Câmara dos Deputados aprova urgência para projeto que pune institutos de pesquisas

Câmara dos Deputados aprova urgência para projeto que pune institutos de pesquisas
Sessão do Plenário da Câmara ocorreu no regime de votação semipresencial

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Brasília – Foi aprovado na noite de terça-feira (19), por 295 votos favoráveis, 120 contrários e uma abstenção, o requerimento de urgência para o projeto de lei que vai regulamentar e punir empresas que fazem pesquisas eleitorais. A urgência é uma maneira de acelerar a tramitação de um projeto e permite que ele seja votado diretamente pelo plenário, sem ser analisado por comissões. O relator da matéria, deputado Paulo Martins (PL-PR), deve apresentar um substitutivo aos projetos apensados que tramitam na Casa.

Painel de votação registra como ficou o escore da votação do requerimento

De acordo com o relator, o trecho que determina a prisão dos responsáveis por pesquisas que não acertarem o resultado das eleições estará fora do projeto. “Um texto será construído em acordo. Está descartado criminalização”. A ideia é que a punição seja feita por multa.

Em reunião com os líderes dos partidos, o presidente da Câmara, Arthur Lira, estabeleceu que o texto que vai ao Plenário só será apresentado à votação quando houver um mínimo de consenso em torno da proposta final.

Processo legislativo

Para o eleitor entender o processo legislativo, o requerimento de urgência apresentado em Plenário se refere ao Projeto de Lei mais antigo em tramitação na Casa, de autoria do deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR) — PL nº 96/2011, que tramita, portanto, há mais de dez anos.

O texto do PL estabelece punição para a divulgação de pesquisas eleitorais consideradas fraudulentas. A este projeto original foram apensados outros onze projetos com o mesmo tema, as pesquisas eleitorais. Desse total, três projetos foram protocolados depois do primeiro turno das eleições desse ano.

O projeto de Rubens Bueno já passou pelas comissões permanentes da Câmara e prevê pena de prisão de 6 meses a um ano e multa que pode chegar a R$ 1 milhão para pesquisa considerada fraudulenta.

A proposta considera fraudulenta pesquisa divulgada até cinco dias antes das eleições, quando o resultado final tiver uma diferença acima da margem de erro divulgada.

Outro projeto apensado a este foi apresentado pelo líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR). Ele obriga o veículo de comunicação que divulgar determinada pesquisa a divulgar também todas as demais registradas na Justiça eleitoral desde a véspera. E cria o crime de publicação de pesquisa eleitoral que tiver números acima da margem de erro declarada, com pena de quatro a dez anos de prisão, e multa.

Estarão sujeitos à pena o estatístico responsável e os representantes do instituto e da empresa que contratar a pesquisa. Ricardo Barros rechaçou as acusações da oposição de que a intenção de seu projeto seja o de criminalizar os institutos de pesquisa.

“Este requerimento de urgência vai nos dar condição, e este é um compromisso que nós assumimos, de construir com esta casa, com as lideranças, um texto razoável, de acordo, para que a gente venha a estabelecer uma regra razoável, que não seja restritiva necessariamente, e que não afronte e não assuste ninguém, mas apenas para que este tipo de situação não venha a ocorrer. Porque tanto se fala em preservar a democracia e não se fala em preservar a democracia, preservando a consciência do eleitor”, declarou.

Durante a discussão do requerimento o deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG), disse que será apresentado nesta quarta-feira (19), um projeto que cria um selo de qualidade para os institutos de pesquisa e que empresas com má reputação no mercado serão expostas.

Críticas

Deputados de diversos partidos, principalmente da oposição, criticaram o regime de urgência. Para o deputado Tiago Mitraud (Novo-MG), o ideal é que o assunto fosse tratado em uma comissão especial. Já a deputada Vivi Reis (Psol-PA) criticou o que chamou de criminalização das pesquisas eleitorais.

A deputados Vivi Reis (PSOL-PA) criticou o requerimento

“Este projeto é uma forma de criminalização das pesquisas e a gente também precisa ter o entendimento de que as pesquisas não são ciências exatas, e que neste momento não se precisaria de uma urgência, de uma nova proposição, que vai trazer aqui mais uma forma de punição e não de aperfeiçoamento das pesquisas”, criticou.

O presidente da Câmara, Arthur Lira, disse que o texto final da proposta ainda será objeto de discussões entre os líderes.

“Nós estamos apenas votando a urgência para que os líderes, a oposição, o centro e o governo sentem-se. Não existe texto ainda pré-definido. É para trazer este assunto para discussão, num acordo prévio, e nós não estamos aqui a tratar do mérito. Portanto, não existe possibilidade de ter um texto que trate de punição de pesquisa. Nós não podemos é não ter um posicionamento para que esta casa não discuta um regramento dessas pesquisas”, disse Lira, respondendo à deputada paraense.

