Após interferência indevida de pastores no MEC, deputados querem demissão do ministro da Educação

O caso virou prato cheio para a oposição ao governo na Câmara dos Deputados. A Bancada Evangélica está dividida quanto ao afastamento do titular da pasta, cuja cabeça pode acabar como a de João Batista
Pastor Gilmar Santos (esq) e o ministro da Educação, pastor Milton Ribeiro (dir). Relações sob suspeita

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Brasília – Líderes de partidos da oposição apresentaram nesta quarta-feira (23), na Câmara dos Deputados, pedidos de convocação do ministro da Educação , pastor Milton Ribeiro, após a divulgação de áudios vazados na imprensa. Pesa contra o titular da pasta, suposta autorização de liberação de recursos a prefeituras indicadas por pastores aliados ao governo, em clara interferência indevida e ilegal.

Como os trabalhos nas Comissões Permanentes da Casa não retomaram após o Carnaval, os pedidos devem ser analisados pela Mesa Diretora e a palavra final de pautá-los cabe ao presidente Arthur Lira (PP-AL). Ele disse qua ainda não ouviu os áudios que ensejaram os pedidos.

Se os pedidos de convocação forem votados e aprovados por maioria simples dos deputados, o ministro Milton Ribeiro será convocado em data a ser marcada, para prestar explicações diretamente no Plenário.

A última vez que isso aconteceu foi em maio de 2019, quando o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou por 307 votos a 82, a convocação do então ministro da Educação, Abraham Weintraub, para explicar à Casa os cortes no orçamento das universidades públicas e de institutos federais.

Na cova dos leões

O ministro Milton Ribeiro é acusado de prometer “priorizar” os “amigos do pastor Gilmar” a pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL). A fala refere-se a Gilmar dos Santos, líder do Ministério Cristo para Todos, uma das igrejas evangélicas da Assembleia de Deus em Goiânia (GO). A declaração foi realizada em uma reunião no MEC com prefeitos, lideranças do FNDE e os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, um líder nacional da Igreja Assembleia de Deus.

A Frente Parlamentar Evangélica, uma das mais numerosas do Congresso Nacional, está dividida. Uma ala está de olho na substituição de Ribeiro que administra um dos maiores orçamentos do governo. Outra ala diz que não tem nada a ver com a indicação do ministro, que é evangélico e pastor. “Sua nomeação é responsabilidade do Bolsonaro”, disse um deputado membro da Frente.

Enquanto os deputados evangélicos discutem a portas fechadas como tratarão o assunto, a oposição ao governo enxerga na denúncia uma oportunidade para “sangrar e carimbar” na testa do presidente Jair Bolsonaro a marca da corrupção e atirar o ministro na “cova dos leões.

Um dos mais escandalosos desses deputados é Ivan Valente (PSol-SP), que em momentos de crise desfia um rosário de acusações, sempre se referindo ao presidente como genocida e chefe de milicianos. Ele disse há pouco que: “Os áudios demonstram que o governo Bolsonaro sofre de ‘corrupção generalizada’. Pastores faziam uma gestão paralela no Ministério da Educação. O pastor-ministro Milton Ribeiro simplesmente distribuía verbas a municípios a partir de intermediários que eram pastores designados pelo Bolsonaro”, denunciou.

O líder da Minoria, Alencar Santana Braga (PT-SP), disse que as condutas deveriam ser investigadas pela Procuradoria-Geral da União. “O presidente Bolsonaro praticou crime de improbidade, crime de advocacia administrativa, ao defender o interesse privado perante a administração pública. Assim como o ministro e os pastores citados.”

A Liderança da Minoria na Câmara apresentou uma notícia ao presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, contra o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Milton Ribeiro.

Em nota conjunta, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e os deputados Tabata Amaral (PSB-SP) e Felipe Rigoni (União Brasil-RJ), entraram com representação na PGR (Procuradoria Geral da República). O grupo de congressistas diz que o “ministro da Educação teria permitido tráfico de influência de pastores dentro da pasta”.

O senador Fabiano Contarato (PT-ES) disse que pedirá ao STF a abertura de um inquérito para apurar as “gravíssimas denúncias que pesam contra o ministro”. O petista disse ainda que “Milton Ribeiro converteu o MEC num balcão de negócios para suas traficâncias rasteiras, negociando favores públicos à luz do dia”.

Os deputados Kim Kataguiri (União Brasil-SP) e Túlio Gadelha (PDT-PE) também foram à Justiça contra as falas do ministro da Educação. Apresentaram requerimentos separados à PGR por possível crime de responsabilidade e improbidade administrativa pelo chefe do MEC.

Gadelha também protocolou um pedido de convocação do ministro ao Congresso. O deputado quer que Milton Ribeiro dê explicações ao plenário da Câmara sobre o áudio.

Defesa

O ministro Milton Ribeiro cancelou a agenda da pasta logo que as denúncias foram divulgadas na terça-feira (22). Pelas redes sociais, o ministro afirmou que “a alocação de recursos ocorre segundo legislação orçamentária bem como critérios técnicos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE)” e que “não há nenhuma possibilidade” de o ministro determinar alocação de recursos para favorecer ou desfavorecer qualquer município ou estado.

Ele desmentiu a acusação de que estaria atendendo pedidos para beneficiar prefeituras indicadas pelos dois pastores pivôs das denúncias, porque seriam ordens expressas do presidente Bolsonaro.

Na guerra de narrativas, o deputado Professor Alcides (PP-GO) saiu em defesa de Ribeiro e criticou a oposição por fazer acusações sem provas. “A esquerda fala mais uma vez que o ministro da Educação Milton Ribeiro vai atender a pastores. Eu pergunto: qual é o tipo de recursos que o Ministério da Educação tem para liberar para os pastores? Que eu saiba, nenhum. Então, a esquerda realmente não tem o que fazer”, afirmou.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.