Bancadas religiosas tentam impedir votação de projeto que libera cassinos e jogo do bicho

Defensores da legalização apostam no aumento do turismo, empregos e arrecadação
Resorts com cassinos nas Filipinas, passam de oito e aumentam e 400% o fluxo turístico no país

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Brasília – Se depender da bancada católica e evangélica, o projeto de lei (PL 442/1991) que cria o Sistema Nacional de Jogos e Apostas, legalizando cassinos, bingos, videobingos, jogos on line, corridas de cavalos e o jogo do bicho, se entrar na pauta sofrerá forte obstrução para a votação da matéria. Mesmo depois de mais de 30 anos sendo examinado na Câmara, o projeto não tem consenso entre os deputados e sofre forte oposição dos parlamentares religiosos.

A proposta já passou por uma comissão especial e foi objeto de um grupo de trabalho está pronta para ser votada em Plenário. O projeto original se concentrava na liberação do jogo do bicho. Agora, uma nova versão agrega (apensou) conteúdo de outros 24 projetos sobre temas correlatos. Em dezembro, o novo texto começou a ser discutido em plenário e teve aprovado o regime de urgência após acordo com a bancada evangélica que indicou um projeto de seu interesse na pauta.

A urgência de um projeto é utilizado para apressar a tramitação e a votação das matérias legislativas. A urgência dispensa interstícios (Intervalo de tempo entre dois atos do processo legislativo. Os principais interstícios são de três e de cinco dias úteis), prazos e formalidades regimentais.

No novo texto aprovado na comissão especial, fica estabelecido que os chamados “jogos de azar” ficam proibidos para menores de 18 anos. Os estabelecimentos para jogos e apostas serão abertos mediante concessão do poder público, que será responsável pela normatização e fiscalização desse mercado. A proposta determina ações de prevenção e controle para que os jogos não sejam usados para sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, numa modelo de legislação inspirada nos Estados Unidos, onde o jogo só é liberado em alguns estados.

Ficou definido no texto que os estabelecimentos que obtiverem as concessões pagarão uma taxa de fiscalização para a emissão da licença. Também serão tributados em 17% do faturamento bruto, referentes à Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico sobre Jogos e Apostas (Cide-Jogos). Quem receber prêmios acima de R$ 10 mil terá descontados 20% do valor a título de imposto de renda.

Os defensores da legalização dos jogos apostam no incremento do setor de turismo, na geração de empregos e no aumento da arrecadação. Em entrevista ao programa Painel Eletrônico, da Rádio Câmara, o deputado Herculano Passos (MDB-SP) argumenta que, atualmente, muitos brasileiros vão jogar no exterior, deixando os impostos em outros países. “Há anos o Brasil não passa de 6 milhões de turistas ao ano, com cassinos esse número vai explodir”, apostam os parlamentares a favor da aprovação da matéria.

Coordenador da Frente Parlamentar do Turismo, ele acrescenta que os ganhos não são somente com as apostas e dá exemplo de um cassino integrado a um resort.

“Um resort integrado dá oportunidade para artistas proporcionarem shows, eventos musicais, todos os trabalhadores que fazem parte desses eventos; eventos esportivos, como lutas, basquete, vôlei, eles chamam muita gente e movimentam a economia; dentro de um resort integrado tem shopping center, que movimenta muito a economia, comercializando mercadorias”, enumerou Herculano Passos como vantagens se o jogo for liberado.

Na opinião do deputado Roberto de Lucena (Pode-SP), que também falou ao mesmo programa de rádio, o tempo de tramitação da proposta na Câmara já reflete o pensamento contrário ao tema por parte da sociedade. Ele afirma que a previsão de receita com os jogos de azar está sendo superestimada.

“O número da arrecadação será muito menor do que aquele propagado pelos institutos que estão fazendo lobby, que estão defendendo a legalização dos jogos. Outra coisa: o emprego. É claro que vai gerar empregos, mas vai gerar menos empregos do que o propagado. Por quê? Existem postos de trabalhos que serão atropelados em função dos empregos gerados, por exemplo, nos empreendimentos pequenos que existem no entorno dos locais onde esses equipamentos serão instalados”, assinalou.

Roberto de Lucena ressalta que é preciso evitar que o ambiente dos jogos seja utilizado para lavagem de dinheiro, caixa 2 e o cometimento de crimes. E alerta para o risco da ludopatia, o vício em apostas e jogos.

“Eu fico assim preocupadíssimo quando tenho conhecimento que, em países como os Estados Unidos, há idosos que chegam a usar fralda geriátrica para não saírem da banca, para não deixarem o local de jogos e muitos deles perdem tudo o que tem, alguns que entram em depressão, alguns que cometem suicídio. Tudo isso tem que ser calculado no custo social, alerta”.

Mas, na opinião do deputado Herculano Passos, a legalização pode facilitar o combate à ludopatia.

“O cassino legal evita aquela pessoa que é compulsiva, o ludopata. Inclusive, na arrecadação dos impostos do cassino, uma parte já está prevista para o tratamento dessas pessoas que são compulsivas e perdem mais do que deveriam”.

Renapro
A proposta em análise na Câmara cria o Registro Nacional de Proibidos (Renapro), com o nome de pessoas impedidas de frequentar os estabelecimentos de jogos de azar. A inscrição nessa lista seria feita voluntariamente pelo jogador ou por ordem judicial em ação promovida pela família. Pelo projeto, também seriam proibidas práticas que levassem ao endividamento, como a concessão de crédito aos jogadores.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (P-AL), tem evitado expressar sua opinião pessoal, mas defende que projeto como o da liberação dos jogos não podem ficar eternamente esperando uma decisão que cabe exclusivamente ao Congresso Nacional.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.