Instituto Evandro Chagas confirma contaminação do Rio Pará por cianobactérias

A contaminação atinge os municípios paraenses de Barcarena, Abaetetuba e Ponta de Pedras, em níveis 22 vezes acima do limite estabelecido pela legislação

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Brasília – O Instituto Evandro Chagas (IEC) apresentou, em reunião na segunda-feira (8), convocada pelo Ministério Público Federal (MPF), os resultados de amostras de água coletadas no final de janeiro e início de fevereiro deste ano no Rio Pará, identificando uma alteração anômala na densidade de até 22 vezes acima do limite estabelecido pela legislação da ocorrência de cianobactérias que atingem três municípios: Barcarena, Abaetetuba e Ponta de Pedras.

As informações foram prestadas em resposta a alerta feito no último dia 25, pelo Instituto Evandro Chagas (IEC). As cianobactérias são microorganismos que dão coloração esverdeada e cheiro forte à água. Em altas concentrações, formam uma espécie de pasta verde, chamada de floração, que pode irritar a pele humana e torna a água imprópria para banho e consumo, além de reduzir os níveis de oxigênio na água, o que pode acarretar mortandade de peixes.

O Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), por meio da promotoria de Justiça de Barcarena, também participou da reunião para solicitar informações e providências aos órgãos ambientais, sanitários e demais instituições públicas participantes.

Embora ainda esteja correndo o prazo para os órgãos públicos informarem ao MPF, por escrito, as providências adotadas nos últimos dias quanto à floração de algas, algumas informações já foram colhidas na reunião.

Em geral, representantes das secretarias de Meio Ambiente e Saúde dos municípios envolvidos informaram que buscaram providenciar a coleta e análise de novas amostras de água, o levantamento de dados sobre eventuais casos de danos à saúde de moradores, e a divulgação de orientações à população sobre os riscos existentes. O MPF alertou para a necessidade de os municípios realizarem o levantamento das famílias que fazem uso exclusivo da água do rio para consumo ou banho, a fim de que possam ser atendidas em suas necessidades.

Em Barcarena a secretaria de Meio Ambiente encontrou novas florações nas praias do Conde e de Itupanema, e elaborou plano de monitoramento ambiental do fenômeno no município. A secretaria também informou que enviou material para análise do Laboratório Central do Estado (Lacen), da Secretaria de Estado da Saúde (Sespa), e solicitou apoio do laboratório na execução do plano de monitoramento, além do apoio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) para fiscalizações.

Segundo representantes da secretaria de Saúde de Barcarena, agentes comunitários de saúde estão sendo treinados sobre o tema das cianobactérias, e está sendo preparado material educativo para auxiliá-los em ações de conscientização nas comunidades.

Em Abaetetuba já haviam sido feitas coletas da água do rio Pará em janeiro, e os resultados de análises do Lacen de novas coletas foram recebidos nesta segunda-feira e serão analisados, informa a secretaria de Meio Ambiente do município. Segundo a secretaria, comunidades de áreas próximas ao rio foram visitadas e informadas sobre o fenômeno das florações, e essas mesmas informações foram divulgadas a equipes de postos de saúde, à Defesa Civil, em rádios, e em reunião com os barraqueiros da vila de Beja. A praia de Beja foi interditada para banho, e placas informativas foram afixadas na área.

O representante de Abaetetuba também registrou que será feita reunião com servidores da área de atenção básica de saúde, para que seja dado início ao levantamento de eventuais casos de prejuízos à saúde de moradores. A secretaria de Assistência Social de Abaetetuba informou que Centro de Referência de Assistência Social (Cras) do município já foi procurado por famílias que relataram irritações de pele em crianças.

Sobre o consumo de água, a secretaria de Meio Ambiente de Abaetetuba informou que grande parte dos ribeirinhos do município ingere água engarrafada, e não a água do rio Pará, e que a colônia de pescadores foi mobilizada para possibilitar a identificação de eventuais impactos à pesca.

Em Ponta de Pedras a Vigilância Sanitária está fazendo diagnóstico sobre população que eventualmente tem contato com a água, para avaliar nível de risco a esses moradores, informou o representante do município na reunião com o MPF. Segundo ele, foram solicitados dados a unidades básicas de saúde sobre eventuais casos ocorridos, a prefeitura também está coletando informações sobre se o uso da água pelos moradores, e está elaborando cartilha educativa sobre o tema, além ter solicitado ao IEC material para coleta de amostras de água.

Investigações sobre o fenômeno

Com o objetivo de entender a anomalia ambiental, a Semas/PA disse que programou fiscalizações conjuntas com a secretaria de Meio Ambiente de Barcarena a partir desta quarta-feira (10), e que novas providências serão adotadas a partir dos resultados dessas fiscalizações.

O IEC informou que no último dia 3 fez nova coleta de amostras de água, principalmente no entorno do porto da Vila do Conde, e também em praias do Conde e de Beja. De 11 pontos pesquisados, em dois pontos — ambos no entorno do porto — a densidade de cianobactérias continua acima do estabelecido pela legislação para a qualidade de águas.

Segundo pesquisadores do IEC, a quantidade de florações diminuiu em relação à quantidade verificada na primeira amostragem, de cerca de um mês atrás. Desta vez, as florações foram encontradas apenas no entorno do porto, mais diluídas, e com cor de tonalidade mais marrom que verde. Também foi coletado novo material para verificar se as cianobactérias estão ou não expelindo toxinas na água. O IEC divulgará os resultados da análise desse material no início da semana que vem.

Representantes do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), órgão da estrutura do Ministério da Defesa, também participaram da reunião na segunda-feira, e apresentaram dados sobre como técnicas de sensoriamento remoto podem auxiliar nas investigações sobre as causas das florações.

Convidados pelo MPF, representantes dos órgãos presentes na reunião se comprometeram a atuar conjuntamente nessa investigação, tanto por meio de parcerias para o levantamento de novos dados quanto por meio da troca de informações e experiências sobre os dados já existentes, a fim de apurar as causas do evento.

Suspeitas

As suspeitas indicam que a anomalia ambiental tem como causa o despejo de rejeitos tóxicos da refinaria da Norsk Hydro em Barcarena, no nordeste do Pará. A mineradora nega.

A multinacional norueguesa Norsk Hydro é alvo de uma nova ação coletiva, desta vez, protocolada na Holanda por cerca de 40 mil brasileiros afetados pela produção de alumínio em Barcarena e Abaetetuba.

A ação busca compensações às 11 mil famílias afetadas pelos empreendimentos instalados no estado, pelo que a ação chama de “disposição incorreta de rejeitos tóxicos no rio Murucupi, bem como por outros efeitos da presença das instalações da Norsk Hydro na região” e que agora se espalharam em trecho do leito do Rio Pará.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.