Marina Silva critica relatório da MP que redefiniu a estrutura do Poder Executivo Federal

A ministra do Meio Ambiente, alertou para os ‘perigos’ em ‘esvaziar’ a política ambiental
Ministra Marina Silva protestou contra o texto da MP, que retira atribuições da pasta do Meio Ambiente

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Brasília – A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva (Rede), se junta a uma lista de críticos do relatório apresentado pelo deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), da comissão mista de análise da medida provisória que redefiniu a estrutura do Poder Executivo Federal (MP nº 1.154/2023). O emedebista sugeriu uma série de mudanças nos ministérios e desencadeando um deus nos acuda na Esplanada dos Ministérios.

Um pedido de vista adiou, na quarta-feira (12), a conclusão da primeira reunião, fixando o número de ministérios em 31 e prevendo outros seis órgãos com status de ministério ligados à Presidência da República. A reunião de análise da MP 1.154/2023 será retomada nesta quinta-feira (13), que teve inicio às 10h.

Editada no primeiro dia do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a MP já teve o prazo prorrogado e precisa ser votada pela comissão mista e pelos Plenários da Câmara dos Deputados e do Senado até 1° de junho, ou perderá a validade.

No caso da pasta comandada por Marina Silva, ela perdeu a atribuição do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que foi para o Ministério da Gestão, e também a gerência sobre a Agência Nacional das Águas (ANA), que foi para o Ministério do Desenvolvimento Regional.

Bulhões pretende ainda transferir o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Fazenda para o Banco Central, assim como era na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Se o parecer do deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL) prevalecer, a pasta perderá áreas estratégicas dentro do governo. Eis a íntegra do documento.

O texto retira do Meio Ambiente a ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico), que passa para o MIDR (Ministério de Integração e Desenvolvimento Regional), comandado por Waldez Góes. O ministro é filiado ao PDT, mas foi indicado ao cargo por influência do União Brasil.

Outra mudança que esvazia o ministério de Marina é a competência para tratar sobre a política nacional de recursos hídricos. De acordo com o relatório apresentado na comissão mista na terça-feira (23), a área também passa para o Desenvolvimento Regional.

Já a gestão do CAR (Cadastro Ambiental Rural) sai do MMA e do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) e vai para o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, comandado por Esther Dweck. O CAR é de interesse da bancada do agro, que buscava retirar o cadastro do poder de Marina e enviar para o Ministério da Agricultura.

O ministério de Marina está no centro de um impasse do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Na última quarta-feira (17), o Ibama negou o pedido da Petrobras para realizar uma perfuração de teste no mar, a 179 km da costa do Amapá, na região da Margem Equatorial Brasileira. O objetivo da estatal seria checar se de fato há petróleo na área, que vem sendo chamada de “novo pré-sal”.

O caso causou um mal-estar no governo. O ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, é a favor da liberação, mas saiu derrotado — pelo menos por enquanto. Ainda na terça-feira (23), o Palácio do Planalto realizou uma reunião de conciliação entre Ibama e Petrobras e Marina foi categórica em afirmar que a decisão do Ibama foi técnica, sugerindo à Petrobras acionar uma Lei de 2012 para recomeçar o processo, o que está irritando setores do governo.

A Petrobras confirmou que vai protocolar, ainda esta semana, pedido ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) de reconsideração de indeferimento de licença ambiental para perfuração de poço exploratório no bloco FZA-M-059, em águas profundas do Amapá. A decisão foi confirmada pela empresa em comunicado divulgado nesta quarta-feira (24).

Emendas

Líder do MDB na Câmara, partido fiador do governo petista, o deputado Isnaldo Bulhões Jr. deixou claro que o relatório não foi elaborado de acordo com o que ele “gosta ou deixa de gostar”. “Analisei com minha equipe as emendas apresentadas”, explicou.

Foram acatadas 62 das 154 emendas, 37 totalmente e 25 parcialmente. Entre outros pontos, o relator Isnaldo Bulhões Jr. decidiu devolver ao Ministério da Justiça e Segurança Pública a atribuição pela demarcação de terras indígenas e quilombolas. Com a MP, o governo Lula transferiu a responsabilidade, antes do Ministério da Justiça, para o Ministério dos Povos Indígenas, criado em janeiro.

Divisão da Conab

Isnaldo Bulhões Jr. também propôs no parecer a redistribuição das atribuições relacionadas à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), vinculada pela MP ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. Parte delas passará ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, ao qual a Conab pertencia antes.Conforme o parecer do relator, serão atribuições do Ministério da Agricultura a garantia de preços mínimos, à exceção dos produtos da sociobiodiversidade, e as ações sobre comercialização, abastecimento e armazenagem de produtos, bem como o tratamento às informações relativas aos sistemas agrícolas e pecuários. A mudança atende membros da Frente Parlamentar da Agropecuária, a maior do Congresso.

