Senado não tem data para aprovar Reforma Tributária

O presidente Rodrigo Pacheco disse que os senadores querem aperfeiçoar o texto aprovado na Câmara
Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco na reunião com líderes partidários e ministros do governo

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Brasília – Após a Câmara dos Deputados cumprir um esforço concentrado, na semana passada, entrando em modo “recesso branco antecipado”, a partir desta segunda-feira (10), por determinação do presidente Arthur Lira (PP-AL), embora o calendário aponte apenas o dia 17 de junho a previsão do encerramento do semestre no Congresso Nacional, a semana legislativa fica, portanto, concentrada no Senado Federal, que inicia o exame da PEC da Reforma Tributária, do PL do Carf, a volta da Funasa e das mudanças no marco legal do saneamento básico, matérias fundamentais para a agenda do governo federal.

Com a decisão de Arthur Lira, Todas as comissões estão paralisadas no Congresso antes do recesso parlamentar começar. A única que deve ter movimentações nesta semana é a CPMI dos Atos Golpistas. Entre as outras, nenhuma tem agenda na semana, como a das Americanas, das Apostas Esportivas, entre outras, que só voltarão em agosto. Na última semana, essas comissões já tinham adiado reuniões pela votação das pautas econômicas.

Ao que parece, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sinalizou a líderes partidários que a Casa não repetirá a pressa da Câmara. Por exemplo, o texto da reforma tributária poderá apensar outras Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que tratam do tema à matéria.

Mesmo antes da aprovação na Câmara, o assunto foi debatido por Rodrigo Pacheco com os líderes durante reunião que ocorreu na última quinta-feira (6). Houve consenso entre os presentes de que o ritmo no Senado deve ser mais lento. A ideia é que a matéria comece a ser discutida na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Na Câmara o texto do relator foi direto à votação no Plenário.

Uma das PECs que deve ser incluída na proposta da Câmara é o projeto de emenda constitucional (PEC nº 46/2022), de autoria do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). Ele afirma que a sua visão de reforma é “completamente diferente” da que foi aprovada pelos deputados. Um dos pontos destacados por ele é manter separados os impostos federais, estaduais e municipais.

O texto que passou na Câmara prevê a substituição dos tributos PIS, Cofins e IPI (federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) pelo IVA Dual. A intenção é simplificar o excesso de regras no pagamento de impostos pelas empresas.

“Os senadores vão querer entender melhor esse assunto. Os governadores têm muito mais acesso aos senadores, os prefeitos também”, disse Oriovisto.

Ainda não ficou claro se os líderes pretendem apensar também ao texto aprovado pela Câmara a PEC nº 110/2019, de autoria do presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (União-AP). Na proposta, o autor propõe extinguir tributos e criar o Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS).

Diante desse cenário, ficou claro uma coisa, a aprovação da reforma tributária no Senado poderá durar meses. Há quem diga que será votada apenas em outubro, o que certamente vai gerar um enorme prejuízo ao país se o atraso exagerado se confirmar.

O líder do PSDB, Izalci Lucas (DF), declarou que os senadores já definiram em reunião que vão cobrar mais informações do governo sobre a reforma. A ideia conta com apoio de partidos de oposição, como o PL.

“O governo tem capacidade de simular a reforma e ninguém teve acesso a isso ainda. A Receita Federal tem condições de pegar qual é a arrecadação hoje e mostrar como ficará com a nova base de cálculo. O governo precisa ser transparente e participar mais, não só jogar para o Congresso”, disse Izalci, contador experiente antes de exercer cargos políticos.

O líder do PSD, senador Otto Alencar (BA), criticou a tramitação na Câmara, que ocorreu em sistema semipresencial e permitiu votação remota. Além disso, o texto final entrou no sistema “em cima da hora”, conforme o Blog do Zé Dudu publicou (confira aqui). Para Otto, o Senado terá de apreciar os pontos com ainda mais atenção.

“O relatório foi inserido no sistema instantes antes da votação. Definir um assunto complexo como esse por via semipresencial é brincadeira. É brincar com quem sustenta a nação que é o contribuinte”, disse Alencar, citando como exemplo que votações como a da reforma previdenciária ocorreram em formato presencial.

Correligionário de Otto, o senador Angelo Coronel (BA) afirmou que faltou debate na apreciação da reforma, que classificou como “açodada”. “Eu sou a favor da manutenção de impostos municipais e estaduais. A alíquota estadual, por exemplo, deve ficar a critério dos governadores. Do jeito que foi aprovado esvazia o poder legislativo estadual e municipal”, argumentou.

