Oposição ameaça recorrer ao STF para a instalação de CPIs no Senado

Senadores da oposição quiseram armar “barraco” após fala de Rodrigo Pacheco, adiando para após as eleições a instalação de Comissões Parlamentares de Inquérito

Continua depois da publicidade

Brasília – É cada vez mais comum a população, incrédula, assistir aos comportamentos teatrais e ridículos de alguns senadores que são incompatíveis com o recato que o cargo exige. Exemplo disso foi o “piti” protagonizado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), após ouvir a decisão do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que está inclinado a instalar três comissões parlamentares de inquérito, já protocoladas e com assinaturas conferidas, apenas após o pleito eleitoral de 2 de outubro. Aos gritos, o descontrolado político amapaense, ameaçou recorrer ao STF para que obrigue a instalação da CPI do MEC, de sua autoria, como já havia ocorrido no ano passado, com a CPI da Covid-19.

Em reunião com os líderes no Senado Federal, na manhã desta terça-feira (5), o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) se comprometeu em ler o requerimento de abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Ministério da Educação (MEC). Os senadores querem investigar as denúncias de corrupção e irregularidades no Ministério durante a gestão do ex-ministro Milton Ribeiro, mas há outros pedidos aguardando na fila e senadores da base de apoio do governo querem que seja encaminha tratamento isonômico aos pedidos, porque um pedido não é mais importante do que o outro.

A leitura da CPI é o primeiro passo para a criação da comissão e deve ser feita no plenário da Casa. A indicação dos integrantes do colegiado ocorrem apenas após este momento.

Pacheco também se comprometeu com a leitura de outras duas CPIs. Uma delas foi apresentada pelo líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), justamente para se contrapor à CPI do MEC proposta pela oposição. O Objetivo é investigar obras inacabadas em creches, escolas e universidades, no período de 2006 a 2018, durante a gestão dos ex-presidentes do PT Lula e Dilma Rousseff. Já a outra CPI investigará a atuação do crime organizado no país, em especial o narcotráfico. A CPI das ONGs, também já protocolada, ficou de fora.

A expectativa inicial era de que a leitura das CPIs fosse realizada ainda hoje. No entanto, à tarde está prevista reunião do Congresso Nacional, a partir das 14h, para analisar um conjunto de vetos do presidente, dentre os quais os vetos às Leis Aldir Blanc 2, Paulo Gustavo e os vetos relacionados ao projeto de privatização da Eletrobras.

Rodrigo Pacheco afirmou que a maioria dos líderes defende que a CPI do MEC só seja instalada após as eleições e junto com outras três comissões. A oposição já informou que deve recorrer ao STF para que CPI comece antes.

Para que a CPI seja aberta e seus trabalhos se iniciem é preciso que, após a leitura da Comissão Parlamentar de Inquérito, que deve ser feita no plenário da Casa, os líderes partidários do Senado indiquem os parlamentares para o colegiado.

Caso as indicações sejam feitas só após as eleições, como defendem os líderes partidários, a CPI teria pouco tempo de funcionamento. Isso porque, segundo diz o regimento interno do Senado, uma comissão parlamentar de inquérito não pode continuar após o fim da legislatura em que foi instalada. Isto é, só poderia funcionar até 1º de fevereiro de 2023.

“Os requerimentos serão lidos em plenário por dever constitucional e questões procedimentais serão decididas. Porém, a ampla maioria dos líderes entende que a instalação de todas elas deve acontecer após o período eleitoral, permitindo-se a participação de todos os senadores e evitando-se a contaminação das investigações pelo processo eleitoral”, escreveu Pacheco nas redes sociais após a reunião com os líderes.

Na reunião, Pacheco disse aos senadores que abrirá ainda outras três CPIs. Hoje, há três na fila, além da comissão do MEC: uma sobre obras do MEC de gestões passadas paradas, de autoria do líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ); outra sobre a atuação do narcotráfico no Norte e Nordeste do país, e uma terceira sobre a atuação de ONGs na Amazônia.

Com a leitura dos requerimentos, Pacheco deixa a decisão da instalação das CPIs para os líderes do Senado, que serão responsáveis pelas indicações dos senadores que integrarão os colegiados. O que determinará o funcionamento das CPIs será as indicações dos líderes, disse o presidente do Senado durante a reunião. Ele abriu a reunião falando que não cabe juízo de valores em relação às comissões.

