PSB protocola ofício e sai do bloco de apoio a Arthur Lira na Câmara dos Deputados

O presidente do PSB, Carlos Siqueira, nega interferência do governo para a saída do maior bloco da Casa
Lira (E) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (D), chegam para a abertura do ano legislativo

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No mesmo dia da retomada dos trabalhos legislativos, nesta segunda-feira (5), surgiu a primeira reação política após o duro discurso do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) em mensagem direta ao Palácio do Planalto, QG do governo do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O novo líder do PSB — legenda do vice-presidente Geraldo Alckmin (SP) — o deputado Gervásio Maia (PSB-PB), protocolou na secretaria-geral da Mesa um ofício informando que o partido deixará o maior bloco partidário da Casa, que reúne siglas como PP, União Brasil, PSDB-Cidadania (unidos numa Federação Partidária), PDT, Solidariedade, Patriota e Avante, sob a liderança do próprio Arthur Lira.

O ofício foi assinado por 10 dos 14 parlamentares da bancada. Em abril do ano passado, Lira conseguiu atrair partidos de centro, de direita e da base do governo Lula (PT) para formar o maior bloco da Casa. Com o PSB, o grupo tinha 176 deputados (dos 513).

Segundo membros do PSB, a única decisão tomada, até o momento, é a saída do grupo. Não há definição se o partido irá integrar o segundo maior bloco da Casa, que reúne PSD, MDB, Republicanos e Podemos.

A saída coincide com movimentos de articuladores do governo de aproximação com candidatos à sucessão de Lira na presidência da Câmara, que ocorre em fevereiro de 2025. O alagoano não pode concorrer à reeleição e pretende transferir o capital político que tem na Casa a um sucessor.

Segundo vozes de vários parlamentares próximo a Lira, não teria sido citado nominalmente a quem ele dará o seu apoio, mas dois nomes despontam na corrida: o vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (Republicanos-SP) — que começa a ser incensado pelo governo —, e Elmar Nascimento (União Brasil-BA), líder da União Brasil na Casa e homem de confiança de Arthur Lira.

Na semana passada, Lula fez uma série de gestos a Pereira, convidando-o a viajar com ele para cumprir agendas em São Paulo. Isso teria acendido o sinal de alerta de outros pretendentes ao cargo.

Diretoria que fura poço e acha petróleo

No sistema presidencialista o peso da escolha do presidente da República é um aval importante nesse tipo de eleição, mas não fundamental. O próprio governo Lula, no passado, já sofreu uma fragorosa derrota quando subestimou a candidatura do então expoente máximo do Baixo Clero, o federal Severino Cavalcante (PP-PE), mais conhecido como aquele que queira a “diretoria que fura poço e acha petróleo”, em tempos de pós-mensalão e pré-petrolão.

Em 2005, a eleição para a presidência da Câmara, que começou com um racha dentro do PT, terminou na maior derrota do governo Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso. Com 300 votos dos 498 deputados presentes, foi eleito no dia 15 de fevereiro, o novo presidente da Casa o candidato independente Severino Cavalcanti (PP-PE), que construiu sua candidatura com a promessa de elevar salários e de melhorar as condições de atuação dos colegas congressistas.

O candidato oficial, Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), só teve 195 votos —menos que os 207 obtidos no primeiro turno, três horas antes. Houve ainda um voto em branco e dois nulos.

Na votação do primeiro turno, Greenhalgh teve 207 votos; Severino Cavalcanti somou 124 votos; o canditato avulso Virgilio Guimarães (PT-MG) teve 117 votos; José Carlos Aleluia (PFL-BA) contou com 53 votos e Jair Bolsonaro (PFL-RJ), com 2 votos. Votaram em branco três deputados e nulo, outros quatro.

Na tarde de 21 de setembro do mesmo ano de 2005, Severino Cavalcante se elegeu presidente com 300 votos. E o número de dias no cargo não chegou a tanto. Foram 220. Severino deixou a presidência da Câmara, renunciou ao mandato e perdeu o posto de segundo homem na linha sucessória da República. Durante esses 220 dias, Cavalcante deu um “show de corrupção”, foi denunciado e teve de renunciar. Logo depois estouraria os escândalos de corrupção do PT.

De camarote

Assistindo à movimentação do Planalto em favor dos deputados Marcos Pereira e Antonio Brito (PSD-BA), que têm feito gestos ao Executivo desde o ano passado, Lira endureceu o discurso.

Segundo integrantes do governo, o presidente da Câmara reclamou com emissários do Palácio do Planalto de uma tentativa de interferência na sucessão interna, uma vez que esse movimento acaba fragilizando o seu bloco.

Oficialmente, membros do Executivo afirmam que o governo não vai interferir na sucessão de Lira por se tratar de assunto interno à Casa. Mesmo assim, os nomes que se colocam na disputa buscam o apoio, ainda que informal, de aliados do petista.

Interlocutores de Lira dizem ainda que esse movimento cria mais ruídos do alagoano com o Palácio do Planalto. O presidente da Câmara tem elevado o tom de críticas ao ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais), responsável pela articulação política do Executivo no Legislativo.

Na cerimônia de abertura do ano legislativo na segunda-feira, Lira tratou Padilha com absoluta frieza no Congresso. Na avaliação de parlamentares, o tom do presidente da Câmara em seu discurso reflete essa insatisfação.

O próprio Lira citou sua sucessão no discurso, afirmando que “errará grosseiramente” quem apostar numa inércia da Câmara em 2024, em razão das eleições municipais e das “especulações” de quem irá sucedê-lo na presidência da Câmara, “que ocorre apenas em 2025”.

Assistindo a tudo de camarote, o presidente do PSB, Carlos Siqueira, nega interferência do governo para a saída da sigla da base de apoio a Lira. Segundo ele, há cerca de dez dias os deputados do partido decidiram deixar o bloco, alegando insatisfação com o funcionamento do grupo.

Mas não houve qualquer pedido do governo neste sentido. “Agora, os deputados ficam livres para compor com o que for mais interessante, talvez até mais próximo do governo”, garante Carlos Siqueira.

“Não foi o governo que nos pediu. Ninguém nos pediu”, continuou Siqueira. Palavra de político, pois não.

* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.