Esforço concentrado e véspera do recesso adiam instalação de duas comissões mistas de MPs no Congresso

Colegiados tratarão alteração da tabela do Imposto de Renda e obras destinadas à Educação Básica
Presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (esq.) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (dir.) protagonizam, desde o início dessa legislatura, um impasse sobre o rito de medidas provisórias — grande dor de cabeça para o governo

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O governo não conseguiu garantir a instalação de duas comissões mistas de MPs (medidas provisórias) no Congresso Nacional. A primeira tentativa ocorreu no dia 27 de junho e, com o esforço concentrado anunciado nesta semana, somado à proximidade do recesso parlamentar que será no dia 17 de julho, a tarefa tem ainda o complicador do impasse entre a Câmara e o Senado, que divergem sobre o critério utilizado na composição dos membros, o que deve empurrar a instalação para agosto.

A situação expõe, mais uma vez, a fragilidade da base do governo no Congresso. As duas medidas provisórias que aguardam instalação visam analisar e produzir um texto que vai para votação, sobre as medidas enviadas pelo governo ao Congresso, que tratam da alteração da tabela do IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física) e de obras destinadas à Educação Básica. Foram feitas quatro tentativas de fazer com que o colegiado da (MP 1.171 de 2023) saia do papel, já a da educação (MP 1.174 de 2023) houve três tentativas de instalá-la, sem sucesso.

Após esforços da articulação política o governo, a muito custo, a instalação de três comissões: a do reajuste dos funcionários públicos federais (MP 1.170 de 2023); a do reajuste do salário mínimo (MP 1.172 de 2023); e a do Programa de Alimentação do Trabalhador (MP 1.173 de 2023). Todas precisaram de mais de duas tentativas para começar a funcionar, mas já se encontram com a relatoria para prosseguirem a tramitação.

Um dos problemas para as comissões serem instaladas é a falta de indicações de deputados. Nesta semana será impossível, em razão do esforço concentrado e o Ato da Mesa da Câmara que suspendeu os trabalhos das comissões e das CPIs para que os deputados foquem nas votações da pauta econômica.

Além disso, o pano de fundo, que é o impasse entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sobre o rito de análise de MPs, continua.

Em 16 de junho, Lira se reuniu com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e tratou, entre outros temas, sobre o assunto. Depois do encontro, informou que o presidente se comprometeu a editar menos medidas provisórias, o que, de acordo com ele, é um “anseio do Congresso Nacional”.

Lula é o presidente que mais edita MPs em início de governo. No terceiro mandato, o petista já publicou 21 MPs. Só o seu 2º governo (2007-2010) superou o número atual. Foram 31 medidas de 1º de janeiro a 26 de maio de 2007.

Como comparação, Jair Bolsonaro (PL) tinha publicado 14 MPs no mesmo período de 2019. As medidas provisórias entram em vigor assim que são publicadas, mas precisam ser aprovadas pelo Congresso em até 120 dias. Caso os congressistas não votem ou não aprovem as medidas, elas perdem o efeito.

Em 15 de junho, um dia antes da reunião de Lira e Lula, Pacheco reforçou que medidas provisórias terão comissões mistas no Congresso. A declaração indicou que o presidente do Senado não irá recuar e o impasse será mantido no tema, apesar da pressão de Lira.

As comissões mistas — com deputados e senadores — para analisar MPs voltaram oficialmente em 23 de março. O rito foi alvo de impasse institucional entre Pacheco e Lira. O que começou com uma minuta de ato conjunto, em fevereiro de 2023, terminou em um ato unilateral do senador.

Rito das Medidas Provisórias

A Constituição determina que toda medida provisória seja analisada por uma comissão composta por 12 senadores e 12 deputados antes de seguir para o plenário da Câmara e, depois, do Senado.

No início da pandemia, por causa das restrições sanitárias, o STF (Supremo Tribunal Federal) deu uma espécie de salvo-conduto para o Congresso pular a etapa das comissões mistas na análise de MPs enquanto durasse a emergência sanitária da covid. Foi uma excepcionalidade.

O rito expresso aumentou o poder do presidente da Câmara sobre a pauta legislativa do governo, já que, nesse regime, cabe exclusivamente a ele escolher o relator das medidas provisórias e pautá-las para votação.

Em abril de 2022, ainda durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), o então ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, encerrou o estado de emergência sanitária.

Com a decisão, deixava de existir a condicionante do STF para autorizar o Congresso a descumprir o mandamento da Constituição sobre as comissões mistas de MPs. No entanto, a poucos meses da campanha eleitoral, Câmara e Senado preferiram não retornar ao rito regular naquele momento.

Em fevereiro de 2023, o presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco, comandou reunião da comissão diretora da Casa que aprovou uma minuta de ato conjunto com a Câmara pela retomada das comissões mistas de MPs.

Lira não quis assinar o ato e perder o poder conquistado com o rito adotado na pandemia. A decisão da cúpula do Senado jamais teve validade e a corda esticou na disputa entre os dois presidentes do legislativo federal.

Líderes do Senado e articuladores políticos do governo Lula tentam costurar uma solução com a Câmara para destravar a tramitação das medidas provisórias.

Em 23 de março, Pacheco assinou ato para instalar comissões das MPs de Lula. Depois disso, algumas comissões, como a que reformulou os ministérios do governo Lula, e as que recriaram os programas Mais Médicos, Minha Casa, Minha Vida e Bolsa Família foram instaladas e aprovaram as MPs.

No entanto, as instalações demoraram e deixaram o governo com pouco tempo para aprová-las antes do prazo de validade. Medidas provisórias tem validade de 90 dias e podem ser prorrogadas pelo Congresso por mais 90 dias. Para se tornarem permanentes, devem ser aprovadas pela Câmara e pelo Senado.

Desde o início da gestão Lula, o Congresso já ignorou três MPs que venceram em 1º de junho. Uma delas impôs derrota ao Ministério da Fazenda, que esperava arrecadar cerca de R$ 50 bilhões com a volta do voto que o favoreceria em caso de empate no Carf (Conselho de Administração de Recursos Fiscais), matéria que volta a ser analisada na Câmara como primeiro item da pauta, mas agora como projeto de lei com regime de urgência, e como ela não foi votada, a pauta está sobrestada, ou seja, trancada até o PL ser votado. A MP que caiu se tornou projeto de lei com urgência constitucional e precisava ser aprovada em 45 dias. O prazo venceu na terça-feira (20/6) e agora trava a pauta da Câmara, que não pode analisar nada antes deste tema ser discutido no plenário.

O impasse entre Câmara e Senado sobre o rito da MPs deve permanecer quando os trabalhos retornarem do recesso. O último dia de trabalho desse semestre será daqui a duas semanas, na segunda-feira (17/7).

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.