PSOL apresenta projeto para acabar com autonomia do Banco Central

Base do governo também quer convocar presidente do órgão para dar explicações na Câmara
Presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, participou nesta quarta-feira (15), da sessão do Congresso que comemorou os 130 anos de atividade do TCU

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Deputados um projeto de lei complementar (PLP nº 19/2023) para acabar com a autonomia do Banco Central, suspendendo os efeitos da Lei Complementar nº 179, de 2021, num momento em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), dia sim, outro também, critica a política monetária do órgão.

O partido justifica a apresentação do projeto afirmando que: “Do ponto de vista político, a atual legislação não torna a composição e condução da política monetária do Banco Central neutra, mas sim alija a participação cidadã̃ através de seus representantes das definições e do processo decisório.”

Para eles, “trata-se de um contrassenso, pois não estabelece sua independência, isenção, impessoalidade ou, sequer, sua proteção contra a política. Na verdade, estabelece uma forte dependência com o mercado e os setores financeiros.”

“Esse efeito de captura ou entrega da regulação à parte do setor regulado, ocasiona o fim da autonomia de fato que hoje usufrui o banco, cria obstáculos na fiscalização e controle,” segundo os autores do texto.

O projeto chega na esteira das discussões sobre o nível da taxa de juros básica calibrado pelo Banco Central. Não está explícito, mas a interpretação do gesto do Psol expõe a intenção da legenda em personalizar o debate, apontando o presidente do Banco Central, o economista Roberto Campos Neto, indicado pelo governo anterior, como um “bolsonarista infiltrado no comando da política econômica nacional”, como acusa o deputado Guilherme Boulos (Psol-SP), líder do partido na Câmara dos Deputados.

O presidente do Banco Central tem mandato até o final de 2024. A ideia é a de que o órgão tem que ser independente para poder perseguir a meta de inflação fixada pelo Conselho Monetário Nacional sem influências políticas. Isso porque um dos principais instrumentos para baixar a inflação é o aumento da taxa de juros. Desde setembro do ano passado, a taxa é de 13,75% ao ano, uma das maiores do mundo. Juros altos acabam reduzindo o crescimento econômico porque travam o crédito para as empresas. No projeto do Psol, a missão do BC seria a meta de inflação, mas também o pleno emprego.

A discussão sobre a autonomia voltou depois que o presidente Lula começou a criticar a manutenção da taxa básica em 13,75% ao ano. Logo, economistas como Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, afirmaram que a taxa é alta mesmo; mas que só pode baixar quando existirem sinais mais claros de que as contas públicas ficarão equilibradas.

Outros economistas, como André Lara Resende, ex-presidente do BNDES, passaram a argumentar, porém, que o endividamento do país não está alto e que a inflação atual decorre de questões ligadas à oferta de produtos por causa da pandemia e da invasão da Ucrânia. Ou seja, não seria um movimento de crescimento da demanda.

Para o deputado Chico Alencar (Psol-RJ), que falou sobre o assunto no programa Painel Eletrônico, em transmissão da Rádio Câmara, a política econômica tem que olhar a questão social também: “Na verdade, um ente público como o BC tem que estar a serviço do interesse público. E não como é hoje; basta olhar a composição da sua diretoria, o histórico de trabalhos dos seus diretores, a começar pelo atual presidente, no mercado financeiro e na política partidária”. 

“É bom lembrar que o Roberto Campos Neto foi um atuante membro da campanha de Jair Bolsonaro,” disse, voltando a atacar o presidente do BC.

Discordância

Também entrevistado pelo Painel Eletrônico, o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), que relatou a lei atual de autonomia do Banco Central, acredita que a regra traz mais segurança aos agentes econômicos: “Sobretudo para que a gente possa fazer um debate independente do governo de plantão. Se é um governo de centro, de esquerda, de direita… Na hora que a gente tem um banco independente, automaticamente a gente vai ter segurança institucional para a gente poder equilibrar, controlar as nossas contas públicas, as nossas metas de inflação. E ter previsibilidade, que isso é fundamental para a economia”.

Ele reconhece o efeito fiscal negativo da taxa de juros, afirmando que cada ponto percentual da taxa aumenta a despesa do governo com juros em R$ 50 bilhões; quase o mesmo valor necessário para pagar o extra de R$ 200 do Bolsa Família. Mas ele explica que o movimento de queda tem que observar aspectos técnicos.

Engrossando as críticas à independência do BC, o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) apresentou requerimento (REQ nº 118/2023) para que o presidente do Banco Central venha à Câmara explicar a política monetária, além de um erro de cálculo do fluxo cambial de R$ 14,5 bilhões divulgado em janeiro pela autarquia.

Lira se manifesta

Diante de todo o ruído que o assunto tem repercutido, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou, em evento promovido pelo banco BTG Pactual nesta quarta-feira (15), que a legislação pode ser até aprimorada, mas não há como mudar radicalmente o que já foi aprovado há dois, três ou quatro anos pelos parlamentares, como a autonomia do Banco Central, deixando claro que o assunto, nos termos em que o Psol quer conduzir se trata de um retrocesso.

Ele afirma que “a prioridade é reforma tributária, e não revisão de reformas já aprovadas pelo Congresso”.

Lira disse ainda que o presidente do BC pode comparecer à Câmara para esclarecer as críticas dos deputados à sua gestão. “Eu não vejo nenhum problema de o presidente Roberto ir ao Congresso, tenho certeza de que, se ele for, se houver um convite, com bastante sensatez, essas coisas serão esclarecidas,” afirmou o presidente da Casa.

Por Val-André Mutran – de Brasília