Pacheco também pediu aos líderes que façam a reflexão se a abertura da comissão é oportuna devido ao momento eleitoral. Faltam apenas três meses para a eleição, em outubro. A proximidade do pleito é um dos principais argumentos da base governista no Senado para adiar a CPI para depois da votação.

Ao líder da oposição, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Pacheco prometeu que faria a leitura do requerimento da comissão ainda nesta terça-feira. No entanto, não há sessão do Senado marcada para hoje, apenas do Congresso. Pelo regimento, a abertura de uma CPI só pode ser lida no plenário da Casa onde será instalada. Randolfe disse que vai recorrer ao STF se Pacheco não fizer leitura de CPI até amanhã.

Disputa na indicação

A oposição vai fazer a indicação dos membros tão logo que fizerem a leitura do requerimento. O bloco tem direito a duas cadeiras na CPI do MEC, que terá 11 titulares. Já o MDB, maior partido da Casa, também deve fazer as duas indicações a quais tem direito. À frente das movimentações do partido em relação à comissão está o senador Renan Calheiros (AL), que vai reassumir o mandato para fazer parte da comissão.

Com isso, ficarão faltando apenas duas indicações para a CPI alcançar o quórum mínimo para começar os trabalhos. Três vagas são escolhidas por partidos próximos ao governo de Jair Bolsonaro: PL, PP e União Brasil. O PSDB e o Podemos devem indicar, respectivamente, os senadores Alessandro Vieira (SE) e Jorge Kajuru (GO), mas só devem fazê-lo quando as demais legendas também escolherem seus representantes.

O desempate ficará a cargo do PSD, segundo maior partido da Casa e que tem direito a duas cadeiras na CPI. O líder do partido no Senado, Nelsinho Trad, ainda não indicou qual posição tomará.

A oposição, por sua vez, afirma que, no primeiro desenho feito da composição do colegiado, o PSD está alinhado com seus planos e, por isso, já há oito parlamentares definidos, faltando apenas as indicações do PP, PL e União Brasil.

O pedido para instalação da CPI foi protocolado na semana passada pelo líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues, para investigar suspeitas de corrupção na gestão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro. O requerimento conta com a assinatura de 31 senadores, quatro a mais do que o necessário.

Em abril, quando as primeiras denúncias de irregularidades no MEC vieram à tona, a oposição tentou avançar com o pedido de abertura da CPI, mas seus esforços foram atrapalhados pela base governista, que conseguiu retirar assinaturas do requerimento. O caso, porém, ganhou mais força após Milton Ribeiro ser alvo de uma operação da Polícia Federal.

Conversas do ex-ministro interceptadas pela PF indicam que Bolsonaro pode ter avisado Ribeiro da operação. Em uma ligação à filha, o ex-ministro diz que o presidente tinha um “pressentimento” de que poderia haver um mandado de busca e apreensão contra ele. Em outro áudio, a mulher do ex-ministro, Myrian Ribeiro, conta que ele já estava sabendo da operação. A conversa foi gravada no dia da prisão de Ribeiro.

Estratégia governista

Aliados do governo agora buscam que a CPI só tenha seus trabalhos iniciados depois das eleições de outubro. O argumento usado pelos senadores governistas a seus pares é que qualquer colegiado do tipo que seja aberto a três meses da eleição será usado como palanque eleitoral.

Entre os argumentos usados pelos governistas para adiar as CPIs até o fim das eleições, além da possibilidade de uso eleitoral das comissões, é de que não haverá quórum para os colegiados.

A possibilidade de adiar a CPI para depois da eleição é rechaçada completamente pela oposição. De acordo com senadores favoráveis a comissão inquérito, o tempo até o pleito poderia ser usado para ocultações de provas da investigação.

Além disso, a tentativa de adiar a comissão também é vista como uma forma de fazer a CPI não acontecer, já que ela não poderia se estender para além da legislatura atual. Isto é, teria que encerrar seus trabalhos até dia 1º de fevereiro de 2022. Como a CPI do MEC tem prazo estabelecido de 90 dias úteis, se ela for instalada após o segundo turno votação, no final de outubro e início de novembro, ela não completaria todo o período previsto.

E mesmo se começar após o primeiro turno, no início de outubro, também não chegaria aos 90 dias úteis.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.