Projeto desvincula R$ 160 bi de fundos constitucionais

Os recursos estão parados em 29 fundos públicos que têm destinação específica, mas se forem desvinculados serão destinados ao caixa do governo e ajudará o país nas perdas econômicas pós-pandemia

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Brasília – Na relação dos inúmeros projetos de impacto que tramitam no Congresso Nacional que podem ajudar o país a enfrentar as perdas econômicas pós-pandemia, a Câmara dos Deputados vai votar na próxima semana projeto que pode garantir R$ 160 bilhões de receitas extras para o financiamento das despesas com a covid-19. O projeto de lei complementar (PLP 137/2020), de autoria do deputado da oposição Mauro Benevides (PDT-CE), desvincula os recursos de 29 fundos públicos que têm destinação específica e não podem ser usados para bancar outras despesas num total de R$ 160 bilhões.

O projeto libera para o caixa do governo R$ 160 bilhões que acaba ficando parado na conta única do Tesouro, uma espécie de “conta corrente” onde está depositado o dinheiro do governo federal.

A equipe econômica apoiou o projeto, que tem tramitação mais rápida do que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) dos fundos públicos apresentada no fim do ano passado — que prevê o fim de 241 fundos e libera os recursos para abatimento da dívida pública. As duas propostas estão alinhadas, mas o projeto de Benevides é mais rápido de ser aprovado do que a PEC, que exige dois turnos de votação e quórum qualificado para aprovação, e está sendo considerado um primeiro passo.

A PEC dos fundos é parte de um conjunto de três propostas fiscais do ministro da Economia, Paulo Guedes composto pelas PECs: do Pacto Federativo, Emergencial e dos Fundos Públicos. Com a pandemia, a tramitação dessas PEC foi interrompida devido o estado de emergência sanitária ocasionado pela Covid-19.

Mauro Benevides é economista e foi secretário de Fazenda do Ceará por mais de uma década, disse que a retirada do “carimbo” desses fundos pode financiar a prorrogação do auxílio emergencial, sem ter de emitir dívida nova.

Segundo Benevides, a previsão é que a votação aconteça na próxima quinta-feira (2). A urgência do projeto foi votada pelo colégio de líderes. Ele disse que o relator do projeto, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), prometeu entregar o parecer em 72 horas.

“O Tesouro está doido por esse dinheiro”, disse o pedetista. Para ele, o projeto melhora a gestão orçamentária e tem a vantagem de não ser uma PEC. “É uma proposta mais simples de desvinculação, porque não é para todos os fundos”, ressaltou.

Pelos seus cálculos, os recursos acumulados em todos os fundos é R$ 253 bilhões. O projeto original prevê a desvinculação de R$ 177 bilhões desse total, mas o deputado admitiu que há pressão para a retirada de alguns, o que deve reduzir o valor para cerca de R$ 160 bilhões. A conta única tem hoje R$ 1,2 trilhão, mas boa parte está carimbada, inclusive o dinheiro dos fundos.

Na avaliação de Benevides, o “charme” do projeto é criar uma fonte adicional de receitas para que o governo possa gastar com a covid-19. Hoje, o governo está usando parte do chamado “colchão” da dívida — que está na conta única e é usando para a rolagem da dívida — para financiar os gastos com a covid-19. “Não existe social sem dinheiro”, disse ele.

Entre os fundos que poderão ser desvinculados, estão os para o Desenvolvimento Tecnológicos das Comunicações; Social; de Garantia à Exportação e de Aviação Civil.

Na justificativa do projeto, Benevides destaca que ele tem finalidade de evitar um “extraordinário” aumento da dívida e oferecer sustentabilidade fiscal no médio e longo prazos, mesmo financiando o combate à pandemia e realizando ações que ajudam a manutenção do emprego e da renda.

Os recursos desvinculados podem suprir, pelo menos em parte, a queda da arrecadação com a pandemia. Na avaliação do deputado, o valor pode ser suficiente para complementar a receita que estava prevista, antes da redução da atividade econômica, para pagar as despesas emergenciais, já que esses recursos já foram arrecadados.

Além da articulação para votação na Câmara, Benevides já está em conversações adiantadas com senadores para discutir o projeto. Os críticos alegam que se trata apenas de uma operação contábil, sem dinheiro novo.

Para o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Felipe Salto, o projeto é bom para a gestão, mas não é “pote de ouro no fim do arco-íris”. “Melhora a vida, mas não é uma carta branca para gastar”, disse. A vantagem é que o Tesouro precisará emitir menos títulos. Ele explicou que, por causa da rigidez orçamentária com as vinculações, o governo tem o dinheiro, mas não pode gastar porque teve outras necessidades de gastos.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente em Brasília.