O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou, nesta quinta-feira (27), no Palácio do Planalto, o Projeto de Lei que institui a primeira Universidade Federal Indígena do Brasil (Unind). A proposta será encaminhada ao Congresso Nacional para análise e votação, consolidando um marco histórico para a política indigenista e para a ampliação do acesso dos povos indígenas ao ensino superior no país.
A criação da Unind já havia sido antecipada pelo presidente durante a inauguração da ponte sobre o Rio Araguaia, na cidade de Xambioá (TO), entre os estados do Pará e Tocantins. Agora, com a assinatura formal do PL, o projeto segue para apreciação na Câmara dos Deputados e no Senado. A expectativa é que a universidade seja inaugurada em 2026, com a implantação de mais de 120 campi distribuídos em diversas regiões do Brasil.
Marco histórico para os povos indígenas
A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) celebrou o envio do projeto ao Congresso. A cerimônia contou com a presença do ministro da Educação, Camilo Santana; da ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara; da presidente da Funai, Joenia Wapichana; parlamentares; pesquisadores; professores; e lideranças indígenas de diferentes etnias.
Ao discursar, o presidente Lula reafirmou o compromisso do Governo Federal com o fortalecimento da educação escolar indígena e com a defesa dos direitos constitucionais desses povos.
> “Essa universidade chega para devolver o respeito, a cidadania e a dignidade que um dia tentaram tirar dos povos indígenas. É papel do Estado garantir que os direitos sociais e a identidade indígena não sejam violados”, afirmou o presidente.
O ministro Camilo Santana anunciou ainda que será criada uma Portaria de Comissão de Instalação da Universidade, além da nomeação de um reitor pro tempore responsável por conduzir a organização acadêmica e pedagógica da instituição após a aprovação do PL.
Para a ministra Sonia Guajajara, a universidade representa a concretização de décadas de luta por um modelo educacional que reconheça e valorize os conhecimentos tradicionais indígenas.
A presidente da Funai, Joenia Wapichana, afirmou que o PL simboliza um ato de justiça histórica, ao atender uma demanda fundamental dos povos indígenas por acesso a uma educação superior que respeite suas culturas, práticas e línguas.
> “A Unind é a concretização do protagonismo indígena na construção do próprio futuro. É por meio de uma educação superior alinhada aos nossos saberes que formaremos lideranças e profissionais capazes de defender nossos territórios e assegurar nossos direitos”, declarou.
Construção coletiva e atuação institucional
A elaboração do projeto contou com participação direta da Funai, do Ministério da Educação e do Ministério dos Povos Indígenas, por meio de um Grupo de Trabalho (GT) interministerial criado em 2024 e retomado em 2025. O GT estruturou a proposta a partir de uma perspectiva diferenciada de educação superior, contemplando a diversidade dos 391 povos indígenas brasileiros e suas 295 línguas.
Pagu Rodrigues, diretora de Direitos Humanos e Políticas Sociais da Funai e indígena do povo Fulni-ô, classificou a criação da Unind como um avanço significativo na política indigenista nacional. Já Lucia Alberta, do povo Baré e diretora de Gestão Ambiental e Territorial da Funai, ressaltou a importância da participação qualificada das lideranças indígenas em todas as etapas do processo.
Modelo multicampi e funcionamento
A Unind foi concebida em modelo multicampi, com polos de extensão distribuídos em diferentes estados para atender às necessidades territoriais e culturais das comunidades indígenas. O objetivo é garantir que estudantes possam cursar o ensino superior próximos de suas aldeias, preservando seus vínculos familiares e formas de organização social.
A sede administrativa será instalada em Brasília (DF). A escolha foi unânime entre os integrantes do GT e as lideranças indígenas, devido ao papel central da capital federal nas decisões políticas e nas mobilizações históricas do movimento indígena.
O projeto prevê que a universidade entre em funcionamento a partir de 2027.
Áreas estratégicas de formação
Os cursos ofertados deverão atender a áreas consideradas essenciais para o fortalecimento da autonomia e da autodeterminação dos povos indígenas, como:
gestão ambiental e territorial;
políticas públicas;
sustentabilidade socioambiental;
promoção e preservação de línguas indígenas;
saúde indígena;
direito;
agroecologia;
engenharias e tecnologias;
formação de professores.
A proposta inclui cursos de graduação, pós-graduação e formação continuada, estruturados conforme as demandas apresentadas pelas comunidades e pelos territórios etnoeducacionais.
Processo de diálogo e escuta
A construção da proposta priorizou a consulta aos povos indígenas, em consonância com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que determina a consulta prévia, livre e informada em políticas que os afetam diretamente.
Foram realizados 20 Seminários Regionais de Escuta em localidades como São Gabriel da Cachoeira (AM), Belo Horizonte (MG) e Recife (PE). Lideranças, estudantes, professores e pesquisadores contribuíram com sugestões e relataram demandas específicas para a formação acadêmica indígena.
Trajetória e conquistas
Desde a Constituição de 1988, o acesso dos povos indígenas ao ensino superior vem sendo ampliado por meio de políticas afirmativas, programas diferenciados e criação de vagas específicas. O Instituto Insikiran de Formação Superior Indígena, da Universidade Federal de Roraima (UFRR), é citado como referência pioneira nessa trajetória.
Essas iniciativas pavimentaram o caminho para a criação da primeira universidade inteiramente dedicada à educação superior indígena no Brasil.
Carlos Magno
Jornalista – DRT/PA 2627









