A menos de duas semanas do recesso, governo corre contra o relógio para aprovar medidas econômicas

Em 12 dias, deputados e senadores entram em recesso
A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), com o ministro Fernando Haddad (Fazenda) em debate na conferência eleitoral do PT, realizada em Brasília no sábado (9/12)

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Os planos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, começam a ‘’fazer água’’, caso o Congresso Nacional não vote, até o dia 22 deste mês, as medidas econômicas arrecadatórias propostas pelo governo. A agenda econômica está em risco e é intensa a movimentação nos bastidores em busca de acordo para a aprovação da agenda.

São meses à espera da votação, o que expõe, sobretudo, a ineficiência da coordenação política do Planalto, a cargo do deputado federal licenciado, nomeado ministro ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República (SRI), Alexandre Padilha.

É de Padilha, segundo fonte ouvida reservadamente pela reportagem do Blog do Zé Dudu, ‘’a primeira cabeça a ser cortada na reforma ministerial que está sendo avaliada e será anunciada no início de 2024, guardada a sete chaves pelo governo Lula’’.

Haddad elegeu quatro prioridades máximas para a defesa de sua tese econômica, que possa dar o mínimo de previsibilidade para o ajuste fiscal planejado pelo governo:

• a MP (medida provisória) que altera as regras de subvenção do ICMS; • a de taxação de recursos em offshores (com sede no exterior) e fundos exclusivos, usados pelos super-ricos
• a que corta benefícios tributários do JCP (juro sobre capital próprio, remuneração paga por empresas a acionistas) e
• a que regulamenta as apostas esportivas.

As dificuldades do governo tem endereço certo: o 4° andar do Palácio do Planalto, no gabinete de Alexandre Padilha. O ministro Padilha não consegue desatar os nós criados pela Casa Civil e demais instâncias do primeiro escalão do governo, sua perda de credibilidade é notória.

Deputados e senadores, especialmente o que aderiram recentemente ao governo, mas, principalmente os da oposição, se queixam de demora do governo no pagamento de emendas e acusam o Executivo de não cumprir acordos — como, por exemplo, os relacionados a vetos presidenciais.

Durante conferência eleitoral do PT no sábado (9), em Brasília, Haddad afirmou que o Congresso tem muita resistência à agenda de eliminação de ‘’jabutis’’ — trechos estranhos ao projeto inicial enviado pelo governo — que deterioram as contas públicas e à garantia de direitos sociais.

‘’Talvez poucos possam imaginar a luta que é aprovar essas medidas. Semana que vem será decisiva para 2024. O governo vai ter de aprovar meia dúzia de leis, maduras para serem aprovadas, que precisam passar para garantir um Orçamento mais consistente e possam dar fundo de financiamento para aquilo que precisa ser pago — direitos dos trabalhadores, saúde, educação’’, disse.

No evento, observado por lupa pela ala liderada pela presidente nacional do PT, deputada Gleise Hoffmann (PT-PR) e seus aliados, não escondem de ninguém, pelo contrário, escancaram nas redes sociais, que a política econômica de Fernando Haddad não contempla a base da militância do partido.

A necessidade de avanço nas negociações fez Haddad deixar de participar da Cúpula do Mercosul, no Rio de Janeiro, e permanecer em Brasília nos últimos dias. Mesmo assim, a agenda não teve avanço significativo —incluindo a principal medida de arrecadação, a MP do ICMS.

Líderes do governo chegaram a cobrar o ministro Alexandre Padilha pelo ritmo de emendas. Ele prometeu novas liberações de recursos para os parlamentares até o final do ano.

‘’O tom da nossa conversa foi no sentido de manter acelerado até o último dia do ano a execução dessas emendas parlamentares. No nosso balanço, é extremamente positivo em relação ao último ano do governo anterior’’, disse Padilha na terça (5), que tem evitado contato com a imprensa.

Pendências

A SRI disse que o governo aumentou em 80% a liberação de emendas neste ano em relação ao de 2022. ‘’Essa forte expansão é prova do compromisso democrático e republicano do governo federal com deputadas, deputados, senadoras e senadores e a todos os eleitores que elas e eles representa’’, comunicou em nota.

