Câmara aprova proibição da fabricação, comercialização e uso de linhas cortantes em pipas

O projeto de lei estipula pena de detenção e multa aos infratores
Vender linha com cerol será punido com detenção de um a três anos e multa

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É Verão! A estação “mágica” para crianças e adolescentes que, em férias escolares podem brincar à vontade durante o intervalo prolongado das aulas e soltar pipa — uma das brincadeiras mais tradicionais e preferidas da criançada —, especialmente na periferia das cidades. É divertida, envolve competição, desenvolve inúmeras habilidades, reúne amigos… e envolve perigo de vida para quem a pratica e pessoas ao entorno.

Na sessão da terça-feira (6), os deputados federais aprovaram o projeto de lei que proíbe a fabricação, comercialização e uso de linhas cortantes em pipas e brinquedos semelhantes, estipulando pena de detenção (pena privativa de liberdade que se cumpre em regime aberto ou semiaberto, salvo transferência excepcional para o regime fechado. É menos severa que a reclusão e mais rigorosa que a prisão simples) e multas. A proposta será enviada ao Senado.

De autoria da ex-deputada Nilda Gondim, o Projeto de Lei (PL n° 402/2011) tramitava há 12 anos na Casa e finalmente foi aprovado na forma de um substitutivo do relator, deputado Coronel Telhada (PP-SP), que incorporou regras para o uso de linha esportiva em competições das quais poderão participar somente adultos ou adolescentes com 16 anos ou mais.

A linha cortante, conhecida como cerol ou mesmo linha chilena em algumas localidades, pode ser fabricada inclusive artesanalmente com vidro moído e cola, substância passada na linha da pipa para facilitar o corte de linhas de pipas de adversários. No entanto, ela apresenta alto risco de ferimentos e mesmo de morte, principalmente de motociclistas ou uma descarga elétrica para quem a empina quando o brinquedo fica preso a rede de alta tensão.

Números elevados de mortos e mutilados

Segundo o relator, várias pessoas são mutiladas por essa conduta inconsequente com objetivo de diversão. “A situação é tão grave que suscitou a criação de outra demanda industrial: a fabricação de varetas fixadas nas motocicletas para impedir que tais linhas acabem por degolar os motociclistas, como ocorre com preocupante frequência”, afirmou.

Coronel Telhada ressaltou que o cerol pode também danificar a fiação elétrica de iluminação pública e causar curto-circuito, com risco de acidentes e queda de energia e choque fatal a quem pratica a brincadeira.

Código Penal

A proibição de fabricação ou uso da linha com cerol atinge tanto o ambiente de competição quanto o de lazer privado, em área urbana ou rural. Como será proibida a venda desse tipo de linha a menores de idade, o projeto remete aos fornecedores a responsabilização objetiva pelos danos causados se ocorrer a venda e do uso da linha resultarem danos a pessoas ou objetos.

No Código Penal, a fabricação, venda, comercialização ou uso, por exemplo, será punida com detenção de um a três anos e multa.

Para estabelecimentos que descumprirem a lei, a cassação da licença de funcionamento será considerada efeito da condenação.

No caso dos usuários, a pena será a mesma se o fato não constituir crime mais grave. Ainda que o uso seja para fins recreativos, em áreas públicas ou comuns, a pena se aplica, inclusive até à distância de mil metros das imediações de ruas, estradas ou rodovias e mesmo que a pessoa esteja em área particular ou privativa.

Também no código, o uso de linhas cortantes de qualquer natureza em pipas e balões ou de qualquer produto similar passa a ser qualificador para situações de crime de dano contra o patrimônio alheio, que pode resultar em pena de detenção de seis meses a três anos e multa.

Menor de idade

Se a linha cortante for utilizada por menor de idade, que é inimputável, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) passará a estipular multa de 6 a 40 salários de referência para o responsável, aplicando-se em dobro quando houver reincidência.

Após o projeto virar lei, o poder público deverá veicular anualmente, nos meios de comunicação e na rede pública e privada do ensino fundamental e médio, campanha para educar e conscientizar as pessoas sobre os riscos e as consequências associadas ao emprego de linhas e materiais cortantes de qualquer natureza em pipas, balões ou produto assemelhado.

Uso industrial

O texto de Coronel Telhada estabelece uma exceção para a fabricação e comercialização de linhas cortantes quando a finalidade é de uso industrial, técnico ou científico sem expor terceiros a risco.

Para isso, a administração pública poderá conceder autorização específica para fabricação e venda exclusiva e controlada para o fim proposto. Continua proibida, no entanto, sua livre comercialização.

Multas

Para o fabricante, importador ou comerciante irregular de linha cortante ou dos insumos para fabricá-la, o PL 402/2011 estabelece três tipos de penalidades:

– apreensão dos produtos ou insumos, sem direito a qualquer indenização;

– advertência, suspensão do alvará de funcionamento e sua cassação, na hipótese de reincidência sucessiva; e

– multa administrativa, de R$ 2 mil a R$ 30 mil, de acordo com o porte do estabelecimento infrator ou do grupo econômico controlador deste, com duplicação sucessiva a cada reincidência.

Os valores das multas irão para o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen).

As pessoas físicas, além de sujeitas à pena de detenção, poderão ser multadas com valores de R$ 500 a R$ 2,5 mil, também aplicados em dobro na reincidência. Os valores arrecadados serão revertidos em favor da segurança pública de estados e municípios.

Fiscalização

Se o projeto virar lei após a tramitação no Senado Federal, a fiscalização das novas normas caberá aos órgãos de segurança pública, com apoio dos agentes de fiscalização municipal e guardas municipais.

A autoridade pública deverá apreender imediatamente as linhas cortantes e seus insumos, permitida sua destruição.

Pipódromo

Quanto à prática de soltar pipa com linha esportiva de competição, ela somente poderá ser realizada em pipódromo. O adolescente de 16 anos ou mais terá de contar com autorização dos pais ou responsável, além de possuir inscrição em associação nacional, estadual ou municipal dedicada à pipa esportiva.

O pipódromo deve estar localizado a uma distância mínima de mil metros de rodovia pública e de rede elétrica. A linha esportiva de competição deve ter uma cor visível e consistir exclusivamente de algodão, com no máximo três fios entrançados, não poderá ter mais que meio milímetro de espessura, e deverá ser encerada com adesivo contendo apenas gelatina de origem animal ou vegetal.

A fabricação e comercialização desse tipo de linha esportiva deve ser realizada por pessoa física ou jurídica cadastrada, autorizada e sujeita a fiscalização pelas autoridades competentes.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.