Metade das prefeituras do Pará não deve conseguir fechar as contas de 2020

Despesa com pessoal está estrangulada em 52 prefeituras e outras 14 estão na zona perigosa, entre limites prudencial e máximo. Situação compromete oferta de serviços essenciais básicos.

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A situação das contas de mais da metade das prefeituras paraenses é crítica. A julgar pelo Relatório de Gestão Fiscal (RGF) do 2º quadrimestre de 2020, 52% das administrações municipais vão ter um 2020 interminável — o ano findou, mas as responsabilidades administrativas do exercício não. A afronta à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) é flagrante. A informação foi levantada com exclusividade pelo Blog do Zé Dudu, que analisou a prestação de contas de 100 prefeituras do estado, quanto à despesa com pessoal processada até agosto do ano passado. Os balanços municipais consolidados nos 12 meses do ano 2020 só devem começar a ficar prontos a partir do final deste mês.

Olhando para trás, o cenário foi de terra arrasada no último ano de mandato para muitos prefeitos, que viram a receita arrecadada sem grandes alterações ao passo que tiveram de desembolsar percentuais altíssimos para custear o funcionalismo. Até agosto, 52 das 100 prefeituras que entregaram a despesa com pessoal estouraram o limite de gastos previsto em lei, produzindo uma tendência que dificilmente pode ter sido revertida no final do ano.

É que a apuração da gestão fiscal, embora feita quadrimestralmente, reproduz tendências para os períodos futuros, e os municípios só conseguem fugir da curva do fracasso caso vislumbrem supercrescimento de receitas, o que não é a realidade dos que estouraram o teto máximo estipulado pela LRF, segundo a qual o comprometimento da receita líquida em 48,6% acende o limite de alerta; em 51,3% toca o limite prudencial; e a partir de 54%, limite máximo, a situação das contas entra em estado crítico.

Mais de 70% da receita

Se rondar o limite máximo da Lei de Responsabilidade Fiscal já causa arrepios para gestores conscientes de que a despesa com pessoal pode trazer muitos transtornos políticos, fiscais e administrativos, imagine quanto se estoura — e muito — essa faixa. No Pará, meia dúzia de prefeituras ultrapassaram não apenas 54%, mas bem mais que isso: 70%. Estão, do ponto de vista fiscal, à beira da falência, com quase tudo o que arrecada sendo devorado pela folha de pagamento dos servidores. Áreas essenciais como educação, saúde e infraestrutura acabam sucateadas e recebem o mínimo possível.

Mocajuba ostenta a pior situação entre os 100 municípios com contas entregues — mas, na realidade, nem é o pior do Pará: o título está com Gurupá, que não enviou até hoje suas contas do 2º quadrimestre ao Tesouro Nacional. Em Mocajuba, 76% da receita líquida tornam-se salários de servidores. É a 8ª pior situação entre os 3.026 municípios brasileiros que prestaram informações ao Tesouro, segundo investigou o Blog do Zé Dudu.

Atrás vêm Acará (74,15%), Garrafão do Norte (72,97%), Curuá (72,2%), Nova Esperança do Piriá (71,09%) e Augusto Corrêa (70,82%). Do grupo dos “estourados” fazem parte, ainda, prefeituras de municípios paraenses importantes, como Marituba (69,45%), Tucuruí (64,32%), Bragança (63,4%), Xinguara (58,5%) e Cametá (58,41%).

Na zona de risco, perto de estourar o limite de gastos com pessoal estavam 14 administrações, entre as quais Redenção (53,56%), Castanhal (52,65%), Altamira (53,37%) e Santarém (52,2%), todas as quais na faixa do limite prudencial. Na faixa anterior, a de limite de alerta, estavam oito prefeituras, como Barcarena (49,57%) e Curionópolis (50,99%).

Diga-se de passagem, o governo de Curionópolis foi, entre todos os 144 municípios do estado, o que apresentou a maior deterioração nas contas públicas, tendo em vista que sua despesa com pessoal cresceu em mais de R$ 1,5 milhão de 2019 para 2020 enquanto sua receita líquida desabou cerca de R$ 15 milhões no mesmo período.

Situação confortável

Na zona de conforto, 26 prefeituras paraenses não afrontaram qualquer dos limites da LRF. O número das que não afrontam é, porém, metade das que ultrapassam o limite máximo. São administrações com razoável eficiência na gestão fiscal, seja por empenho da estrutura administrativa local, seja por eventos inesperados, como a superarrecadação, muitas vezes não prevista, que faz a despesa com pessoal ficar pífia diante de receitas robustas.

Nessa faixa, estão prefeituras como Paragominas (46,28%), Belém (44,33%), Marabá (44,04%), Ananindeua (40,7%), Parauapebas (35,25%) e Canaã dos Carajás (20,91%), esta última com o 3º menor grau de comprometimento do país. Hoje, se quiser reajustar os salários de todos os seus servidores públicos em 100%, a Prefeitura de Canaã pode fazê-lo com tranquilidade e, ainda assim, não afrontará a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Tudo isso por conta de uma robusta arrecadação de recursos advindos da mineração, a maior parte dos quais, contudo, não pode ser utilizada para custear folha de pagamento. São dois extremos de gestão fiscal, um falido e um de mar de rosas, habitando as diferentes realidades do Pará.

Veja a situação dos municípios