“Cidades da Vale” no Pará movimentaram quase meio bilhão de reais em apenas dois meses

Canaã dos Carajás, galinha dos ovos de ouro da multinacional, viu arrecadação disparar 70% de 2018 para 2019. Dois meses da “Terra Prometida” pagariam contas do ano inteiro de 52% das prefeituras paraenses.

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A maioria dos prefeitos de municípios nos quais a mineradora multinacional Vale tem operações no Pará celebra com riso largo as entradas no caixa neste começo de ano. Em levantamento inédito e exclusivo feito pelo Blog do Zé Dudu nesta quinta-feira (28), último dia do primeiro bimestre de 2019, o poder financeiro das prefeituras de Parauapebas, Marabá, Canaã dos Carajás, Curionópolis e Ourilândia do Norte foi estimado a partir de dados cruzados por meio de portais de transparência, Secretaria de Estado da Fazenda (Sefa), Banco do Brasil e Tribunal de Contas dos Municípios (TCM).

O resultado é impressionante: os prefeitos Darci Lermen (Parauapebas), Tião Miranda (Marabá), Jeová Andrade (Canaã), Adonei Aguiar (Curionópolis) e Romildo Veloso (Ourilândia do Norte) administraram um volume de recursos 16% maior em relação ao primeiro bimestre do ano passado. Os dados levantados pelo Blog são preliminares (mesmo porque o dia ainda não acabou e novas receitas podem ingressar nos cofres), mas, ainda assim, são épicos. Em dois meses, as prefeituras que se alimentam do mundialmente famoso complexo minerador de Carajás arrecadaram R$ 467 milhões ante R$ 403 milhões informados ao TCM no ano passado por meio do Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO).

Apesar disso, o crescimento de receitas não foi uniforme entre todas as chamadas “Cidades da Vale”. Dos cinco municípios analisados, três aumentaram a arrecadação (os detentores de projetos de mineração de ferro) e dois apresentaram decréscimo — e pode ser que suas receitas nem tenham caído de fato, mas só o primeiro RREO deste ano para desvendar o mistério, haja vista muitas informações dos portais de transparência não terem a devida atualização temporal.

O Blog apresenta os valores por município e lembra que todas as prefeituras precisam prestar contas do primeiro bimestre ao TCM e à Secretaria do Tesouro Nacional (STN) já a partir de amanhã (1º) até o último dia de março.

Parauapebas

Detentor de minas de ferro (N4E, N4W e N5), de manganês (Azul) e de níquel (para alimentar Onça Puma), todas da Vale, Parauapebas é o município brasileiro que mais arrecada royalties de mineração e, atualmente, um dos que mais faturam com Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no Pará. Depois da mudança na legislação mineral, que incrementou os royalties sobre o minério de ferro, Parauapebas viu sua compensação financeira subir 75%. Isso fez, por tabela, aumentar a receita.

Nos primeiros dois meses deste ano, a prefeitura local arrecadou R$ 213,5 milhões, 23% a mais que os R$ 173,64 milhões que entraram nos cofres no mesmo período de 2018. Hoje, a Prefeitura de Parauapebas é a 4ª que mais recebe recursos na Região Norte (atrás de Manaus, Belém e Porto Velho) e uma das 50 do país em meio a 5.568 governos municipais.

Marabá

Por causa da mina de cobre (Salobo) da Vale, a Prefeitura de Marabá prosperou muito esta década, carregada nos braços pelo aumento de impostos e da compensação financeira. No entanto, até o meio-dia desta quinta, o governo municipal havia arrecadado R$ 146,84 milhões, um pouco menos (5,2%) que os R$ 154,42 milhões registrados no mesmo período do ano passado.

Atualmente, de acordo com dados levantados pelo Blog do Zé Dudu junto à STN, a Prefeitura de Marabá está entre as 80 mais ricas do país, com receita líquida equivalente à de capitais como Rio Branco e Macapá e muito acima de cidades de interior igualmente prósperas, como Vitória da Conquista, Itabuna e Ilhéus (BA); Imperatriz (MA); Governador Valadares (MG); Campina Grande (PB); Caruaru e Petrolina (PE); Mossoró (RN); São Carlos, Americana e Franca (SP); e Araguaína (TO).

Canaã dos Carajás

O município-fenômeno do Brasil em arrecadação, detentor de minas de ferro (S11D) e cobre (Sossego), conseguiu pular de R$ 45,9 milhões nos primeiros dois meses do ano passado para R$ 78,41 milhões no mesmo período deste ano. Em termos relativos, a receita de Canaã dos Carajás aumentou 70,7%, tudo isso turbinado pelas mudanças — para mais — nos royalties sobre o ferro e, também, devido ao aumento escalonado da produção física em S11D para atender aos anseios da Vale.

Em 2019, Canaã se mostra um município de população pequena com receita de cidade grande, posicionando sua prefeitura entre as 200 mais ricas da nação. Apenas o que o governo local arrecadou nestes dois meses do ano é mais que a arrecadação anual inteira de 52% dos 144 governos municipais paraenses, entre os quais o vizinho Eldorado do Carajás, que sobrevive com somente R$ 66 milhões por ano.

Curionópolis

Dona de uma mina de ferro explorada pela Vale (Serra Leste), Curionópolis só saiu do ostracismo fiscal depois que o projeto de mineração da multinacional entrou em ação. Durante duas décadas, a população do município apenas decrescia e a prefeitura mal tinha dinheiro para fazer o básico. Agora, se não é a solução, dinheiro não é mais problema para resolver as questões sociais básicas que tanto afligem os 18 mil habitantes do município.

Em dois meses, a Prefeitura de Curionópolis arrecadou R$ 14,78 milhões, 8,9% acima dos R$ 13,58 milhões registrados no primeiro bimestre de 2018. Na prática, a administração local viu entrar nos cofres R$ 1,2 milhão que prometem ajuntar-se para fazer de 2019 um ano inesquecível para as finanças públicas locais — que podem cair em desgraça caso não saia a expansão pleiteada pela Vale para Serra Leste.

Ourilândia do Norte

“Menina do níquel” da Vale no Brasil, Ourilândia do Norte é onde a mineradora decidiu instalar a usina de Onça Puma, que, se não gera royalties, ao menos movimenta as contas da prefeitura com taxas e impostos diversos. Mas isso quando está operando porque, volta e meia, o empreendimento é alvo de contenda judicial.

Para piorar, 2019 não começou bem para as contas do governo local, que está tendo de lidar com R$ 1,1 milhão a menos em relação ao ano passado. A receita estimada deste primeiro bimestre é de R$ 14,3 milhões ante R$ 15,43 milhões no mesmo período de 2018, uma queda de 8%. Todavia, o jogo pode virar porque Ourilândia do Norte deve receber nos próximos meses uns “atrasados” de royalties por ser município diretamente impactado pela atividade de mineração