Na Fiesp, Lula promete o que omite em programa de governo

O candidato estava à vontade ao lado do presidente da entidade, filho de seu ex-vice
Na sabatina da Fiesp, temas como corrupção e roubalheira foram vetados

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Brasília – Numa postura totalmente diferente do que vem apresentando em eventos semirrestritos Brasil afora, o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva e seu vice, Geraldo Alckmin, participaram, nesta terça-feira (9), de mais uma rodada de sabatinas promovida pela Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), com os candidatos à Presidência da República. Aparentando se sentir à vontade, ao lado do presidente da anfitriã, Josué Gomes da Silva, o candidato que, segundo as pesquisas, lidera a disputa, iniciou sua fala com referências e elogios ao vice, e também a José Alencar, que foi vice-presidente nos dois mandatos do petista e é pai do atual presidente da Fiesp. Lula foi o 4º candidato a ser sabatinado pelos industriais.

No evento, Lula defendeu uma pauta de improvisos. Praticamente todas as promessas não constam no programa de governo protocolado pelo Partido dos Trabalhadores no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) — uma exigência legal. “A Lei, ora a Lei…”, já dizia o ex-presidente Getúlio Vargas.

Duas vezes presidente da República (1º de janeiro de 2003 – 1º de janeiro de 2011), o candidato passou o período de seu governo mais preocupado com o varejo da política e não promoveu uma única grande reforma do Estado brasileiro. No atacado, porém, seus dois governos foram pródigos em escândalos de arrepiar os cabelos, com dois dos maiores casos de corrupção da história do mundo moderno: o “mensalão”, no primeiro mandato e o “petrolão”, no segundo.

Após 580 dias preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, Lula foi solto no dia 8 de novembro de 2019, um dia após o Supremo Tribunal Federal ter considerado a prisão em segunda instância inconstitucional. Em seguida, o presidente do TSE e ministro do STF, Edson Fachin, anulou as sentenças condenatórias em duas instâncias, em julgamento de nove juízes, numa manobra escandalosa, alegando que o CEP do Foro adequado não era Curitiba (PR). Outro escândalo. Porém, Lula não foi absolvido, mas teve a sentença de 12 anos de cadeia anulada.

Nenhum desses aspectos nefastos do prontuário criminal do candidato foi abordado, revelando não uma sabatina, como o release divulgou, mas um convescote entre antigos compadres.

Promessas do Lula de sempre

Lula agora, promete que fará as reformas administrativa e tributária, evitou tocar na sua pretensão de anular a reforma da previdência e da trabalhista e disse que vai extinguir o teto de gastos. Lula saiu-se com uma frase que entra, instantaneamente para seu grande rol de nulidades e asneiras: “Quem tem responsabilidade não precisa de teto de gastos”.

Lula também disse que será necessário discutir qual o sistema tributário mais benéfico ao país.

O ex-presidente comprometeu-se: “Eu acho que vamos ter que fazer uma reforma administrativa sim. Tem pouca gente ganhando muito e muita gente ganhando muito pouco. É preciso tentar fazer um equilíbrio”, disse Lula a uma plateia de empresários ao ser questionado sobre o tema. A fala desviou do projeto do PT de taxar as grandes fortunas, projeto também defendido pelo candidato do PDT, Ciro gomes.

O candidato da esquerda citou como uma das distorções o fato de que setores de execução da burocracia pública ganham muito menos do que setores de fiscalização. “É possível fazer justiça a partir de uma reforma administrativa? É, e vamos fazer. É preciso moldar a burocracia a uma nova cultura”.

O debate com empresários foi parte de uma série de encontros em que a Fiesp está chamando os presidenciáveis para debater propostas na área da economia e da indústria.

As reformas tributária e administrativa são dois pontos considerados chave pelos empresários que vê acelerar no país a desindustrialização do parque fabril e uma cobrança constante em todos os governos.

Em 2018, Bolsonaro foi eleito com essas duas promessas, mas não terminou nenhuma delas. Depois de anos de disputas, a tributária segue no Congresso, em um texto no Senado e outro na Câmara, nenhum perto da aprovação.

Já a administrativa, apesar das promessas do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), não passou sequer da comissão especial por falta de interesse do próprio governo, já que Bolsonaro não pretendia contrariar os funcionários públicos no momento em que buscava a reeleição.

Ao tratar da reforma tributária, Lula disse que pretende, caso eleito, ter grupos de trabalho analisando o tema para ter uma proposta em 30 ou 40 dias de governo, mas que tudo será negociado com todos os setores envolvidos.

“Eu acho que tem de ser logo. O mandato e de quatro anos. Se a gente deixar essas coisas para amanhã a gente não faz mais”, afirmou.

O ex-presidente repetiu ainda que a base da proposta petista é desonerar a produção e fazer uma reforma progressiva, em que o mais pobre paga menos e o mais rico, mais.

“A gente precisa de uma reforma tributária mais progressiva, onde a gente possa taxar a parte mais rica da sociedade, taxar menos a produtividade e taxar mais patrimônio”, disse, ressalvando: “Agora, tudo isso é desejo de uma pessoa e de um partido político que precisa ser colocado em um debate para saber se é isso que a sociedade quer.”

Na fala aos empresários, o petista, que lidera as pesquisas de intenção de voto para a eleição presidencial de outubro, reconheceu que “muita gente ficou assustada” quando ele defendeu rever a reforma trabalhista feita no governo Temer, ao mesmo tempo que afirmou que não quer voltar à legislação trabalhista existente em 2002, mas defendeu que é necessário evoluir.

“Contrato coletivo é uma coisa que pode existir”, exemplificou.

Confira a íntegra do evento aqui.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.