Semana inicia com reuniões para instalação de CPIs e votação do novo marco fiscal

Governo quer aprovar arcabouço fiscal e retomar tramitação para votação da reforma tributária; em audiência, secretária fala abertamente em aumento de impostos
Em primeiro plano da vista aérea, o Palácio do Congresso Nacional

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Brasília – Emparedado por um base aliada nada confiável e por agentes econômicos cada vez mais impacientes com a lentidão do governo em cumprir as promessas de campanha, quando jurou melhorar o ambiente de negócios no país, a semana legislativa começa com alta octanagem e será decisiva para a agenda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

As reuniões para tratar da instalação das Comissões Parlamentares de Inquérito que tramitarão nas três instâncias do legislativo federal: Câmara (MST), Senado (ONGs) e Congresso Nacional (Atos do 8 de Janeiro), acontecerão ao mesmo tempo que as análises dos textos finais das propostas que vão à votação.

As análies acontecerão em reuniões fechadas, que já começaram, com os líderes partidários, na manhã desta segunda-feira (15), pelos relatores do PL das Fake News e do novo Marco Fiscal.

Parlamentares da oposição criticaram o que chamam de “institucionalização da censura”

Furiosos

Deputados da oposição estão furiosos e criticaram, com veemência, na quinta-feira (11), o que classificaram de campanha do Supremo Tribunal Federal (STF) para fazer avançar o Projeto de Lei das Fake News (PL nº 2.630/2020). Para eles, o tribunal atua com “abusos” e “injustiças”, o que pode prejudicar a liberdade de expressão.

As declarações foram expressadas durante audiência na Comissão de Comunicação da Câmara dos Deputados. Parlamentares governistas não participaram da audiência pública. Embora convidados, assim como representantes das big techs, Google e Meta e Twitter, que também não estiveram presentes, os parmamentares justificaram ausência por “incompatibilidade de agenda”.

Em documento enviado ao colegiado, o Twitter afirmou ser favorável a um “caminho comum” para a regulamentação que considere a natureza dos negócios na internet. “As discussões regulatórias não devem ser vistas como um simples debate binário, entre sim ou não, sobre a moderação de conteúdo, mas sim propostas substanciais sobre como garantir que essas práticas sejam compatíveis com o direito dos cidadãos de se expressar, debater e divergir”, reforçou a plataforma.

Tom de críticas ao STF subiu de tom

Durante a reunião, parte das críticas foi direcionada à decisão, considerada inconstitucional, do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que mandou o Telegram retirar do ar mensagens contra o PL das Fake News. Caso a plataforma não apagasse o texto, ainda segundo a ordem de Moraes, seria retiradada de ar. A mensagem foi deletada.

Para o deputado Marcel van Hatten (Novo-RS), a decisão “não tem fundamentação jurídica” e reforça o caráter “autoritário” do tribunal. Ele defendeu a criação de uma CPI para apurar abuso de autoridade do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Na opinião do deputado Gustavo Gayer (PL-GO), que solicitou o debate, a atuação do tribunal interfere no debate democrático e é um evidente abuso de poder. “Nós não temos defesa alguma, muito pelo contrário. Nós somos alvos constantes na mira dos que querem destruir a democracia”, disse.

Na mesma linha, falou a deputada Caroline de Toni (PL-SC). “Da mesma forma como o povo está sendo preso e tolhido por falar o que pensa, por ser contra esses abusos de poder, nós também não temos mais a garantia de que a gente não vai ser preso por uma palavra, porque a gente perdeu o parâmetro da segurança jurídica”, denunciou.

O coordenador do Grupo de Trabalho da Reforma Tributária, quer mais 20 dias de prazo para apresentação do relatório

Solicitado mais prazo para apresentação do relatório do GT da Reforma Tributária

O coordenador do Grupo de Trabalho da Reforma Tributária (PECs 45/2019 e 110/2019), deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), anunciou que vai pedir ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), mais 20 dias de prazo para o colegiado, prorrogando a apresentação do relatório, do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), para 5 de junho. Embora seja do governo, a coordenação política do Palácio do Planalto, que tem pressa na aprovação da matéria, este não quis se manifestar sobre o pedido. Nenhum deputado do Pará participa desse grupo de trabalho.

Reginaldo Lopes explicou que serão feitos encontros com os governadores e os prefeitos das capitais nos próximos dias, e um seminário de três dias com as bancadas estaduais na Câmara, a partir do dia 22 de maio. O primeiro encontro com governadores será no dia 19, no Rio de Janeiro, com os dirigentes do Sul e do Sudeste.

