Projeto de lei que proíbe união de pessoas do mesmo sexo será votado em Comissão, sob protestos do movimento LGBTQIA+

Movimentos sociais articulam apoio para derrubar a matéria
A direção da comissão solicitou reforço de agentes da Polícia Legislativa Federal para garantir a segurança da realização da sessão deliberativa

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Sob tensão há semanas, o clima no Congresso Nacional promete esquentar ainda mais nesta quarta-feira (27). Líderes de movimentos sociais que militam pelo cumprimento dos direitos da comunidade LGBTQIA+ articulam apoios para derrotar o parecer que vai à votação na Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família (CPASF) da Câmara dos Deputados. A proposta é considerados um retrocesso aos direitos civis dessa comunidade que compõe a sociedade brasileira.

O texto do relator é ao projeto de lei (PL nº 5.167/2009), que proíbe que relações entre pessoas do mesmo sexo equiparem-se ao casamento ou a entidade familiar. O protesto das entidades que militam na área ficaram revoltadas porque o projeto foi apensado a outra proposta, o PL n° 580/2007) que regulamenta o contrato civil de união homoafetiva.

O clima está tenso, segundo apurado pela reportagem do Blog do Zé Dudu, a ponto de a direção da CPASF solicitar reforço de agentes da Polícia Federal Legislativa para garantir a segurança da realização da sessão deliberativa.

Os militantes estão espremidos ao longo do corredor das Comissões, na entrada da sala da CPASF, e os policiais legislativos federais estão barrando a entrada de qualquer um.

A deputada Duda Salabert (PDT-MG) tenta negociar a entrada de uma comissão. “Isso nunca aconteceu aqui, vai acontecer agora? Vai barrar o povo brasileiro de entrar na sua Casa para acompanhar a matéria do seu interesse?”, questionou a congressista mineira.

Na semana passada, ocorreu a realização de uma audiência pública na comissão e a confusão foi grande

Conforme acertado entre os parlamentares na semana passada, após a realização de audiência pública para discutir a proposta, o projeto de lei deve ser votado na comissão nesta quarta, dia 27.

A proposta, que originalmente equiparava a união de pessoas do mesmo sexo a um casamento civil, foi rejeitada pelo relator, deputado Pastor Eurico (PL-PE), que defendeu a aprovação de outro texto (PL n° 5.167/2009), proibindo que relações entre pessoas do mesmo sexo equiparem-se a casamento ou entidade familiar. Ele rebateu as acusações de fundamentalismo religioso.

“Em nenhum momento vocês vão encontrar um parecer meu ligado à religião. O parecer que demos foi baseado na letra da Constituição, apenas respondi o que está na Constituição. Eu desafio o que foi colocado aí, que estamos tirando direitos adquiridos, porque a lei não pode retroagir para prejudicar”, afirmou.

Em 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, por unanimidade, a união homoafetiva como núcleo familiar, equiparando as relações entre pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis entre homens e mulheres.

Na opinião do professor de Direito da Universidade de Fortaleza, Antônio Jorge Pereira Junior, durante a audiência pública na semana passada, ao decidir sobre a união de pessoas do mesmo sexo, o STF usurpou a competência legislativa do Congresso Nacional, que representa a sociedade brasileira.

“A competência legislativa é uma, a competência judiciária é outra. Não deve uma Corte abdicar da sua competência e usurpar de outra para poder satisfazer o interesse que, a seus membros, parece que seria mais adequado”, argumentou o professor.

Debate

Convidado para o debate, o deputado distrital Fábio Félix (PSoL) afirmou que, se o caso é questionar o STF, que isso seja feito de outro jeito e não às custas dos direitos da comunidade LGBTQIA+.

“Nenhum parlamentar da extrema direita, do fundamentalismo ou os palestrantes tiveram coragem de fazer ataques diretos aos nossos direitos civis. Tergiversaram, vacilaram, questionaram o STF, chamaram de atalho a forma como a decisão foi tomada. Mas, se não questionam o conteúdo, se vossa excelência não é contra os direitos civis do meu casamento, esse projeto precisa ir para o arquivo”, disse.

Respondendo ao colega, o deputado Pastor Henrique Vieira (Psol-RJ), que sugeriu a audiência antes da votação da proposta, disse que proibir a formação de famílias de pessoas do mesmo sexo é impor uma moral do fundamentalismo religioso para toda a sociedade.