Das quatro medidas de arrecadação perseguidas por Haddad, somente o projeto de lei sobre a tributação de recursos em offshores e fundos exclusivos foi aprovado nas duas Casas até agora. O texto aguarda a sanção presidencial, o que deve ocorrer no começo da semana.

A Medida Provisória do ICMS ainda precisa ser analisada no âmbito de comissão mista (formada por deputados e senadores) para depois seguir ao plenário da Câmara e do Senado. O relator da medida quer incorporar em seu parecer o conteúdo da proposta da JCP (Juros Sobre Capital Próprio) — uma modalidade de remuneração de acionistas, que precisa ser aprovada ainda em 2023 para valer no ano que vem.

O governo federal discute com o Congresso neste momento mudanças no JCP, mecanismo criado logo após o Plano Real, mesma época em que se optou por isentar a distribuição de dividendos aos acionistas. Essa isenção também deve ser revista no próximo ano.

De forma resumida, o dividendo corresponde à parcela do lucro que já foi tributada na empresa, com Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, e está isenta na distribuição para o acionista pessoa física.

O JCP é a parcela do ganho que não foi tributada na empresa. Quando esse valor é pago a pessoas físicas, incide o Imposto de Renda retido na fonte de 15%. Investidores institucionais e fundos de pensão, por exemplo, são isentos.

Ele funciona como uma espécie de dedução, ou seja, reduz a tributação sobre o lucro da companhia. Dessa forma, aumenta o valor que pode ser distribuído. Por isso, há uma complementaridade entre os dois mecanismos que, ao final, aumentam a remuneração e reduzem o imposto para o investidor.

Na prática, é como se o lucro das empresas fosse tributado de uma única vez. A parcela distribuída na forma de JCP, com IR na fonte de 15%. A parcela excedente, com IRPJ/CSLL de 34% (alíquota nominal nas grandes empresas de capital aberto).

BETs

Já a proposta que regulamenta apostas esportivas (BETs) ainda precisa do aval do plenário do Senado e deverá voltar à Câmara para que os deputados analisem as mudanças feitas por senadores. Ela deverá ser apreciada pelos senadores nesta semana.

A Fazenda estimou, na época do envio ao Congresso, que as quatro medidas ainda pendentes de análise renderiam ao todo mais de R$ 65 bilhões em receitas em 2024. Mas, como as propostas sofreram alterações pelos congressistas, essas estimativas de arrecadação devem sofrer mudanças.

O ministério, no entanto, mantém as projeções iniciais afirmando que as matérias não tiveram suas tramitações concluídas no Congresso. Sobre o projeto dos fundos, que aguarda sanção, a pasta diz que não há projeção atualizada.

Além de tentar destravar as propostas do Congresso, o governo federal tenta evitar a aprovação de outras matérias que podem gerar impacto para os cofres públicos — como o projeto que prorroga por cinco anos o benefício tributário do Reporto, o regime tributário para incentivo à modernização e à ampliação da estrutura portuária previsto para terminar no fim de 2023.

A Câmara aprovou na quinta-feira (7) um requerimento de urgência para o projeto. A urgência acelera a tramitação de matérias na Casa, uma vez que ela não precisa ser analisada em comissões e pode seguir direto ao plenário. Agora, os deputados precisam se debruçar sobre o mérito da proposta.

Reforma Tributária e Orçamento de 2024

Além do pacote de medidas fiscais, o governo ainda tenta aprovar neste ano a Reforma Tributária e as propostas ligadas ao Orçamento de 2024. As mudanças no sistema de tributos no país têm o apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e, por isso, a expectativa é que essa proposta seja aprovada nos próximos dias.

Apresentação do relatório do grupo de trabalho da reforma tributária. Ao microfone, o relator da matéria, deputado Agnaldo Aguinaldo Ribeiro (PP-PB)

O relator da Reforma Tributária na Câmara dos Deputados, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), disse que o presidente Arthur Lira já sinalizou para a votação da reforma tributária (PEC n° 45/2019) na semana que vem no Plenário. Ele explicou que serão feitas sugestões de supressão de alguns dispositivos aprovados no Senado, mas que tudo será conversado com o presidente daquela Casa, senador Rodrigo Pacheco. “Tecnicamente, o que a gente vai ver é o que pode ser suprimido no texto sem que isso comprometa a reforma”, disse.

