Sem confirmação de encerramento de operação Uiara, garimpeiros se rearticulam para voltar a operar no Rio Madeira

Prefeito de Borba (AM), Simão Peixoto (PP), juntou centenas de garimpeiros em comício com foguetório para anunciar “fim da operação”
Balsas de garimpo incendiadas na Operação Uiara da Policia Federal, no Rio Madeira

Continua depois da publicidade

Brasília – O governo federal não admite que encerrou a Operação Uiara, coordenada pelo Ministério da Justiça e executada pela Polícia Federal e o Ibama, com o apoio da Força Nacional e das Forças Armadas, para o combate ao garimpo ilegal de ouro no Rio Madeira (AM). Mas, o prefeito do município de Borba (AM), Simão Peixoto (PP), garantiu que a operação foi suspensa por “ordem de Brasília” e os garimpeiros já começam a se articular para reconstruir as dragas sobre balsas.

Peixoto discursou para centenas de garimpeiros no Centro da cidade. “Quero dizer que a partir de hoje [segunda-feira, 29] a operação foi cancelada. Consegui falar com a assessoria do ministro da Justiça. Estou indo amanhã [hoje] para Brasília”, garantiu o prefeito a um grupo de cem garimpeiros na estrutura improvisada as pressas para o comício.

O prefeito deixou claro que, por enquanto, está proibido retirar o ouro do rio e que mantém contato permanente com deputados e senadores da bancada do Amazonas, que são em sua maioria favoráveis à legalização do garimpo no Rio Madeira.

O prefeito recomendou: “Enquanto não for decidido… As balsas de vocês não serão mais queimadas. As balsas que estão no fundo, procure tirar e montar novamente, mas vocês estão impedidos por enquanto ainda de extrair o ouro”, alertou , referindo-se às embarcações que foram afundadas pelos próprios garimpeiros para que não fossem incendiadas e eles pudessem recuperá-las depois.

Imagem aérea do “arrastão de balsas” garimpando ouro no Rio Madeira chocou o mundo e arranhou ainda mais a imagem do país no exterior

O saldo até agora foi a apreensão e destruição com fogo de 131 balsas de garimpo de um total que supera 300 e três garimpeiros presos, dentre milhares que se espalharam tão logo a operação foi anunciada no rádio e na televisão. Algumas balsas foram afundadas pelos próprios garimpeiros para depois serem recuperadas. Entre a cruz e a espada, o governo está numa situação que pode colocar em xeque — ainda mais — as promessas de proteção ao meio ambiente e a Amazônia firmadas na CPO-26. A imagem do “arrastão de balsas” num dos braços do rio Madeira, chocaram o mundo.

Os garimpeiros fizeram festa com o anúncio do fim da operação na praça de Santo Antônio — Borba é conhecida como a “Aparecida do Amazonas” devido à peregrinação à cidade na data de Santo Antônio. Eles soltaram fogos de artifício, desfilaram com cartazes que diziam que “garimpeiro também é cidadão” e agradeceram ao padroeiro do município.

Na manhã de segunda-feira (29), helicópteros do Ibama sobrevoaram a região, mas as lanchas dos órgãos de fiscalização não chegaram ao local — para alívio dos garimpeiros. Na noite de domingo (28), os garimpeiros assistiram ao fogo consumindo duas balsas do outro lado da margem.

O dilema do governo

Na segunda-feira (29), parlamentares do Amazonas se movimentaram em Brasília para encontrar um meio-termo entre a operação da polícia contra o garimpo ilegal e a manutenção da economia da região.

A pressão evidenciou a sinuca de bico em que ficou o Palácio do Planalto com a situação: por um lado, auxiliares admitem que os ministérios da Justiça e do Meio Ambiente se viram forçados a agir em meio à uma tentativa do governo de adequar sua mensagem de combate ao crime na região amazônica. Por outro lado, a regularização do garimpo sempre foi defendida pelo presidente Bolsonaro e ambientalistas afirmam que esse posicionamento incentivou a atuação de criminosos na região.

Ainda na segunda-feira (29), antes do prefeito de Borba anunciar a suspensão temporária da operação, o deputado federal Silas Câmara (Republicanos-AM) esteve com o ministro da Justiça, Anderson Torres, para defender a cautela na operação. Na conversa, ficou definido que o superintendente da Polícia Federal no Amazonas iria entrar em contato com os prefeitos da região para uma possível adequação sobre o procedimento adotado.

“É preciso separar o joio do trigo. Muitas dessas balsas que foram queimadas eram residências dessas famílias. São mais de 8 mil famílias que vivem dessa atividade e, muitas delas, regularizadas, com termo de lavra”, ressaltou.

Além disso, os prefeitos são esperados em Brasília para uma reunião com a bancada do Amazonas. O encontro deverá ocorrer na sede do PSD porque o presidente da bancada é o senador Omar Aziz, que foi presidente da CPI da Covid no Senado.

Segundo o deputado federal Capitão Alberto Neto (Republicanos-AM), o governo teve que agir em razão do excesso de balsas na região. Em suas redes sociais, o parlamentar chegou a compartilhar um dos vídeos da operação publicados pelo ministro Anderson Torres. Entretanto, assim como o colega Silas Câmara, Neto destacou a necessidade de que a polêmica levante a discussão sobre a regularização do garimpo no Rio Madeira.

“O presidente Bolsonaro briga para que a gente possa sentar e discutir sobre a regularização, para facilitar que se tenha uma estrutura para se fiscalizar. Assim do jeito que tá, quem paga o preço é o morador dessas regiões”, afirmou.

A tramitação do projeto de regularização de garimpos em Reservas Florestais e Indígenas está “congelada” no Congresso Nacional.

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.