Até agora já foram feitas 16 audiências públicas. Na última, realizada na quinta-feira (11), o Ministério da Fazenda, por meio da diretora da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, Camilla Cavalcanti, afirmou aos deputados do grupo que o governo defende a previsão de um cashback tributário na nova emenda constitucional, mas explicou que não é preciso decidir agora se o mecanismo atingirá somente alimentos da cesta básica nem se beneficiará apenas os mais pobres.

Governo já fala em aumento de impostos. “O cashback seria a devolução do novo imposto que será criado para compensar, por exemplo, o fim da desoneração para a cesta básica”, disse, para surpresa da audiência, a diretora da Secretaria Extraordinária da reforma Tributária do Ministério da Fazenda – Secretaria Extraordinária da reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Camilla Cavalcanti

Fala sobre aumento de impostos, surpreende audiência

O cashback seria a devolução do novo imposto que será criado para compensar, por exemplo, o fim da desoneração para a cesta básica. Camilla disse que é importante estabelecer que a devolução de imposto será a mais rápida possível. A diretora explicou ainda que existem modelos com cashback e desoneração; ou seja, alíquotas mais baixas. A fala da secretária sobre aumento de impostos deixou a audiência perplexa.

O deputado Reginaldo Lopes, visivelmente constrangido e com cara de paisagem, para disfarçar, disse que o cashback deve funcionar melhor que a desoneração. “Benefícios fiscais, na verdade, não chegaram até os mais pobres. E também não chegaram até os preços. Tem dados que comprovam o que eu estou falando. Isso parou e concentrou riqueza na mão de algumas centenas de famílias e não na mão dos 90 milhões que estão no CadÚnico.”

O presidente da Associação Brasileira de Supermercados, João Carlos Galassi, no entanto, condenou a ideia de cashback, que ele chamou de “utopia”. Para ele, é necessário manter a desoneração dos alimentos e diferenciar ricos e pobres no Imposto de Renda.

Unificação de tributos

A reforma pretende unificar cinco tributos: IPI, PIS, Cofins (federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um novo Imposto sobre Bens e Serviços cobrado apenas no destino final das mercadorias.

Com base nessa ideia, Camilla Cavalcanti fez uma forte oposição à PEC 46/2022, em tramitação no Senado. Segundo ela, a proposta mantém os cinco tributos e a incidência de imposto sobre imposto, ou a cumulatividade.

A técnica disse ainda que o agronegócio não terá perdas porque as exportações serão desoneradas e 90% dos produtores, que são os pequenos, deverão ter tratamento diferenciado.

Em relação aos serviços ao consumidor final, Camilla disse que 89% estão nos regimes do Simples ou são Microempreendedores Individuais (MEI) e poderão permanecer nas regras atuais.

Em defesa da PEC 46, o economista Alberto Macedo calcula uma alíquota de equilíbrio de 29% para o novo IBS. Segundo ele, muitos municípios vão ter perdas com a mudança da cobrança da origem para o destino e com o que ele chamou de “potencial de arrecadação” do ISS com a ampliação da base de serviços nos próximos anos.

Já o economista Gustavo Madi apresentou estudo da LCA Consultores que calcula uma alíquota de 22,2% para que o novo IBS arrecade o mesmo que o sistema atual. O governo já falou em 25%.Gustavo explicou que, embora o setor de serviços possa ter uma redução de carga de 26,7% para 21,7%, áreas específicas como saúde e educação privadas teriam aumentos de custos caso não tenham tratamento diferenciado.

Sobretaxa

Outro ponto da reforma discutido na audiência foi a criação do Imposto Seletivo, que seria um tributo para sobretaxar produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. Hoje já existe uma sobretaxa de IPI para bebidas e cigarros.

O Ministério da Saúde vem defendendo a ampliação da sobretaxação para bebidas açucaradas e alimentos ultraprocessados. A representante do ministério na audiência, Letícia Cardoso, disse que as mortes por doenças como câncer e diabetes estão crescendo e um dos motivos é a má alimentação.

Mas o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos, João Dornellas, defendeu uma dieta equilibrada e que o conceito de alimento ultraprocessado seria controverso.“Dentro de uma dieta equilibrada, tem lugar para tudo, para todos os alimentos. Mas infelizmente no Brasil, um tempo atrás, criou-se um termo, o ultraprocessado, e a gente sabe que tem grupos que fazem pressão para que estes alimentos paguem mais impostos”, criticou.

Dornellas lembrou que a indústria fez acordos com o governo para redução de componentes como açúcar e sódio nos alimentos e para uma nova rotulagem que indica produtos com altos teores destes componentes.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.