“Eu não sou do campo conservador, não é minha formação inclusive religiosa, mas eu quero fazer um convite a todos os conservadores para que estejam aqui defendendo o Estado laico, a cidadania, a diversidade e a derrota desse parecer. Taticamente eu considero importante que este projeto não vem de conservadores, vem de fundamentalistas e extremistas religiosos, é outra coisa”, afirmou.

A deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS) disse que, “em pleno 2023, com tantos problemas no Brasil, gente na fila esperando aposentadoria. Problemas das crianças órfãs esperando longos anos para serem adotadas e a Comissão da Previdência, majoritariamente, na jornada das trevas, por conta da bancada fundamentalista [trata] de atacar direitos da comunidade LGBTQIA+. Há 12 anos, por unanimidade o STF já decidiu sobre a questão”.

Para entender o significado de LGBTQIA+

Ao longo dos anos, a sigla LGBTQIA+ mudou e se expandiu, acompanhando mudanças na estratégia política do movimento — e respondendo às reivindicações de diferentes grupos e identidades, militantes desse extrato socias dos direitos civis no país.

No Brasil, a ABGLT adota o acrônimo LGBTI+. Há quem proponha, fora do país, versões estendidas, como LGBTTIQQ2SA+. É um conjunto polêmico. Entenda o que significa cada letra:

L e G – Referem-se a “lésbicas” e “gays”

Quando surgiu no Brasil, o movimento LGBTI+ era conhecido como homossexual. Ou, simplesmente, “gay”. O entendimento, à época, era de o termo podia abrigar diferentes identidades. As lésbicas seriam incluídas na nomenclatura em 1993.

B – São mulheres e homens bissexuais

A letra entrou para a sigla brasileira em 2001. A compreensão de que a bissexualidade é uma orientação sexual é recente: remonta aos anos 1990.

Conforme lembra Marinalva Santana, do Matizes, o grupo hoje luta por maior visibilidade, e para desconstruir mal-entendidos — como o que sustenta que pessoas bissexuais seriam, na verdade, gays ou lésbicas indecisas.

T – Transexuais e travestis

Na América Latina, a primeira organização política de transexuais surgiu no Rio de Janeiro em 1992: a Associação de Travestis e Liberados do Rio de Janeiro (Astral).

O objetivo do grupo era impedir a prisão indiscriminada de travestis que ocorria na cidade, e se opor à violência policial. A letra foi adicionada à sigla geral do movimento em 1995.

Q – Queers

Entre alguns grupos de ativistas e intelectuais, discute-se se o temor designa um grupo de pessoas ou um campo de estudos (o da “teoria queer”).

As pessoas que se identificam como Queer, de maneira geral, entendem que termos como “lésbica” ou “gay” são restritivos. Segundo o Manual de Comunicação LGBTI+, o termo é mais comumente utilizado por “pessoas jovens, cuja orientação sexual não é exclusivamente heterossexual”. O “Q” também pode significar “questionadores”.

I – intersexuais

São pessoas que nascem com anatomia reprodutiva — ou uma composição de cromossomos — que não pode ser classificada como tipicamente masculina ou feminina. Há casos de genitália ambígua, por exemplo.

Com frequência, pessoas intersexo passam por procedimentos cirúrgicos logo ao nascer, para eliminar essa ambiguidade. Antes dos 24 meses de vida, os médicos decidem se a criança será, na aparência, do sexo feminino ou masculino.

Muitas relatam não se adaptar ao sexo designado por meio dessa cirurgia.

A – Assexuais

Pessoas que não se sentem sexualmente atraídas por outros indivíduos.

Segundo a Rede de Educação e Visibilidade Assexual (Aven) é importante não confundir assexuais com celibatários: nesse último caso, a pessoa opta por não manter relações sexuais, ainda que se sinta esse desejo. Em algumas formulações da sigla, o A pode ser lido como “aliados”.

P – Aparece em algumas formulações da sigla, e significa pansexuais

“Pan” é um termo grego que significa “tudo”. As pessoas pansexuais se sentem atraídas por outras pessoas independentemente da identidade de gênero ou orientação sexual do parceiro.

O início da sessão está atraso, estava marcado para começar as 10hs. A reportagem atualizará, posteriormente, o resultado da votação.

As deputada federal Andreia Siqueira (MDB-PA) é a única membro (suplente) na Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família (CPASF) da Câmara dos Deputados e até o fechamento deste texto não tinha comparecido à sessão.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.

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