Lobistas articulam Frente Parlamentar para regulamentar a profissão no Brasil

Os lobistas contam com a ajuda do deputado federal Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), para montar Frente, que já têm até estatuto
Carolina Venuto, presidente da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais, que representa os lobistas no país

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Brasília – Há alguns anos eles agiam nas sombras, com atuação quase secreta e discreta. Hoje, ao contrário, vários fazem questão de aparecer para amealhar mais clientes. O certo é que já está passando da hora o país e suas instituições enfrentarem e dar uma solução para tirar do limbo, tornar claras e regulamentar a profissão do lobby no Brasil.

Nesse sentido, a Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), que representa os lobistas no país, está articulando e já começou a coleta das assinaturas necessárias, com auxílio do deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), para montar uma frente parlamentar a fim de defender a profissão e acelerar a regulamentação do lobby. A frente já tem até estatuto.

Em um café da manhã realizado nesta semana em Brasília, com a presença do deputado mineiro e de lobistas que representam gigantes da economia, como CNI, Grupo Globo, J&F, Raízen, entre outros, discutiram detalhes da ofensiva para criar a frente. A profissão de lobista é regulamentada em países, como Estados Unidos, Chile e União Europeia.

Caça às assinaturas

A coleta de assinaturas começou na terça-feira (17). Até o momento, conseguiram 20 das 200 necessárias. “Realizamos pesquisas entre os congressistas e entre a população, e cerca de 70% são a favor da nossa luta [regulamentação]”, disse Carolina Venuto, presidente da Abrig. Hoje, há um debate em curso sobre o termo que será utilizado para se referir à profissão. Além de “lobby”, são usados os termos “relgov”, que significa “relações governamentais” e RIG (Relações Institucionais e Governamentais), que é usado para nomear a associação.

A presidente da Abrig diz que a perspectiva é de que, até o fim do ano, a regulamentação seja votada. “Esse é um momento muito importante para nós, profissionais de RIG, pela confiança que estamos de que, após quase 30 anos de luta, nossa atividade enfim será regulamentada”.

Para acelerar o processo de coleta de apoios, a Abrig lançou mão de uma tecnologia desenvolvida na pandemia. Ao invés das tradicionais assinaturas físicas, agora é utilizado um sistema de QR code que o congressista usa o celular para votar.

O representante CNI, Pablo Cesário, disse que a regulamentação da profissão é uma forma de delimitar o que é a profissão e diferenciar das pessoas que praticam crimes e se identificam — ou são identificados — como lobistas. Além disso, diz, a representação de grupos nos governos é uma parte da democracia. “Se a democracia se resumir a eleições de 4 em 4 anos, ela é pobre. Precisa incorporar mecanismos de relação do governo com a sociedade civil”, disse Pablo Cesário.

Pedido de urgência

O deputado Lafayette de Andrada conseguiu 266 assinaturas para votar o regime de urgência para o projeto de regulamentação da profissão. São necessárias 257. Após reunião com Arthur Lira (PP-AL) na quarta, o presidente da Câmara disse que tem compromisso com o governo para aprovar o projeto. Lafayette quer ser o relator da matéria.

Atuação marginal

O caráter marginal da profissão de lobista no Brasil é motivo de preocupação na sociedade. Não se enganem os brasileiros, a atuação do lobistas vai muito além do que pode supor a mais fértil imaginação.

Os lobistas de escritórios criminais de advocacia, por exemplo, em troca de favores nada republicanos, são os responsáveis pela aprovação de uma das mais vergonhosas “jabuticabas” da Lei de Execuções Penais do país, a famigerada “saidinha”, que solta perigosos criminosos em datas como o Dias das Mães, Natal e outras.

Alguns desses apenados, com grandes penas a serem cumpridas, aproveitam a “saidinha” e simplesmente desaparecem do radar das autoridades.

Outa excrecência, vista nesta semana, também é relacionada à Lei Penal e suas benesses, fartamente utilizada por advogados criminalistas de figurões do crime do colarinho branco.

Com base em dispositivo do pacote anticrime, que na verdade deveria ser chamado de pacote pró crime, cujo texto foi desvirtuado por forte atuação de lobistas no Congresso Nacional, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu a progressão do regime semiaberto para o aberto a Marcos Valério, condenado no Mensalão a 37 anos, cinco meses e seis dias de reclusão, em regime inicialmente fechado, pelos crimes de peculato, corrupção ativa, lavagem de dinheiro e crime contra o sistema financeiro.

No entanto, Marcos Valério vai seguir em prisão domiciliar — a qual lhe foi concedida em razão da pandemia de covid-19. Isso porque, segundo Barroso, informação prestada pelo juízo de Nova Lima (MG) indica que não há, naquele local, “estabelecimento prisional adequado para o cumprimento de pena em regime aberto” — no qual o condenado pode trabalhar durante o dia e, à noite, deve se recolher em casa de albergado. A desculpa esfarrapada de que não há, naquele local, “estabelecimento prisional adequado para o cumprimento de pena em regime aberto”, também é largamente utilizada para livrar das grades criminosos notórios da crônica policial nacional.

Barroso antes de ser nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal, foi o advogado do terrorista e assassino italiano Cesare Battisti.

Há nove anos, quando foi arguido na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, na sabatina que o confirmou para a vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) pela presidente Dilma Rousseff, ele justificou sua atuação no caso da extradição do terrorista Battisti, dizendo que atuou de “modo muito confortável” e que o defenderia de novo se fosse necessário.

Em 2009, o STF entendeu que a decisão sobre extraditar ou não o italiano cabia ao presidente da República. Em 2010, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) negou a extradição, concedendo um indulto presidencial ao terrorista da extrema esquerda italiana.

Na década de 1970, Cesare Battisti foi sentenciado por ter metralhado quatro pessoas e um dos sangrentos atentados terroristas executado por seu grupo, mas dizia que era inocente. Em 1993, foi condenado à prisão perpétua na Itália.

Estava foragido no Brasil e durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) recebeu asilo político. Em dezembro de 2018, teve decretada prisão imediata, pelo ministro Luiz Fux, do STF. No dia seguinte, o então presidente Michel Temer (MDB), decidiu extraditar Battisti. Após a decisão, o ex-ativista fugiu do Brasil e só foi encontrado no domingo, 13 de janeiro de 2019 em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia.

O terrorista desembarcou no aeroporto de Ciampino, em Roma, na Itália, por volta de 11h40 no dia seguinte de sua prisão. Ele cumprirá pena de prisão perpétua num presídio italiano.

Como foi dito, o lobby consegue aprovar coisas que até o diabo duvida.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.