Sobrevivente da Curva do “S” afirma que mortos somam bem mais que 19

Com atos culturais e políticos, sem-terra ligados ao MST ocuparam a Curva do "S" desde o último dia 10. Hoje, data em que aconteceu a tragédia, ocorreu o encerramento das manifestações

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“Ainda hoje sinto uma tristeza muito grande. Estou surdo e tenho uma bala alojada na cabeça, entre o crânio e o cérebro. Hoje tenho a minha terrinha, mas ela foi conseguida com o derramamento do sangue dos companheiros. Isso é muito triste”. O depoimento é do agricultor José Carlos Agarito Moreira, à Reportagem do Blog do Zé Dudu, na manhã desta quarta-feira, 17 de abril, 23 anos do episódio que ficou conhecido como Massacre da Curva do “S”, em Eldorado do Carajás.

Agarito é um dos sobreviventes daquele dia trágico, quando 19 camponeses ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), morreram ao entrarem em confronto com 155 policiais militares de quarteis de Marabá e Parauapebas.

Eles obstruíam a Rodovia PA-150, hoje BR-155, à altura da Fazenda Macaxeira, da qual exigiam a desapropriação, e reivindicavam ônibus para transportá-los até Belém, a fim de procurarem justiça.

Este ano, desde o último dia 10, na Curva do “S”, acontece o 14º Acampamento Sem-Terra “Oziel Alves Pereira”, que reúne jovens do MST, dos Estados do Pará, Maranhão e Tocantins. “É uma pena que a conquista de um pedaço de terra tenha sido dessa forma”, lamenta o ex-coordenador do MST e hoje secretário de Agricultura de Parauapebas, Eurival Martins Carvalho, o Totô, que afirma: “Aquilo não foi provocado pelos trabalhadores, mas por aqueles que negam o direito de dividir o que é do povo, da sociedade”.

Maria Raimunda César de Sousa, coordenadora do MST, afirma que a programação, que acontece anualmente, homenageia os “mártires” do movimento de luta pela terra. “Estamos homenageando aos nossos camaradas que foram covardemente assassinados pelo Estado brasileiro, por meio de um pacto com os fazendeiros e empresas de mineração”, disse ela.

“De ontem para hoje, não consegui dormir. Aquilo tudo me veio à mente de novo. E não foram só 19 mortos, não. Foram mais, muito mais, inclusive crianças e idosos. Ainda hoje tem gente procurando parentes que desapareceram naquele dia triste”, conta José Agarito Moreira, com as lágrimas rolando pela face.