Lula assinará decreto que, na prática, adia pesquisa de petróleo na Foz do Amazonas

Documento obriga a realização da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar, estudo caro, demorado e sem prazo para acontecer
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assina decreto de qualificação da organização social que vai administrar o Centro de Bionegócios da Amazônia (CBA). O objetivo da medida é agregar valor e intervenção novos negócios baseados nos recursos naturais da região

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Brasília – Fontes do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (MMA) garantem que, na próxima semana, o presidente Lula deverá assinar um decreto sobre a necessidade de realização da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) em locais ambientalmente sensíveis para a exploração de petróleo, como a bacia da foz do Rio Amazonas. A medida, porém, não irá se restringir à região e vai ajudar a “regulamentar as avaliações ambientais estratégicas para todo o Brasil”, disse o presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho. Na prática, isso significa que não há mais qualquer prazo para a pesquisa de petróleo na foz do Amazonas.

A ausência de AAAS foi uma das justificativas do órgão ambiental para negar o pedido de licença da Petrobras para perfurar um poço de exploração de combustíveis fósseis no FZA-M-59, bloco a cerca de 160 km de Oiapoque, no Amapá. O mecanismo não é um pré-requisito para as licenças, mas, ressaltou Agostinho, “é um instrumento importante que mede a viabilidade ambiental de um projeto, um estudo que não olha exclusivamente para a área de perfuração e avalia o conjunto”.

No dia 17 de maio de 2023, o Ibama negou uma licença para a Petrobras perfurar o bloco localizado na foz do Rio Amazonas, bacia que fica na fronteira com a Guiana Francesa, onde foram descobertas e já estão explorando imensas reservas de petróleo e gás natural na região.

A foz do Amazonas faz parte da Margem Equatorial Brasileira, uma região costeira que se estende do Rio Grande do Norte ao Amapá, composta ainda por outras quatro bacias sedimentares (Potiguar, Ceará, Barreirinhas e Pará-Maranhão).

A negativa do Ibama ao pedido de pesquisa da Petrobras “ocorreu por questões técnicas”, garante o órgão ambiental federal. Entre elas, destaca-se o prazo de 43 horas para conter vazamentos, caso haja acidentes, e a falta de uma AAAS.

Coelho tirado da cartola

Como num espetáculo circense, o Ibama, cumprindo determinação expressa da ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, a acreana Marina Silva, ativista ambiental de renome internacional, “retirou o coelho da cartola” e determinou que o Ibama só libere – se um dia o fizer –, a licença para a pesquisa caso seja apresentado o estudo completo da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar, que pode durar décadas para ser concluída. Com isso, o governo trava qualquer possibilidade de descoberta do potencial dos hidrocarbonetos que podem estar depositados na região.

A AAAS foi instituída em uma portaria interministerial de 2012. Sua elaboração, de acordo com o texto, é uma atribuição conjunta dos ministérios de Minas e Energia (MME) e do MMA. Seu objetivo era ampliar o conhecimento sobre os possíveis impactos ambientais da exploração de petróleo e gás fóssil nas regiões, subsidiando com mais informações os órgãos de licenciamento ambiental, notadamente o Ibama. A medida, porém, ficou no papel.

A expectativa para um decreto obrigando a realização da AAAS para a foz do Amazonas surge num momento em que a Petrobras e determinadas alas do governo vêm aumentando a pressão pela licença para perfurar no FZA-M–59 e em outras bacias da chamada Margem Equatorial. Na semana passada, a petroleira promoveu dois eventos para defender a exploração de combustíveis fósseis nessas áreas, relatam a Agência Brasil e a revista Carta Capital. Mesmo a despeito do Ibama ter avaliado a exploração na foz do Amazonas como de máximo risco ambiental.

A altíssima sensibilidade ambiental da foz motivou um estudo do Greenpeace e do Instituto de Pesquisa Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA). Além de coletar dados sobre as correntes marítimas da região, o levantamento avaliou os impactos da atividade petrolífera. E já constatou que, mesmo sem o Ibama autorizar a exploração do FZA-M-59, impactos sociais e ambientais já são sentidos na região de Oiapoque, como o aumento do custo de vida local e a pressão sobre as Terras Indígenas e Áreas Protegidas. Essas informações não puderam ser confirmadas de forma independente pela Reportagem.

O estudo das entidades ainda mostra o temor da população da região com a possível exploração de petróleo e gás fóssil. De acordo com os dados, obtidos a partir de 103 entrevistas individuais, 42% dos entrevistados têm perspectivas negativas sobre a exploração petrolífera na região; 69% temem os impactos do vazamento de óleo; e 96% não participaram de audiências públicas sobre o tema.

Até o momento, o que se tem visto é a completa letargia da bancada da Região Norte do país no Congresso Nacional quanto ao tema, crucial para a possibilidade de rápida mudança do status de pobreza para alguma melhoria de vida da população, que detém os piores índices de Desenvolvimento Humano do Hemisfério Sul.

Foram realizadas, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, não mais do que quatro audiências públicas nas comissões temáticas, para ouvir a ministra Marina Silva dizer o que todos sabem: se depender da sua pasta, essa licença jamais será liberada.

Por Val-André Mutran – de Brasília