Extinção da Funasa

Outra alteração na MP incluída pelo relator autoriza o Poder Executivo a tomar medidas para a extinção da Fundação Nacional da Saúde (Funasa), já prevista na MP 1.156/2023. Iniciativas decorrentes do fim da Funasa caberão aos ministérios das Cidades; da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos; e da Saúde.O deputado Danilo Forte (União-CE) criticou a extinção da Funasa. “Isso é um tiro na culatra”, ressaltou. “A dívida do Lula com o Nordeste é muito grande, porque foi o Nordeste que o elegeu, mas os maiores prejudicados com a extinção da Funasa serão os municípios nordestinos, eu não tenho a menor dúvida disso.”

A extinção da Funasa foi principal ponto de divergência até a reunião de terça-feira ter sido suspensa. Havia uma expectativa de que o relator da medida revertesse a decisão do governo, mantendo o órgão, o que não ocorreu. Pelo relatório, o Poder Executivo poderá extinguir a Funasa. Parte das atribuições passará para os Ministérios das Cidades, controlado pelo MDB através do ministro Jader Barbalho Filho, e o da Saúde.

“Estou convencido de que as políticas públicas estarão com muito mais eficiência no novo modelo. A Funasa vem há anos tendo um custo maior do que sua execução orçamentária”, justificou Bulhões.

Ex-presidente da Funasa, deputado Danilo Forte (União-CE), foi quem liderou a tentativa de atrasar a votação, acompanhado pelo colega Kim Kataguiri (União-SP). Além de fazer um pedido de vista, para que a votação do texto aconteça após um intervalo de 24 horas, eles também queriam que Bulhões lesse na comissão seu relatório de 121 páginas.

“Quem vai ser alijado são os pequenos municípios. Essa é a minha luta pela Funasa”, afirmou Danilo Forte. “É inconstitucional, uma autarquia só pode ser extinta por uma lei específica, salientou o deputado cearense, que presidiu a fundação de 2007 a 2010.

Desenvolvimento Agrário

Outro alvo da Frente Parlamentar da Agropecuária era as mudanças que foram introduzidas pelo relator que esvaziaram as funções do Ministério do Desenvolvimento Agrário comandado pelo petista Paulo Teixeira e visto pelos ruralistas como um braço do MST no governo Lula. Bulhões transferiu boa parte das funções Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para a pasta da Agricultura, comandada por Carlos Fávaro (PSD), deixando poucas atribuições no ministério recriado por Lula neste ano.

Veja quais são as principais alterações feitas pelo relator:

1) Atribuições saem do Desenvolvimento Agrário e passam para a Agricultura. Entre eles a política agrícola, comercialização, abastecimento, armazenagem e garantia de preços mínimos;

2) A demarcação de terras indígenas, que estava a cargo do Ministério dos Povos Indígenas, passa a ser atribuição do Ministério da Justiça;

3) Ministérios das Cidades fica com a promoção de ações e programas de urbanização, de habitação e de saneamento básico e ambiental, incluída a zona rural, de transporte urbano, de trânsito e de desenvolvimento urbano;

4) A atribuição do Cadastro Ambiental Rural (CAR) sai do Ministério do Meio Ambiente e vai para o Ministério da Gestão;

5) A Agência Nacional das Águas (ANA) passa a ser vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Regional, antes estava no Meio Ambiente;

6) A Política Nacional de Recursos Hídricos vai para o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, antes estava sob a competência da pasta do Meio Ambiente Mudança do Clima;

7) O Coaf sai da competência do Ministério da Fazenda e vai para o Banco Central e

8) O ministério dos Povos Indígenas também perdeu uma de suas funções principias, a da demarcação de terras, que foi para o Ministério da Justiça.

Governo teme que a medida provisória corra o risco de perder a validade antes que seja votada no Congresso

Se aprovada na comissão mista, a MP precisa ainda passar pelo plenário da Câmara e do Senado até o dia 1º de junho. Caso contrário, o desenho ministerial deixado por Jair Bolsonaro voltará a valer — eram 23 pastas no lugar das 37 de hoje, com atribuições distintas das atuais.

Além do impacto no atraso de projetos, o impasse obrigaria que servidores fossem realocados, provocaria efeitos orçamentários e mexeria na divisão de cargos, executada também com o objetivo de ajudar na construção da base.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.