada semana passada, com mudanças, pelo Senado. Ela perderia nesta terça a validade se não fosse votada novamente pelos deputados.

O relator da proposta, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), recomendou a aprovação de 21 das 28 alterações feitas pelo Senado.

A medida provisória permite a emissão de novas ações da Eletrobras que serão vendidas no mercado, o que fará com que o governo perca o controle acionário, ou seja, o comando da empresa. Mas a União terá o poder de veto em decisões da assembleia de acionistas, uma maneira de evitar que um grupo de acionistas detenha mais de 10% do capital votante da empresa.

A oposição classifica isso como uma privatização e aponta como consequência o aumento da conta de luz para o consumidor.

O líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), negou que a desestatização da Eletrobras, responsável por 30% da energia gerada no país, vá provocar aumento das contas de luz.

“Esta medida não aumenta o preço da energia elétrica. Isso é uma falácia. Pelo contrário: teremos mais investimento, mais geração de empregos, mais competência no sistema e, obviamente, teremos mais capacidade de atender, com a capitalização da Eletrobras, inúmeros locais onde hoje é difícil o acesso de energia. Esta medida provisória privilegia muito a Amazônia, que é o local onde nós temos mais dificuldade de fornecimento”.

Deputados da oposição também criticaram emenda do Senado que permite o início das obras das linhas de transmissão da hidrelétrica de Tucuruí, que ligará o sistema elétrico de Roraima ao resto do país. A linha de transmissão cortará mais de 100 km da terra indígena dos Waimiri-Atroari.

Outro ponto que gerou polêmica na votação foi o trecho aprovado na Câmara que obrigava o governo federal a contratar, pelos próximos 15 anos, usinas termelétricas a gás natural em regiões do interior onde não existem gasodutos. O Senado manteve esta previsão, mas tirou essa condição para o processo de desestatização.

Para muitos deputados, essa exigência beneficia interesses privados, como explicou o deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP).

“O que nós temos agora é uma deturpação do processo todo. Nós temos reserva de mercado, nós estamos privilegiando grupos econômicos privados. E aí a gente até se junta à esquerda: se é para privatizar dessa forma, dando para grupos privados, como se fosse a la Vladimir Putin, a gente também não quer. A gente quer fazer uma privatização clara, transparente, que não privilegie ninguém, que dê concorrência e que faça com que o cidadão brasileiro tenha os melhores preços, os melhores serviços, fruto de uma boa concorrência”.

As exigências de compromissos financeiros por parte da Eletrobras depois da desestatização fizeram com que deputados favoráveis à privatização da empresa criticassem a medida provisória. O deputado Hildo Rocha (MDB-MA) disse que as obrigações serão maiores que a arrecadação.

“Da forma como se encontra o texto, você vai pegar seu veículo usado, vai reformar ele, vai gastar R$ 80 mil para reformar seu veículo e vai vender por R$ 20 mil, ou seja, você vai ter um prejuízo de R$ 60 mil. E o pior é que quem vai pagar a conta desse prejuízo da Eletrobras é o cidadão brasileiro que vai pagar com o aumento da tarifa de energia. É simples a conta”, demonstrou.

A medida provisória permite que a energia seja vendida ao consumidor pelo preço de mercado e não mais pelo modelo de cotas, uma espécie de tabelamento de preços, definida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), como é hoje.

Para diminuir as resistências à proposta, o relator da MP, deputado Elmar Nascimento, estabeleceu que parte do lucro com a venda da energia a preço de mercado seja incluído em uma conta, chamada Conta de Desenvolvimento Energético, ou CDE.

A CDE é abastecida com recursos das empresas de distribuição de energia e, entre outras finalidades, serve para compensar descontos nas tarifas. Elmar Nascimento destinou R$ 8 bilhões dos R$ 25 bilhões previstos na capitalização para abater as tarifas dos pequenos consumidores.

Destinou ainda quase R$ 9 bilhões dos recursos novos para a revitalização das bacias do São Francisco e da região de Furnas. Elmar Nascimento comemorou a aprovação da MP:

“Recuperar a capacidade de investimento da Eletrobras no momento da maior crise hídrica da história. Fizemos a redução da tarifa por meio de intervenção na CDE. Fizemos a prorrogação dos fundos que estavam previstos por apenas dez anos. Todo mundo fala em revitalização do São Francisco, mas efetivamente, pelas nossas mãos, agora virou um fundo que será ad infinitum, até a recuperação do São Francisco, da ordem de R$ 350 milhões por ano”.

Elmar Nascimento concordou em manter emenda aprovada pelo Senado, que obriga o Poder Executivo a contratar os empregados da Eletrobras demitidos sem justa causa nos 12 meses seguintes à desestatização em cargos e salários parecidos.

A MP também permite que os empregados da Eletrobras que forem demitidos comprem ações da empresa a preços anteriores ao da desestatização, mas limita este total a 1% das ações em poder da União.

A MP que permite a desestatização da Eletrobras vai agora para sanção presidencial.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.