No Pará, R$ 9 em cada R$ 10 vêm de fora para 65% das prefeituras

Mesmo em municípios reconhecidamente ricos por conta da mineração, percentual de receitas que não são transferências é baixo. Parauapebas, por exemplo, movimenta menos que Marabá

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É mais fácil sustentar jegue a pão de ló que uma prefeitura paraense manter-se às próprias expensas. Essa é a conclusão a que chegou o Blog do Zé Dudu ao analisar as contas dos municípios do estado. O Blog jogou o peso das transferências correntes, aquele dinheiro recebido diretamente da União e do Governo do Estado, sobre a receita líquida total e constatou que 65% das prefeituras não vivem, vegetam. Muitas, inclusive, são ricas. Mas faliriam caso não houvesse a bengala de outrem para escorar.

De um universo de 67 administrações municipais com as contas entregues ao Tesouro Nacional, 44 receberam de fora, no ano passado, ao menos 90% do que arrecadaram. A situação mais grave até o momento é a da Prefeitura de Tracuateua, onde R$ 67,205 milhões dos R$ 68,549 milhões movimentados nas contas da prefeitura ao longo de 2020 foram oriundos de transferências, a maior parte da União. Isso quer dizer que 98,18% da receita aterrissaram de fora do município.

O ganha-pão de municípios como Tracuateua são basicamente as cotas do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). As duas primeiras são repassadas pelo Governo Federal e a última, pelo Governo do Pará. Município essencialmente rural, onde a maior parte da população vive no campo, a principal atividade econômica é a agropecuária, embora a maior parte do Produto Interno Bruto (PIB) seja movimentada no setor de serviços.

Na mesma situação de Tracuateua, no tocante à dependência extrema de receitas externas, estão as prefeituras de Maracanã (97,82%), Nova Timboteua (97,63%), Garrafão do Norte (97,23%) e Curuá (97,21%). Mas a lista de quem vem atrás, com mais de 90% de dependência, é extensa e tem nomes como o de Viseu, cuja prefeitura faturou R$ 154,495 milhões ano passado, sendo que 95,06% desse valor vieram do “exterior”. Famoso por seu carnaval agitado, Viseu não consegue transformar as atrações locais em dinheiro vivo para atender as demandas de sua população.

Outro carnavalesco que também é só zuada, mas que depende bastante de transferências, é Bragança, um dos municípios mais populosos do estado, com aproximadamente 130 mil habitantes. Dos R$ 214,887 milhões de faturamento da prefeitura local em 2020, ao menos R$ 198,728 milhões vieram da União e do Governo do Estado, ou seja, 92,48%. Bragança tem atualmente a 17ª prefeitura mais rica do Pará, atrás da de Redenção e à frente da de São Félix do Xingu.

Menos dependentes

Das 67 prefeituras analisadas, apenas meia dúzia consegue gerar localmente mais de 20% do que arrecadam. Elas são as menos dependentes de recursos externos do estado. A campeã é a Prefeitura de Belém, cujo município — líder em precariedade entre as capitais nos quesitos saneamento básico, distribuição de renda, informalidade, atração para negócios e qualidade de vida — produz 40,08% do que entra nos cofres. Apesar dos muitos pesares, Belém é uma das cidades mais autônomas da Região Norte quando o assunto é fazer dinheiro, muito por causa de seu tamanho. Ser uma metrópole com 1,5 milhão de habitantes ajuda a impulsionar o recolhimento de impostos como o IPTU e o ISS.

Barcarena, por seu turno, produz 35,78% de sua arrecadação, enquanto Marabá gera 32,12%, os percentuais mais incríveis depois da capital do estado. Em 2020, Marabá conseguiu, de maneira autônoma, movimentar R$ 340 milhões em recursos que não se enquadraram em transferências correntes. Para se ter ideia dessa força, Parauapebas, que arrecadou quase o dobro de Marabá, só conseguiu ajuntar em receitas extratransferências R$ 299,5 milhões.

Em suma, depois de Belém, Marabá é o município que, de fato, consegue ajuntar mais dinheiro por si mesmo. Além deles, também são bons produtores de divisas próprias os municípios de Paragominas (27,74% de sua arrecadação), Ananindeua (27,55%) e Redenção (23,09%).

“Ferrodependentes”

Quando postos os valores de Marabá e Parauapebas lado a lado para confronto, verifica-se que a força financeira da Prefeitura de Parauapebas sustenta-se em recursos de volatilidade extrema, como a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem) e a vultosa quantia de ICMS que, assim como a Cfem, é gorda em decorrência da atividade extrativa do minério de ferro. Tira-se isso, e o faturamento do município de Parauapebas cai bruscamente para um “normal” de R$ 600 milhões arrecadados por ano, valor que não daria jamais para quitar a atual folha de pagamento da prefeitura, de quase R$ 678,5 milhões.

Outro na mesma situação de ferro dependência é Canaã dos Carajás, que embora tenha ostentado arrecadação de R$ 1,014 bilhão ano passado, só produziu R$ 110 milhões localmente, e isso porque o Imposto Sobre Serviços — receita própria que, no entanto, só é alta em Canaã por conta da presença de projetos de mineração robustos — também depende da mineração. Sem a mineração, a receita líquida de Canaã teria de fazer esforço tremendo para conseguir arrecadar R$ 100 milhões.