Judicialização no horizonte

Outra crítica que ganhou corpo após a aprovação da reforma tributária na Câmara é o texto da Emenda Aglutinativa de Plenário (EMA 1 PEC 45/2019) apresentada em plenário durante a votação e aprovada pela Câmara dos Deputados, que autoriza os Estados e o Distrito Federal a criarem um novo tributo local para financiar investimentos até 2043.

Essa emenda atendia a diversos pedidos de setores e até mesmo do governo Lula. Apelidada de “Cavalo de Troia”, tem 34 páginas e artigos que beneficiam de igrejas a montadoras de automóveis.

Permite, por exemplo, que governadores criem uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados que são produzidos nos seus Estados. Esse tipo de contribuição, até agora, era prerrogativa da União. Nos termos da redação da emenda, já há advogados que se manifestaram sobre a inconstitucionalidade do dispositivo, uma vez que cabe apenas à União a criação de novos impostos.

Para o tributarista Luiz Bichara, do escritório Bichara Advogados, a emenda cria uma competência constitucional nova, dando autorização para que os Estados criem tributos novos. Seria, diz, um “descompromisso” da própria Proposta de Emenda à Constituição (PEC) aprovada na Câmara com a manutenção da carga tributária.

“Certamente estamos diante de um dispositivo que vai onerar exportações”, disse. “Amanhã os Estados poderão tributar com essa nova contribuição petróleo, energia, minério…”, ressaltou. “É uma nova Lei Kandir”, fizeram coro, deputados do PSOL no decorrer das discussões para a aprovação da matéria na Câmara.

A PEC da reforma tributária também ampliou a imunidade tributária de “templos de qualquer culto”, incluindo nessa imunidade também “suas organizações assistenciais e beneficentes”, na contramão da tentativa da Receita Federal feita nos últimos anos de diminuir essas isenções.

As exceções no texto aprovado na Câmara dos Deputado já eram previstas pelos analistas do mercado e tributaristas, mas não na dimensão que tomou corpo. Confira quais são algumas das principais exceções:

• A ampliação da imunidade tributária de “templos de qualquer culto” para “entidades religiosas, incluindo suas organizações assistenciais e beneficentes”;

• Criação das novas hipóteses de alíquotas reduzidas em 60% do novo imposto: produtos e insumos aquícolas, atividades desportivas e cibersegurança;

• Volta do Programa emergencial de retomada do setor de eventos (Perse);

• Isenção ou alíquota zero para reabilitação urbana de zonas históricas e reconversão urbanística;

• Obrigatoriedade para que o Ministro da Fazenda compartilhe dados e informações, inclusive protegidas por sigilo fiscal, para cálculo das alíquotas de referência pelo Senado;

• O Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, previsto na reforma, também se aplicará às montadoras e fabricantes beneficiárias de incentivos fiscais de IPI do Programa Rota 2030, que ficam prorrogados até 2032e a

• Criação de competência estadual para criar contribuição sobre produtos primários e semielaborados até 2043.

Parte da oposição, o senador Sergio Moro (União-PR) seguiu na mesma linha e disse que “faltou debate com a sociedade e com os próprios parlamentares”. “O espaço no Senado vai ser propício para essa discussão, pelo menos agora temos um texto conhecido, é um ponto de partida.”

Na quinta-feira (6/7), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já dava como certo que o texto retornaria para a Casa após alterações no Senado. “Não tenho essa ilusão de que a PEC não sofrerá alterações no Senado. Então ela deve retornar à Câmara até que a gente construa um texto comum”, afirmou Lira em entrevista à BandNews.

Após a votação, Lira voltou a dizer que o texto deve passar por mudanças, mas fez um apelo para que ao menos a espinha dorsal da proposta seja mantida.

Apesar do clima de mal-estar entre alguns senadores, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, demonstrou mais otimismo. “Eles (senadores) estão se sentindo muito contemplados pelo trabalho feito pelo relator”, disse.

Haddad acrescentou que o relator da matéria na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), “fez um trabalho de mediação muito grande” com os senadores. Também citou que Aguinaldo contemplou em seu parecer trechos da PEC 110, que já foi apreciada pelos senadores. “Acredito que não vamos ter grande dificuldade no Senado”, reforçou o ministro. Mas, o que preocupa é o prazo em que os senadores poderão votar a matéria e se demorar o governo entrará em campo.

Os senadores chegaram a ser chamados para participar do grupo de trabalho da Câmara, mas se recusaram porque não queriam responder ao comando de um deputado. Agora, também querem ter a chance de formar o seu próprio GT.

Nos corredores do Senado, a avaliação é que a definição do relator da matéria vai ditar também como será o rito da tramitação, a depender do nível de proximidade com o Palácio do Planalto. A escolha, no entanto, deve ficar para agosto.

Na bancada do Pará no Senado, é quase certo a aprovação da matéria pelos três senadores do estado.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.