O mercado multibilionário de compras on-line brasileiro sofreu um tsunami um dia após o Senado ter aprovado a criação do Imposto de Importação de 20% para compras no exterior de até US$ 50 (cerca de R$ 260 pela cotação atual) por pessoas físicas. É que a gigante Temu, marketplace chinês presente em 18 países, começou a operar no Brasil com uma estratégia agressiva que, em três semanas, já está fazendo estrago nos concorrentes.
A plataforma de comércio eletrônico, que já aderiu ao programa Remessa Conforme, da Receita Federal, promete agitar ainda mais a concorrência no crescente mercado de compras on-line brasileiro.
Segundo informações da empresa, a operação começou no último dia 6, oferecendo frete grátis em todos os pedidos, além de devolução gratuita de produtos em até 90 dias. Mistura de Shein com Shopee, a Temu é conhecida por oferecer preços agressivamente baixos, num portfólio que vai de roupas a utilidades domésticas.
Como forma de atrair o consumidor, a plataforma disponibilizou ofertas relâmpago de R$ 1,99 e descontos variados no primeiro dia de operação. Para compras acima de R$ 400, o desconto chegou a R$ 50; compras acima de R$ 250 receberam R$ 35 de desconto e quem gastou mais R$ 175 obteve desconto de R$ 15.
O site anuncia peças de lingerie a partir de R$ 0,79 e calçados masculinos e infantis a partir de R$ 7. Além de roupas, a Temu oferece eletrodomésticos, bijuterias, óculos, entre outros produtos.
Inovação com alta tecnologia de algoritmos poderosos e uso de influencers
No exterior, a Temu é conhecida por seus pesados investimentos em marketing via influencers – sucessores digitais dos marreteiros presenciais de ruas movimentadas do país – para conquistar o público mais jovem. Na outra ponta, usa ferramentas de “gamificação”, como pontos obtidos após determinado número de compras ou convites a novos usuários, que leva o cliente a acumular descontos.
O resultado é uma métrica melhor de engajamento de usuários, que chegam a ficar 22 minutos no site da Temu, contra uma média de 11 minutos na Amazon e 12 na Shein.
Jovens consumidores no alvo
“Apesar de o marketing pesado de influenciadores em mídia sociais da Temu ser conhecido por atingir principalmente consumidores mais jovens, a estratégia de preços baixos e os recursos viciantes de gamificação parecem ressoar também com usuários mais velhos,” escreveu a equipe de varejo do banco BTG Pactual em relatório recente.
Desde 2023, a Temu já vinha estudando o mercado brasileiro para trazer sua operação ao país, ampliando a competição não apenas com os também asiáticos Shein, Shopee e AliExpress, mas também com a americana Amazon. Temu significa “Team Up, Price Down” (algo como “time para cima, preços para baixo”, na tradução literal) – uma abreviação do lema da empresa.
Empresas nacionais nas cordas do ringue
Nas cordas do ringue nacional, a Americanas, segregada da competição após protagonizar o maior escândalo contábil em décadas – algo em torno de R$ 40 bilhões de calote, e sendo processada pelas autoridades brasileiras –, atualmente não tem qualquer condição de voltar a competir com as estrangeiras. Já a Magalu, plataforma digital da maior varejista de capital nacional no segmento magazine, a Magazine Luiza, está descascando uma pupunha para se manter no ringue.
Com o caixa assolado pela repentina alta de juros devido à pandemia de covid-19, enquanto as concorrentes vendiam como nunca antes on-line, a empresa brasileira tinha problemas em competir nas mesmas condições, devido aos estoques desatualizados e alavancagem (dívidas) na estratosfera. A empresa, que já chegou a negociar o papel de (MGLU3) na Bolsa de Valores a mais de R$ 100, atualmente oscila na casa dos R$ 10, após recente agrupamento de lote de ações, de 1 para 10, ou seja, as ações custavam pouco mais de R$ 1 e agora custam R$ 10, recurso utilizado para não ser retirada da composição do índice Bovespa (IBOV).
Em maio passado, a Receita Federal brasileira autorizou a Temu, que é a terceira maior plataforma de serviços digitais da China, a operar dentro do Remessa Conforme. As mudanças de regras que o governo federal está promovendo nas compras de até US$ 50 já eram esperadas pela empresa e não desestimularam sua vinda ao Brasil, segundo uma fonte que acompanhou as negociações da empresa no país.
Embora menor que o mercado chinês e o dos EUA, o Brasil tem importância para essas plataformas pelo interesse do consumidor brasileiro nos preços mais baixos oferecidos em relação ao varejo tradicional nas plataformas on-line.
As compras on-line movimentaram R$ 185,7 bilhões no Brasil em 2023, segundo um levantamento da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico, um valor ínfimo se comparado ao US$ 1,2 trilhão de dólares do colossal mercado que os chineses movimentaram no mesmo ano.
Modelo semelhante ao da Shein
A Temu nasceu em 2022, e atingiu um valor de vendas de US$ 2,3 bilhões em seu primeiro ano de vida. Em maio passado, o e-commerce Temu apareceu como o quinto aplicativo mais baixado no mundo, atrás somente das redes sociais TikTok, Instagram, Facebook e Whatsapp, segundo ranking do site App Magic.
Na prateleira digital da plataforma chinesa, há pelo menos trinta categorias de produtos entre eles beleza e saúde, casa e jardim, joias e acessórios, eletrônicos, sapatos e bolsas, esportes e atividades ao ar livre, artigos para animais de estimação (pets), produtos para escritório e, claro, moda (as indefectíveis “blusinhas”).
Em relatório divulgado no ano passado, quando já se esperava a entrada da Temu no Brasil, os analistas de varejo da XP Danniela Eiger, Thiago Suedt e Gustavo Senday escreveram que a empresa tem um modelo de negócios semelhante ao da Shein, com algoritmos que ajudam os fabricantes chineses a entender rapidamente as necessidades dos consumidores, levando a maior precisão e eficiência na produção dos fornecedores. É uma engrenagem azeitada.
“O posicionamento da Temu foca na relação de custo/benefício, com preços baixos, alavancados por fretes grátis e uma forte estratégia de descontos e compra mínima — em torno de R$ 100,” escreveram os analistas, lembrando que a Temu traz menos risco às varejistas tradicionais de roupas pela sua diversidade de produtos.
A Temu foi fundada como braço internacional da Pinduoduo (PDD Holdings), gigante chinesa do ramo de tecnologia a que pertence, e que opera plataformas de comércio eletrônico desde 2015. Seu fundador é Colin Huang, ex-executivo do Google China. Ela permite que as pessoas façam compras em grupo, conseguindo descontos elevados com essa escala.
O nome Pinduoduo vem de pin (juntos) e duo (muito), o que significa “unindo muitas pessoas”. O sucesso foi tanto que Huang tornou-se o terceiro homem mais rico da China desde que criou o negócio.
Por Val-André Mutran – de Brasília
1 comentário em “Chinesa de compras on-line, Temu chega ao Brasil metendo medo nas concorrentes e até nas nacionais”
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