Arthur Lira tem se empenhado em acelerar a tramitação. O relator Paulo Martins pretende votar o projeto ainda nesta semana. A avaliação é que na semana que vem, por ser a reta final antes do segundo turno das eleições, não haverá tempo hábil para analisar o texto.

O deputado Paulo Martins (PL-PR), relator do projeto que pune institutos de pesquisa, não vai prever prisão para essas empresas.

Bastidores

Lira adotou uma regra regimental para poder colocar o projeto diretamente no plenário e ressuscitou um requerimento de 2014, protocolado no dia 7 de outubro, logo após o primeiro turno das eleições daquele ano, mas que nunca havia sido votado. Na sessão da terça-feira, PL, PP, União Brasil, PSD, Republicanos, PSC, Solidariedade, Avante, Patriota, PROS, PTB, PSDB, Cidadania e Novo orientaram a favor. PT, PSOL, Rede encaminharam contra e PDT e MDB liberaram as bancadas.

Inicialmente, a base governista tentou recolher assinaturas para que um texto de autoria do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), fosse votado, mas apenas PL, PP, União Brasil e PSC apoiaram, bancadas que somadas não atendem o requisito para que a urgência seja apreciada. Partidos de esquerda, de centro-direita, e até parte da base governista, como o Republicanos, não endossaram o pedido.

A solução encontrada foi votar um requerimento de 2014, feito para acelerar um projeto do deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), e que tem assinaturas até de deputados da esquerda, como Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Ivan Valente (PSOL-SP). Antes da votação, Jandira disse que o texto endossado por ela há oito anos não é o mesmo que o governo Bolsonaro quer aprovar. “Não era esse projeto, vamos encaminhar contra”, declarou.

Políticos que não exercem mais o mandato de deputado, como o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que era líder do MDB em 2014 e hoje está no PTB, e o senador Marcos Rogério, que estava no PDT e hoje é senador pelo PL, também estão entre os que assinaram o documento na época.

A iniciativa ainda não tem um texto definitivo definido. O projeto de Ricardo Barros foi unido ao de Rubens Bueno. Enquanto o projeto do líder do governo regulamenta a prisão, que pode ser de até dez anos, para quem não conseguir prever os resultados das eleições, dentro da margem de erro, a iniciativa do deputado do Cidadania define multa, que pode chegar a até R$ 1 milhão. Hoje a multa vai até o limite de R$ 106 mil.

Mesmo não assinando a urgência do projeto de Barros, o líder do Republicanos, Vinicius Carvalho (SP), disse que votou a favor do requerimento analisado nesta terça. O deputado prega que a análise não seja feita de forma apressada. “O mérito será para depois das eleições”, declarou. Apesar disso, Paulo Martins, o relator do projeto quer votar o quanto antes. “Deve votar antes da eleição”, afirmou.

Se aprovado pelos deputados, o texto não terá o mesmo tratamento célere no Senado. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já disse que o projeto não será colocado diretamente na pauta do plenário e precisará ser discutido na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Além disso, Pacheco também afirmou que o texto é “absolutamente inadequado porque pune muito severamente um erro”.

O movimento contra as pesquisas eleitorais é capitaneado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). O discurso contrário aos institutos se intensificou no último dia 2 de outubro, quando ocorreu o primeiro turno da eleição e o presidente obteve um resultado melhor do que o indicado pela maioria das pesquisas.

Dentro do esperado pela maior parte dos levantamentos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recebeu 48% dos votos válidos. Bolsonaro, no entanto, obteve 43%, resultado que ficou fora do intervalo da margem de erro e bem acima das intenções de voto divulgadas na véspera pelos institutos de pesquisas.

Houve, ainda, números bastante diferentes daqueles aferidos pelas pesquisas quando se apuraram os votos para governador e senador. O próprio relator do projeto é um dos que reclamam das pesquisas. Paulo Martins ficou em segundo lugar na disputa pelo Senado no Paraná, eleição vencida por Sergio Moro (União Brasil). Os levantamentos indicavam Martins em terceiro lugar, muito distante de Moro e Alvaro Dias (Podemos), que liderava as pesquisas. O deputado ficou com 29,12% dos votos válidos, pouco atrás do ex-juiz, que obteve 33,5%.

Um dos argumentos dos institutos é de que as pesquisas não buscam prever os resultados das eleições, sendo apenas um retrato do momento, uma vez que o voto do eleitor é algo mutável. Com essa desculpa, considerada “esfarrapada e irresponsável” por vários congressistas, as empresas de pesquisas ultimamente ganharam o depreciativo apelido de “Lojinhas de Percentagens”, tal é o reiterado erro de suas previsões nos últimos 20 anos sem que haja uma regulação razoável do setor.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.