Por que os jornais brasileiros estão morrendo?

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O Jornal da Tarde teve sua última edição publicada hoje, 31 de outubro de 2012, após 46 anos de história. A Gazeta Mercantil, fundada em 1920, deixou de circular em 2009. No ano seguinte, o Jornal do Brasil, após 119 anos de existência, migrou por completo para a internet. A Newsweek  também. A revista norte-americana não terá mais versão impressa em 2013. O caminho parece apocalíptico para as publicações impressas. Só parece. Assim como o rádio foi considerado ultrapassado com o advento da TV.

O que os fechamentos de publicações impressas – e rumores de outros – demonstra é que é preciso renovar. E renovar, nunca foi (e não será) tarefa fácil. Assis Chateaubriand, pioneiro com a transmissão de televisão brasileira – com a TV Tupi em 1950 – morreu em 1968, tentando entender as modificações do ex-colega Walter Clark numa então ascendente TV Globo. Neste caso, o próprio meio se modificou.

A tal renovação também pegou de jeito o pessoal da Kodak, empresa pioneira no segmento de processos fotográficos. A companhia norte-americana não acreditou no mercado de fotos digitais. Resultado: a empresa que nasceu em 1888 pediu falência no início de 2012.

Os fatos acima revelam que a hibridização e modificação dos meios é algo comum na História.

Afinal, qual foi o erro do Jornal da Tarde? Para justificar a extinção do periódico a família Mesquita alegou foco estratégico. O objetivo, dizem, é investir na marca Estadão, “principal do Grupo”, conforme afirma Francisco Mesquita Neto, diretor presidente do Grupo Estado.

“Para cada 100 mil jornais que são impressos, 60 mil são vendidos e 40 mil são jogados fora”, disse o empresário Nelson Tanure, à época da extinção do JB.

Quando o Notícias Populares foi descontinuado pelo Grupo Folha, as justificativas foram parecidas. O jornal que tinha circulação de 110 mil exemplares nos anos 90, vendia 20 mil em 2001, ano de sua morte.

Ok, o público parece não estar mais interessado no impresso. Também pudera, manchete da Folha de Hoje traz a informação de que o ciclone Sandy matou 39 pessoas. Informação atualizada na madrugada elevou o número de vitimas para 51. O impresso parece obsoleto quando comparado com a internet.

“Quando o delírio digital obrigou os jornais brasileiros a se reinventar, o Grupo Estado contentou-se em adotar os paradigmas emitidos pela Associação Nacional de Jornais (ANJ) e resolveu transformar o JT num veículo insignificante, periférico, popularesco”, reflete Alberto Dines, jornalista e escritor, em artigo reproduzido no Adnews. Tal pensamento pode ser uma luz para as publicações atuais. Se a informação quente é facilmente noticiada por qualquer veículo de comunicação, talvez seja o momento de ter foco. De inovar. De renovar.

Acabo de ler um livro cujo título é “O destino do Jornal”, de Lourival Sant’Anna, editora Record. O autor trata sobre a queda na venda dos jornais no Brasil, tratando especificamente da Folha de S. Paulo, O Globo e O Estado de São Paulo, e fazendo um paralelo entre duas características básicas que os une: o propósito de dizer a verdade e o negócio da credibilidade.

Abaixo, o prefácio do citado livro. Para mim a melhor parte da obra:

“Quando, aos 16 anos, disse para o meu pai que ia prestar vestibular para jornalismo, ele reagiu assim: “Escolha qualquer ouro curso, menos jornalismo. Você vai ficar frustrado, porque vai saber a verdade, mas não vai poder contá-la.” Nunca lhe perguntei os motivos. Quando você decide  desobedecer ao próprio pai, é melhor não encompridar a conversa ( ou pelo menos era o que achava a minha geração.

Estávamos em 1982, ao fim de quase duas décadas de regime militar. A censura tinha acabado. A transição para a democracia já havia começado, mas o seu contorno final ainda parecia nebuloso.

Teimei com meu pai, não por discordar de sua premissa: a de que só vale a pena ser jornalista quando se pode “contar a verdade”. Ao contrário, a minha insistência ficou condicionada, na sua origem, a essa premissa, que passou a pesar sobre os meus ombros. Não sou jornalista incondicionalmente. Sou jornalista enquanto puder “contar a verdade” – ou pelo menos a que eu conseguir enxergar.

Quando saí da universidade, em 1986, já tínhamos um presidente civil, embora ainda tivéssemos de esperar mais três anos até a primeira eleição direta para presidente. Conforme a democracia se foi consolidado no Brasil, a principal condicionante para “contar a verdade” passou a ser a independência política e econômica dos meios de comunicação. Na realidade, ela sempre estivera presente, antes e durante a ditadura, mas ficara ofuscada por alguns anos pela censura ostensiva dos governos militares.

A verdade é um conceito obviamente problemático. Está mediada por preferências, simpatias, preconceitos, experiências, convencimentos, que se adquirem e se abandonam ao longo da vida. O que se pode esperar de um jornalista, e de um meio de comunicação, é não a imparcialidade absoluta, mas o propósito de dizer a verdade. A imparcialidade e a verdade devem representar, par ao jornalista, um fim regulador da razão. Um objetivo que ele sabe ser inalcançável, mas persegue a todo o custo, como algo indispensável. Não o alcança, mas essa busca regula o seu ofício de jornalista.

É a presença ou a ausência desse propósito que diferencia os meios de comunicação, no Brasil e no mundo. Muito deles – temo que a maioria – não têm sequer esse propósito. Desistiram, sem tentar, de buscar a verdade. isso porque o seu negócio não é a verdade e sim agradar a grupos políticos e empresariais, aos quais se vendem. Em um número tristemente grande de jornais brasileiros, matérias que desagradam aos governantes quase nunca saem, porque eles são capazes de bloquear a compra de espaços publicitários pelos grandes anunciantes locais com a simples ameaça de uma devassa fiscal.

Para ser independente, um jornal precisa ter uma carteira de anunciantes tão grande e tão variada, e ser tão indispensável como veículo de publicidade, que nenhum presidente, governador ou prefeito seja capaz de ameaçá-lo. Precisa ter saúde financeira que o proteja contra chantagens de credores ou anunciantes. E é preciso que haja, no seu código genético, o desejo de pluralidade, não importa qual seja a sua linha editorial. Seu negócio tem que ser o da credibilidade, como condição de seu prestígio, de sua influência, e portanto da eficácia dos anúncios publicitários  que veicula. Em outras palavras, aqueles que se disponham a pagar para ver seus anúncios publicados nesse jornal têm de fazê-lo por acreditar que assim estão se comunicando com um público exigente e consciente, que busca esse veículo porque acredita no que é publicado nele. Existem jornais assim no Brasil”. (Lourival Sant’Anna)

1 comentário em “Por que os jornais brasileiros estão morrendo?

  1. Anônimo Responder

    Com a internet, tudo ficou mais acessível, por exemplo, sou assinante da revista Veja, mas sei tudo antes de recebê-la, pois vejo na internet.

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