Caminhoneiros e transportadoras podem parar o país após aumento do diesel

Superior Tribunal Federal suspende manobra dos estados sobre ICMS do diesel. Caminhoneiros que estão com prestações de financiamento atrasadas não querem mais esperar por um milagre: exigem uma solução
Caminhoneiros e transportadoras não descartam parar o país após aumento do diesel

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Brasília – A temperatura continua elevada em várias frentes de negociações, para se evitar uma greve geral de caminhoneiros, tanqueiros e transportadoras que não descartam parar o país após o último aumento do diesel autorizado pela Petrobras.

Sindicatos dos Transportadores de Combustíveis Derivados do Petróleo de vários estados, até este final de semana, começam a convocaram assembleias, com indicativo de paralisação seguida da greve geral em protesto pelo aumento de 8,8% do diesel anunciado pela Petrobras no início da semana. A categoria decidiu aguardar mais 30 dias de prazo para que a estatal explique a atual política de preços e possa sugerir mudanças nos combustíveis.

De acordo com o sindicato da categoria em Minas Gerais, o prazo será o mesmo dado para que o governo estadual faça uma proposta para a redução do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Recentemente, a categoria reivindicou que o Estado reduzisse a alíquota de 15% para 12% sobre os combustíveis.

Numa outra frente, a judicial, o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu em decisão liminar (provisória) na sexta-feira (13), cláusulas de uma norma contrária à lei que instituiu uma alíquota única de ICMS sobre o óleo diesel para todos os estados, em reais por litro, cobrada apenas na etapa de produção.

A decisão monocrática de Mendonça atendeu a um pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL), apresentado por meio da AGU (Advocacia-Geral da União), que tentava garantir a redução do ICMS sobre o combustível prevista em lei aprovada pelo Congresso em março, mas alvo de manobra dos estados para manter a arrecadação.

A alta dos combustíveis é um dos fatores que mais pressiona a inflação, problema que preocupa o presidente Jair Bolsonaro (PL) em ano eleitoral. Pesquisa do Datafolha mostrou que 68% dos brasileiros consideram o mandatário responsável pela disparada de preços. Defensores do presidente argumentam que isso não é verdade, uma vez que ele zerou, por decreto, as alíquotas incidentes da composição dos preços dos combustíveis na área federal.

Na quinta-feira (12), o presidente adiantou durante sua live semanal que recorreria à Justiça para reduzir o preço dos combustíveis. A declaração ocorreu na mesma semana em que a Petrobras reajustou o preço do diesel e o almirante Bento Albuquerque foi substituído pelo economista Adolfo Sachsida, aliado de longa data do presidente, no Ministério de Minas e Energia.

Insuficiente

A simples adoção do ICMS unificado, no entanto, é insuficiente e, na prática, não reduz os preços, o que dependeria da alíquota adotada. Mas o governo conta com o período de transição, em que as alíquotas cairiam em relação às atuais, que estão congeladas desde o fim de 2021.

A decisão do ministro Mendonça é válida desde já, mas foi enviada para que os outros 10 integrantes da corte também analisem o caso. Ainda não há data para que isso aconteça, no entanto.

O governo corre contra o tempo para evitar a paralisação do país. A lei aprovada pelo Congresso previa um período de transição, até o fim do ano, em que os estados deveriam fixar uma alíquota equivalente à média dos últimos 60 meses, o que representaria queda na carga tributária atual sobre os combustíveis.

Entretanto, em reunião no fim de março, o Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) decidiu estabelecer uma alíquota única de R$ 1,006 por litro, permitindo que cada estado dê um desconto para chegar à sua alíquota atual.

Na prática, portanto, não houve mudança no valor cobrado pelos governos estaduais, que vêm registrando recordes de arrecadação com o ICMS sobre os combustíveis. Pesquisa de preços divulgada na sexta-feira (13) mostrou que o preço do diesel nas bombas bateu recorde novamente no país.

