Parauapebas: Saúde dispara quase R$ 12 milhões em contratações neste início de ano

Problemas com justificativas e erros de português levaram Procuradoria a dar “catracada” nos exageros da secretaria. Saúde de Parauapebas consome mais de R$ 200 milhões e serviço não está sequer entre os 1.750 “mais belos” do país.

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Se depender de gastar dinheiro, a saúde de Parauapebas vai dar uma guinada daquelas ao longo deste ano de 2019. Licitações milionárias estão a caminho para dar o “upgrade” de que o tão criticado setor precisa para oferecer atendimento digno aos cerca de 210 mil habitantes estimados para o município. Mas será?

O Blog do Zé Dudu fez uma visita ao universo das licitações da Secretaria Municipal de Saúde (Semsa), que terá como bala na agulha, pelo menos, R$ 200 milhões para gastar este ano, cerca de R$ 9,23 milhões acima do orçamento de 2018. Foram separados três processos licitatórios mais recentes, que entraram 2019 na expectativa de serem abduzidos por algum contratante e que já passaram pelo olhar de advogados e procuradores da prefeitura.

Saúde por aparelhos

No dia 5 de outubro do ano passado, a Semsa disparou memorando à Secretaria Municipal de Fazenda (Sefaz) pedindo autorização para iniciar licitação com vistas a contratar uma empresa expert na prestação de serviços de assistência de terapia renal para atender o Hospital Geral de Parauapebas (HGP), notadamente 55 pessoas que dependem dos serviços, segundo informado pela secretaria. O valor disponível para gastar com a empreitada é de R$ 6.404.445,60 durante um ano.

Do pacotaço de serviços constam suporte dialítico, consultas, exames, avaliações para pacientes crônicos e agudos, equipamentos, manutenção e todos os insumos e recursos humanos necessários. Para chegar ao custo milionário do serviço, a Semsa cotou o valor junto a três fornecedores, dois de Imperatriz (MA) e um de Marabá. Um deles até oferece o serviço por R$ 300 mil mais barato.

A Procuradoria-Geral do Município (PGM) fez diversas recomendações dadas as inconsistências encontradas no processo, como incorreções e justificativas simplórias para a grandiosidade do contrato. Os advogados da prefeitura orientaram que o processo fosse revisado, após as alterações indicadas no parecer, a fim de que fossem evitadas divergências entre o Termo de Referência, a Minuta de Edital, a Minuta da Ata de Registro de Preços e a Minuta de Contrato Administrativo.

No raiar deste ano, a licitação andou e foi publicada nos diários oficiais da União e do Estado do Pará. Depois de amanhã, quarta-feira (16), será o dia da abertura dos envelopes. Leva o contrato a empresa que oferecer os serviços discriminados em edital pelo menor preço. Só para lembrar: são 6,4 milhões em jogo para atendimento de hemodiálise a, segundo a Semsa, 55 pacientes.

Processo quase caduco

Ainda está rolando uma licitação que começou, pasme, no dia 27 de fevereiro do ano passado para contratação de empresa especializada em serviços de gestão de equipamentos médico-assistenciais para manutenção, calibração e reparos, incluindo a reposição de peças e acessórios, em equipamentos biomédicos. O processo quase caducou. A prestadora dos serviços iria administrar R$ 2.994.729,24, que miram o HGP (R$ 1.497.364,62), a Policlínica (R$ 898.418,77) e a UPA (R$ 598.945,85). O valor foi reajustado para R$ 2.995.063,80.

Criticada por muitos pacientes ao longo dos últimos meses pela falta — jamais confirmada — de insumos básicos, como gases, esparadrapos e até seringas, a saúde pública de Parauapebas levou, nesse processo, um baita puxão de orelha de nove páginas da PGM, que recomendou diversas modificações no edital e seus anexos. A Procuradoria bateu pesado em cima da exigência de apresentação de atestados para fins de qualificação técnica em licitação.

Depois de tantas idas e vindas no processo, apenas em 21 de dezembro ele foi finalmente publicado nos diários competentes. A abertura de envelopes para a concorrência ficou de ocorrer na quarta (9) da semana passada. Até o momento, no entanto, a Prefeitura de Parauapebas não deu sinal de fumaça do que pode ter ocorrido nessa licitação de menor preço.

Transporte que pariu

A Secretaria Municipal de Saúde quer “emprenhar” cerca de R$ 2,4 milhões dos recursos públicos. Na verdade, ela acelera o passo para, às 10 horas do próximo dia 25, uma sexta-feira, abrir envelopes de proposta e documentação referentes ao processo licitatório que busca contratar uma empresa para prestar serviços no ramo de locação de veículos automotores leves e pesados (caminhão-baú alumínio 3 por 4, picape cabine estendida, carro de passeio, van, camionete e veículo com capacidade para sete lugares). Não é necessário motorista.

A Semsa está disposta a soltar R$ 2.403.717,36 para, segundo ela, “dar apoio às coordenações” nos setores de Gestão Estratégica (14 veículos), Atenção Básica (11 veículos), HGP (três veículos), Vigilância em Saúde Ambiental (três veículos), Vigilância em Saúde Epidemiológica (dois veículos), Vigilância em Saúde Sanitária (dois veículos) e UPA (um veículo). Esse valor, no entanto, é só para um ano de locação. Esta década, só o valor gasto pela Prefeitura de Parauapebas com locação de veículos sob as mesmas alegações daria para comprar concessionárias inteiras do Pará.

O parecer da PGM dá um puxão de orelha na Semsa, que, no item 37, grafa “empenho” como “emprenho” e detona diversas outras redações, recomendando uma série de mudanças no edital e seus anexos, entre retificações e supressões, para garantir segurança jurídica no processo. Nesta segunda-feira (14), foi publicado em diários oficiais o “Aviso de Prorrogação”, em razão de modificações feitas pelo 1º aditivo.

Milhões por milhões

Apenas com os três processos deste início de ano, a saúde vai sequestrar R$ 11.803.226,76 dos cofres do município de Parauapebas. É mais que o desembolsado por ano em 72 das 144 prefeituras paraenses com o serviço de saúde pública, para dar conta de milhares de cidadãos. Não muito longe, a Prefeitura de Curionópolis, por exemplo, gastou, entre setembro de 2017 e outubro de 2018 (um ano, portanto), R$ 10,93 milhões para cuidar da saúde de 15 mil pessoas dependentes da rede pública — há 2.700 curionopolenses beneficiários de planos de saúde.

A situação financeira de Parauapebas, mesmo farta e que abre margem para gastos estratosféricos, precisa se adequar à realidade da população para ser eficiente a ponto de chegar a esta e atendê-la. O município tem, hoje, cerca de 130 mil dependentes do sistema público de saúde. Isso porque, segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), 79 mil habitantes são beneficiários de planos de saúde, ou seja, utilizam majoritariamente serviços particulares.

Se essa população, de repente, migrasse para o sistema público, por um motivo fortuito qualquer, a saúde de Parauapebas não suportaria, mesmo com a abundância de recursos financeiros em razão dos exageros e descompassos historicamente criados. Hoje, a saúde oferecida pela rede pública municipal está entre as 100 que mais consomem recursos no Brasil, de acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), mas não aparece sequer entre as 1.750 melhores, segundo indica a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan). Não há milhão que chegue.