Gestores que deixaram de investir o percentual mínimo em educação em 2020 e 2021 não serão punidos

PEC que anistia os governantes foi aprovada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado. O perdão foi "justificado" pelos "efeitos" da pandemia de covid-19.
A PEC foi aprovada com larga maioria, proselitismo político para agradar prefeitos e governadores, principais “cabos eleitorais” e financiadores dos deputados

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Brasília – Nenhum governador ou prefeito do Brasil precisa mais se preocupar com as punições previstas na Constituição por não ter aplicado o mínimo de 25% de investimentos em educação durante os anos de 2020 e 2021, durante a fase mais crítica da pandemia da Covid-19. Na sessão de segunda-feira (11), a Câmara dos Deputados aprovou, em dois turnos, a proposta de emenda à Constituição (PEC nº 13/2021) que exime de punição esses gestores.

Além de impedir a responsabilização administrativa, civil ou criminal dos gestores públicos, a PEC também acaba com outras consequências legais da não aplicação dos recursos. Hoje, o descumprimento do mínimo de investimentos, previsto na Constituição, pode fazer com que o município ou o estado deixe de receber recursos federais ou perca o direito a renegociação de dívidas. E é, inclusive, motivo para intervenção federal, possibilidade que a proposta também elimina.

Mas, em contrapartida, a PEC obriga o município ou estado que não investiu o mínimo constitucional em educação em 2020 e 2021 a compensar essa diferença no ano que vem, 2023.

A aprovação da “PEC do Calote”, como apelidada, foi comemorada pela Frente Nacional dos Prefeitos, que levantou uma realidade de “arrepiar os cabelos”. Nada menos que 15% dos municípios não conseguiram aplicar o mínimo de 25% do orçamento na educação em 2021. Exatas 835 prefeituras. Até 2019, antes da pandemia, este percentual era de apenas 1%. OU seja, 55 municípios.

Noutro levantamento, a Confederação Nacional dos Municípios, apontou que mais de 10% dos quase 4 mil prefeitos ouvidos na pesquisa atribuíram a dificuldade à suspensão das aulas presenciais, efeito colateral do lockdown, baixado por decretos estaduais e municipais como principal “arma” de combate ao novo coronavírus, quando ainda não se tinha imunizantes para aplicar na população.

Esses argumentos foram usados pelo relator do projeto, deputado Tiago Dimas (Pode-TO), para defender a importância da proposta, que, segundo ele vai dar segurança jurídica aos prefeitos e governadores, inclusive os que estão respondendo a processos na Justiça por ter desviado recursos repassados pelo Ministério da Saúde para combater a pandemia.

Durante os dois últimos anos, vários prefeitos e governadores se meteram em encrencas com compras superfacturadas de equipamentos que nem sequer funcionavam, dentre outras irregularidades.

“Constitucionalizar é o melhor caminho. Nós vamos dar a segurança que os prefeitos, que as prefeitas e que os gestores municipais de educação precisam, e ao mesmo tempo vamos assegurar que os recursos da educação que deixaram de ser investidos ao longo dos últimos dois anos, possam ser aplicados ao longo deste e do próximo ano”, argumentou o realtor.

A anistia aos prefeitos e governadoresm entretanto, foi criticada em Plenário. Para o deputado Glauber Braga (Psol-RJ), na falta de gastos com as aulas presenciais, os gestores poderiam ter usado os recursos para melhorar os salários de professores e profissionais da educação.

“Por que não valorizar os professores com renda? Ao contrário disso, o que fizeram? Começaram a articular uma proposta de emenda à Constituição, ainda no ano de 2021, sem a finalização do prazo de investimento, e já venderam a promessa para alguns prefeitos: ‘Olha, não precisa investir não, que a gente vai aprovar, alguns disseram, uma emenda constitucional que você vai estar livre da responsabilização’. Aí, o que fizeram na ponta? Colocaram este dinheiro em outras áreas.”

Outros deputados se pronunciaram nessa direção criticando a atuação dos gestores inadimplentes.

“Quero aqui concordar com os argumentos do deputado Glauber. Num país onde a educação se encontra nesta situação, um gestor dizer que não teve como gastar os recursos? E depois vem aqui no Plenário, através de seus representantes, dizer que 25% é muito. A emenda é que vai consertar o soneto?”, questionou.

Mas a exceção à exigência constitucional de investimento mínimo de 25% em educação por conta da pandemia foi aprovada por 455 votos, contra apenas 15. A maioria do Plenário considerou que houve motivos para o descumprimento e que a PEC garante a aplicação do que deixou de ser investido no ano que vem, como disse o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ). Isso sem citar que se trata de ano eleitoral e as “bondades” para agradar os principais “cabos eleitorais” dos deputados, são justamente os prefeitos.

“Entendemos que há excepcionalidade do que aconteceu nos anos de pandemia e não podemos responsabilizar indevidamente gestores que por conta do acontecido de maneira excepcional durante este período de pandemia venham a ser responsabilizados. A PEC é muito clara: tudo que deixou de ser investido será investido em anos subsequentes”, garantiu Cavalcante.

A declaração do deputado, um dos líderes da Bancada Evangélica, é puro proselitismo político, uma vez que ele não pode assegurar a sua afirmação.

Como já tinha sido aprovada pelo Senado — origem do texto —, a PEC que impede a punição a prefeitos e governadores que deixaram de investir o mínimo constitucional em educação em razão da pandemia de Covid 19 segue para promulgação pelo Congresso Nacional.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.