Além de Bolsonaro, o presidente do Senado, Rodrigo Pachedo (PSD-MG), criticou a decisão do Confaz, que é formado pelos secretários de Fazenda dos  26 estados, do Distrito Federal e pelo Ministério da Economia.

Efeito cascata

O efeito do aumento do diesel é em cascata, com impactos diversos nos gastos do transporte rodoviário. Por isso, um aumento de cerca de 20% dos atuais custos operacionais já é esperado e deve ser repassado para o consumidor. Os caminhoneiros independentes estão com dificuldades de captar novos fretes e a categoria está endividada com prestações dos caminhões, às financeiras e bancos, em atraso.

O último reajuste do preço do combustível ocorreu há pouco mais de 60 dias. No último anúncio da Petrobras, a gasolina e o GLP tiveram seus preços mantidos. A Petrobras afirma que a alta é motivada pelo aumento da demanda global do diesel acima da oferta, com uma valorização maior que a do petróleo.

Fritura

A troca de comando do Ministério de Minas e Energia, com a escolha de Adolfo Sachsida para substituir Bento Albuquerque, pode levar a mudanças na diretoria da Petrobras. O presidente da empresa, José Mauro Ferreira Coelho, homem de confiança de Bento, está sob pressão e passa por uma fritura no governo, apenas um mês depois de assumir o cargo.
O presidente Jair Bolsonaro prefere manter sigilo sobre as tratativas, mas, a irritação dele chegou a nível tal que fontes do Planalto não descartam, inclusive, a possibilidade de haver nova troca no comando da Petrobras. O novo ministro Alfredo Sachsida também deve promover mudanças mais profundas em áreas-chave do Ministério de Minas e Energia, pasta a qual a Petrobras está vinculada.

O presidente da Petrobras, José Mauro Coelho; executivo assumiu a estatal em 14 de abril, indicado pelo ex-ministro Bento Albuquerque, que foi trocado nesta semana

Ao escolher Sachsida, ex-secretário do ministro da Economia, Paulo Guedes, Bolsonaro cobrou mudanças na postura da empresa. O presidente não se conforma que a petroleira tenha um lucro bilionário e não possa dar uma trégua nos reajustes durante a guerra da Rússia com a Ucrânia, período de alta volatilidade dos preços internacionais. Bolsonaro quer que as movimentações sejam feitas em espaço de tempo maior.

Um auxiliar do presidente disse que não faz sentido ele demitir Bento para ficar na mesma situação. Sachsida entrou no ministério com uma agenda de mudanças.

Coelho é o terceiro presidente da Petrobras no governo Bolsonaro e foi escolha de Bento depois que dois nomes foram descartados — Adriano Pires e Rodolfo Landim — por conflitos de interesse com a indústria de óleo e gás.

Foi Bento que fez a negociação e bancou o nome de Coelho depois de barrar a indicação de Caio Paes de Andrade, secretário especial de desburocratização do Ministério da Economia para a presidência da Petrobras, mesmo depois de o nome dele ter sido aceito por Bolsonaro.

Colega de equipe do novo ministro de Minas e Energia e descartado por Bento, Caio voltou a figurar na lista de nomes para a diretoria da Petrobras.

Com o preço alto dos combustíveis e de energia elétrica ameaçando sua reeleição, Bolsonaro vem demonstrando insatisfação em relação à gestão de Coelho à frente da Petrobras.

Disse esta semana que a petroleira está “gordíssima, obesa”, em referência ao lucro da estatal de R$ 44,56 bilhões no primeiro trimestre do ano. “Petrobras, você é Brasil! Ou quem está aí dentro não pensa no seu país? O povo está sofrendo bastante com o preço do combustível”, disse Bolsonaro a jornalistas após discursar em uma feira agropecuária em Maringá (PR).

A União é o maior acionista da empresa. Ou seja, recebe a maior parte dos dividendos da estatal, que vão direto para o caixa do governo. A governança da estatal tem sido uma barreira a impedir uma mudança na política de reajustes de paridade internacional.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.