Câmara conclui votação de projeto que ressuscita o jogo no Brasil

Oposição não conseguiu derrubar a matéria
Interior do Cassino Hotel Bellagio em Las Vegas, nos Estados Unidos

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Brasília – Deputados que votaram pela aprovação do projeto de lei (PL nº 442/1991) que tramitava há trinta anos na Câmara dos Deputados, disseram que é cedo para comemorar a aprovação da matéria que foi concluída na tarde desta quinta-feira (24), após a análise dos destaques. É que o presidente Jair Bolsonaro (PL), caso o Senado confirme a aprovação do texto, adiantou que vai vetar o projeto.

Alguns partidos de oposição (PSOL e PT) e toda a bancada religiosa da Casa, católica e evangélica, encaminharam contra a aprovação do projeto, mas não tiveram votos suficientes para arquivar o projeto.

“Se o Senado aprovar o texto, é compromisso do presidente Bolsonaro vetar o projeto”, espera o deputado Sóstenes Cavalcante (UNIÃO-RJ), que é pastor evangélico, embora tenha feito questão de afirmar que sua posição contrária à matéria vai além da questão religiosa.

Caso se confirme o veto presidencial ao texto, só uma sessão conjunta do Congresso Nacional poderá derrubar o veto presidencial. Os deputados e senadores que forem a favor da volta do jogo no Brasil, precisarão da maioria absoluta dos votos de deputados e senadores, ou seja, 257 votos de deputados e 41 votos de senadores, computados separadamente.

Como foi a disputa no Plenário

Há 30 anos a matéria tramita na Câmara dos Deputados e o texto foi modificado inúmeras vezes e finalizado após o trabalho de uma comissão especial criada com o único objetivo de examinar a matéria e construir um texto consensual.

O texto aprovado legaliza não só os jogos de aposta, mas autoriza a criação e operação de cassinos no Brasil. A proposta permite, ainda, o funcionamento de bingos, videobingos, jogos on-line, jogo do bicho e corridas de cavalos.

O projeto permite o funcionamento de no máximo três cassinos por estado, dependendo do número de habitantes. Estados com até 15 milhões de habitantes poderão ter um. Estados que têm entre 15 e 25 milhões de habitantes poderão ter dois e aqueles com mais de 25 milhões poderão ter três cassinos em seu território.

Também permite o funcionamento de cassinos em barcos, dependendo da extensão do rio, com no máximo três por rio e no máximo dez no país. A empresa que quiser explorar um cassino terá que ter capital mínimo de R$ 100 milhões. E esse é um filão que se abre na Amazônia e no Pantanal.

Em relação a bingos, poderá ser autorizado um estabelecimento para cada 150 mil habitantes por município, com número de até 400 máquinas de videobingo. Os bingos também poderão ocorrer em estádios com capacidade para mais de 15 mil pessoas. Já para o jogo do bicho será concedida licença para uma empresa a cada grupo de 700 mil habitantes. E os estabelecimentos de corridas de cavalo poderão explorar bingo e videobingo.

O projeto prevê que a licença de operação será concedida pelo Ministério da Economia. No caso dos cassinos, essa licença será concedida após processo de leilão público.

O ministério também ficará encarregado do registro das máquinas de jogos, a partir de laudo técnico, e poderá ter acesso on line ao sistema para verificar o pagamento dos prêmios. Estas máquinas não poderão usar dinheiro vivo, só cartão. O software que será permitido será baseado no modelo explorado nos cassinos norte-americanos, uma vez que os caça-níqueis piratas que operam clandestinamente no Brasil são programados para o pagamento de apenas 1% do prêmio aos incautos apostadores.

Deputados contrários à proposta questionaram o argumento de que a legalização dos jogos vai estimular o turismo e a geração de empregos, como disse o deputado Patrus Ananias (PT-MG).

“Falam que a abertura dos jogos vai possibilitar empregos. Sabemos que não será assim. Falam que vai estimular o turismo. Eu penso que deveríamos estar aqui discutindo o desenvolvimento regional, não abrir jogos, mas pensarmos como desenvolver as possibilidades, as vocações naturais e humanas dos diferentes territórios das diferentes regiões do nosso país”.

O deputado só não explicou porque o seu partido (PT), que governou o país por longos 14 anos, não apresentou os projetos para que seu desejo não ficasse restrito ao campo da retórica barata. É a velha tática do PT de ser contra tudo e todos, sem apresentar, entretanto, nada de concreto ao bem do país.

Regras

O projeto estipula regras de funcionamento do setor: prevê um órgão regulador federal, estabelece como serão cobrados os impostos, define regras de segurança e propõe a criação de tipos penais na legislação para punir crimes ligados aos jogos. Além disso, cria um banco de dados de pessoas viciadas em jogos, que serão proibidas de entrar nesses estabelecimentos. As regras comporão o Marco Regulatório do Jogo no Brasil.

Os defensores da proposta argumentaram que a legalização é uma maneira de combater o uso dos jogos pelo crime organizado e a corrupção. Foi o que disse o deputado Renildo Calheiros (PCdoB-PE). Antes desse posicionamento o deputado esclareceu que era visceralmente contra a aprovação da matéria e explicou porque mudou de ideia.

“Qual o problema de legalizar? É assim que se combate o crime. É assim que se combate a corrupção. E ainda mais que no projeto tem dispositivo que exige cadastro nacional para, inclusive, se alijar desse processo aqueles que se comprovem altamente viciados”, disse.

O relator, deputado Felipe Carreras (PSB-PE), previu a cobrança de uma contribuição, que ele chamou de CIDE-Jogos, com alíquota de 17% para as empresas. Esta alíquota será cobrada sobre 20% do total arrecadado, já que os demais 80% serão destinados aos prêmios. No Plenário, deputados consideraram a tributação pequena, mas destaques para aumentar a alíquota foram rejeitados.

A partir de sugestões de deputados de vários partidos, o relator previu a distribuição da arrecadação da Cide para várias áreas: para a Embratur; para o tratamento de pessoas viciadas em jogos; para o Fundo Nacional de Segurança Pública; para os fundos de participação dos estados e municípios e até para ações de proteção animal e recuperação de áreas atingidas por catástrofes.

Felipe Carreras argumentou que a legalização vai permitir um maior controle de uma atividade que já é praticada de maneira clandestina, sem que haja arrecadação de impostos e precarização da mão de obra recrutada na atividade.

“Nós vamos permitir, regulamentar e recolher impostos para todo e qualquer jogo. Hoje existem 3 mil sites com apostas, com bingo online, cassino online, até Big Brother está sendo apostado e toda a arrecadação vai para fora do país”, ressaltou.

Grupo de trabalho

O texto aprovado foi apresentado por um grupo de trabalho da Câmara e teve como base projeto em tramitação há 30 anos, período em que contou com a oposição de deputados de diversos partidos e frentes parlamentares, como a Evangélica e Católica.

“Não discuto isso com viés religioso. Eu discuto com viés técnico porque já está comprovado que a legalização de jogos de azar não gera empregos. Migra empregos. As pessoas deixarão de ir ao cinema, a restaurantes, para se enfurnarem nesses resorts, onde será saqueado o dinheiro desses pobres usuários deste mal para o dono da banca. Este, sim, sempre ganha”, criticou.

O projeto proíbe as empresas de jogos de conceder empréstimos aos jogadores. Depois de aprovada pela Câmara, a proposta que permite a legalização dos jogos de aposta no país segue para análise do Senado.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.