Brasília – Em 2022, o governo continuará a ter dificuldades para aprovar as matérias de seu interesse no Senado Federal. A vaga de líder do governo na Casa está vaga desde o final do ano passado.
O clima de incertezas sobre o quadro eleitoral, em especial em relação à reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL), desarrumou a base e a oposição no Congresso, comprometendo o bom andamento das pautas neste retorno dos trabalhos.
Deputados que em muitas votações apoiavam os projetos do governo planejam se distanciar, de olho na sobrevivência eleitoral. E, nesse sentido, nem o PL, partido de Bolsonaro, e nem o PP, do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, votarão fechados com os desejos do Planalto. Parte das bancadas do PSDB e do DEM, que davam lastro em algumas questões econômicas, tendem a se afastar de vez para marcar oposição e agradar o seu eleitorado.
No Senado, onde o governo tem encontrado mais dificuldades para aprovar os textos que tem interesse, o líder do MDB, Eduardo Braga (AM), deixa subentendido que os obstáculos para o Palácio do Planalto continuam de pé. “A base do governo no Senado é muito fluida, mas, em alguns momentos, eles nos surpreendem. Temos que aguardar para ver como irão se recompor. Até agora, não tem líder do governo no Senado anunciado. Então, ainda está cedo para saber como vai ser o clima para aprovação de projetos do governo no Senado”, avalia.
Não há consenso sequer para definir se a reforma tributária deve começar na Câmara ou no Senado. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pré-candidato ao Planalto, já disse com todas as letras que esse tema será prioridade dos senadores neste primeiro semestre. Já o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), defende uma proposta diferente daquela que tramita por lá e não se cansa de se referir ao Senado como “Casa revisora”, numa indicação de que dará preferência ao texto que está na Câmara.
O primeiro movimento desta semana será uma reunião entre Pacheco e Lira para tentar chegar a um acordo em relação aos próximos passos da tributária e avaliar, ainda, o que pode ser feito para tentar reduzir o preço dos combustíveis, um tema que interessa a todos num ano eleitoral. Também está no radar dos parlamentares a derrubada dos vetos ao Orçamento, com vistas à recomposição de valores destinados à educação e ao INSS, por exemplo, que deixou furiosos alguns líderes da base de apoio ao presidente Bolsonaro.
Porém, fora desses assuntos que ajudam a aliviar o bolso do eleitor, as dificuldades serão grandes. Se Bolsonaro não se recuperar logo diante do eleitorado, não se vota mais nada de interesse exclusivo do Poder Executivo, conforme avaliam os integrantes da base. O que os governistas falam reservadamente, os oposicionistas dizem de peito aberto: “Não vejo clima para grandes avanços na agenda do país”, destaca o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).
Reforma tributária
Tramita no Senado a proposta de emenda constitucional (PEC 110/2019), relatada pelo senador Roberto Rocha (PSDB-MA) e que unifica nove tributos. O tema deve entrar na pauta da Comissão de Constituição e Justiça nesse mês.
Apesar da intenção de destravar a pauta, são reduzidas as chances de uma mudança no sistema tributário sair do papel neste ano. Isso porque uma PEC precisa do apoio de ao menos 60% do Congresso, algo difícil de acontecer com um tema que mexe com arrecadação de entes federados. As apostas é que essa matéria seja tratada apenas no ano que vem com a eleição dos congressistas em outubro.
Reformas tributárias concentram um grande histórico de fracassos no Congresso Nacional. O próprio Pacheco amargou um, considerando que, um dia após a sua posse, ele e Lira anunciaram que outra proposta de reforma tributária, que era analisada em uma comissão conjunta das duas Casas, seria votada entre agosto e outubro do ano passado.
Após o fracasso, o foco agora do senador é centrar os esforços na proposta que tem origem no Senado, cujo relator, senador Roberto Rocha reuniu todas as emendas apresentadas e apresentou o seu relatório que deve ser votado na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) e se aprovado, vai ao Plenário.
Bolsonaro foi eleito prometendo aprovar no Congresso projetos de agrado de sua base mais radicalizada de apoio. Apesar de o Congresso que tomou posse conjuntamente com ele em 2019 também ter sido influenciado pela onda de direita que tomou conta do pleito do ano anterior, pouca coisa nesse sentido andou até o momento.
No Senado, o presidente Rodrigo Pacheco pretende colocar em votação uma proposta para tornar constitucional o direito à união civil entre pessoas do mesmo sexo.
Essa vem sendo uma demanda constante do senador Fabiano Contarato (PT-ES). O parlamentar já cobrou algumas vezes em reuniões de líderes e no plenário que o Congresso Nacional deve assumir a responsabilidade e tornar esse direito constitucional.
A união atualmente já é permitida, mas em virtude de uma decisão do Supremo Tribunal Federal, e não por meio de uma iniciativa parlamentar.
O presidente do Senado tem dito a interlocutores que também devem ser colocadas em votação no primeiro semestre a regularização fundiária, o novo marco legal para licenciamento ambiental e a proposta que libera jogos em resorts integrados.
Líderes partidários, inclusive da base governista, expressam ceticismo com a possibilidade de votação de temas controversos em ano eleitoral. Na avaliação deles, além de medidas provisórias, só serão votados assuntos que tenham apoio amplo parlamentar.
Tradicionalmente o Congresso fica esvaziado em anos eleitorais. A maioria dos deputados federais, além de um terço do Senado, deve se candidatar à reeleição ou a outros cargos. Isso envolve uma maior presença nos redutos eleitorais, além de pouco interesse ou resistência a temas legislativos que possam causar polêmica ou desgaste.
Disputa de poder
Paralelamente às discussões de plenário, o início de atividade legislativa deve ser marcado pelas articulações entre os partidos para tentar atrair o maior número de parlamentares. Será aberta em março a janela de um mês para que deputados possam migrar de partido sem risco de perder o mandato por infidelidade.
A disputa pelo comando das comissões, principalmente na Câmara dos Deputados, também será um dos focos dos partidos. Um princípio de disputa já está se desenhando e coloca em lados opostos bolsonaristas e o União Brasil, novo partido formado pela fusão de PSL e DEM.
Aliados de Bolsonaro reivindicam o cumprimento de um acordo firmado por Lira em troca de apoio na eleição para a presidência da Câmara. Segundo os bolsonaristas, a negociação envolveria o comando de comissões, entre elas a CCJ (Constituição e Justiça), por dois anos.
No entanto, com a expectativa de migração dos parlamentares para o PL, o União Brasil defende que seja cumprido o regimento, com possibilidade de indicação de novos nomes da legenda, inclusive que não façam parte nem do PSL nem do DEM.
Ainda na Câmara, a disputa pela vaga no TCU (Tribunal de Contas da União) que será aberta em julho com a aposentadoria da ministra Ana Arraes também entra no foco dos deputados, que já iniciaram as articulações internas.
Três nomes são apontados como fortes candidatos ao cargo, dois deles do centrão, Jhonatan de Jesus (Republicanos-RR) e Soraya Santos (PL-RJ), e um do PSD de Gilberto Kassab: Hugo Leal (PSD-RJ).
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.