Aguinaldo Ribeiro se reuniu com líderes partidários da Casa na quinta-feira (7) e deverá fazer uma nova rodada de conversas na segunda-feira (11). A expectativa é que possa ser votada em plenário nesta semana.

Em relação ao Orçamento de 2024, há ainda questões a serem resolvidas, como o valor do fundo eleitoral. No entanto, líderes do Congresso querem solucionar o impasse e iniciar 2024 com o Orçamento já aprovado.

O cenário traçado por membros do Congresso é, portanto, de votações em série na reta final do ano.

MP que altera as regras de subvenção do ICMS

Na última semana, a insatisfação política e viagens de autoridades fizeram com que o principal projeto de Haddad pendente de aprovação no Congresso — a MP que altera as regras de subvenção do ICMS — fosse adiado.

Inicialmente, havia uma expectativa de que o relatório sobre a MP da subvenção do ICMS pudesse ser apresentado e votado no âmbito da comissão mista nesta semana, o que não ocorreu. Uma reunião do colegiado prevista para esta semana foi adiada duas vezes e agora deverá ocorrer na terça-feira (12).

Parlamentares familiarizados com as tratativas afirmam que há poucos pontos no mérito do texto em si que ainda precisam ser ajustados, e que o adiamento se deu por essa insatisfação política.

Pesou ainda o fato de Lira estar fora do país — ele viajou na segunda para Dubai, para participar da COP 28, a conferência de mudanças climáticas da ONU, e volta a Brasília no começo da próxima semana.

O presidente da comissão mista que analisa a MP, senador Rogério Carvalho (PT-SE), confirmou que há entraves políticos. Mas disse que os impasses podem ser resolvidos nos próximos dias. ‘’A gente acha que na terça-feira, com a chegada e a presença do presidente da Câmara, Arthur Lira, do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, do presidente Lula, todos aqui [em Brasília], não teremos problemas para fazer a primeira reunião de leitura do relatório. Se der, a gente aprova no mesmo dia; se não, a gente aprova depois das vistas [pedidos de vistas que deve ser concedido aos congressistas para terem acesso ao texto final]’’, disse o senador na quinta.

O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), admitiu que para o Executivo ‘’seria mais tranquilo’’ se o cronograma esperado para a MP tivesse sido cumprido, mas disse que o novo calendário proposto é ‘’exequível’’.

Ele afirmou que o relatório poderá ser apresentado e votado em comissão mista na próxima semana para que, a partir do dia 18, ele possa ser levado ao plenário da Câmara e do Senado. O calendário, no entanto, ainda não foi fechado, porque depende da costura política que ainda será feita entre governo e parlamentares.

Confira o resume dos Projetos de Haddad para aumentar receitas

Mudança em subvenções do ICMS

Status: MP está no Congresso e Haddad propôs flexibilização do texto

Arrecadação prevista para 2024*: R$ 35 bi;

• Offshores e fundos exclusivos

Status: Aprovado na Câmara e no Senado; aguarda sanção presidencial

Arrecadação prevista para 2024*: R$ 20 bi;

• Fim de JCP

Status: Está na Câmara. Conteúdo deverá ser incluído em proposta da subvenção do ICMS

Arrecadação prevista para 2024*: R$ 10 bi;

• Regulamentação de apostas esportivas

Status: Aprovado na Câmara; deve ser votado no Senado nesta semana

Arrecadação prevista para 2024*: R$ 1,6 bi

* Estimativa original do governo

Outros projetos

• Reforma Tributária

Status: Precisa ser votado novamente no plenário da Câmara, pois foi alterado no Senado;

• LDO e Orçamento de 2024 Status: Estão na Comissão Mista de Orçamento e depois precisam ser aprovados no plenário do Congresso.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.