Estado é processado por causa de situação degradante de escola em Parauapebas

Para o MP, dilema da Escola Eduardo Angelim é grave, com 1.209 alunos e cenário com uso de drogas e até automutilações

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Uso de drogas, automutilações e até suicídios. Este é o panorama sombrio encontrado pela 4º Promotoria de Defesa da Improbidade Administrativa no anexo IV da Escola Estadual de Ensino Médio Eduardo Angelim, localizada no município de Parauapebas, no sudeste do estado do Pará.

O depoimento chocante sobre a situação do educandário foi prestado pela própria diretora da escola, durante inquérito civil que apurou diversas denúncias de irregularidades na Eduardo Angelim, por alunos e pais de alunos, e que culminaram numa ação civil pública movida pelo promotor de Justiça Hélio Rubens Pinho Pereira contra o estado do Pará, para regularizar a situação perigosa e degradante na qual se encontram os alunos.

Durante o depoimento, a diretora da escola estadual Eduardo Angelim, que não teve o nome revelado, relatou ao promotor que o educandário conta com 1.209 alunos, distribuídos em 10 turmas matutinas, 10 vespertinas e 11 noturnas. Entretanto, apesar do elevado número de estudantes, segundo ela, a escola conta com apenas três servidores de apoio fornecidos pelo Estado, que exercem somente a função de limpeza.

A escola, segundo a diretora, não dispõe de nenhum servidor estadual lotado no apoio administrativo. Ou seja, é a própria diretora quem administra o educandário sozinha, contando apenas com a ajuda de três agentes de portaria fornecidos pelo município, o que favorece a ação de bandidos e de traficantes que agem vendendo drogas dentro da escola, um dos graves problemas enfrentados pela diretoria, que tem como consequencia o consumo  de entorpecentes, por parte de alguns alunos. Segundo a diretora, o número de estudantes com quadros depressivos tem aumentado.

De acordo com ela, há relatos de alunas que mutilam o corpo, cortando a pele do pulso. No depoimento ao promotor Hélio Rubens, a diretora diz lembrar de pelo menos três casos de suicídios. A escola não conta com psicólogo no quadro de funcionários. A situação do tráfico dentro dos muros da escola já teria sido denunciada por ela à Polícia Militar, Polícia Civil, Guarda Municipal e Conselho Tutelar, mas nada teria sido feito.

A merenda escolar foi outro problema detectado pela Promotoria de Justiça. Durante a oitiva, a diretora conta que a escola nunca ofereceu merenda porque não possui pessoal para o preparo da alimentação. Desde o ano de 2016, a declarante teria informado, via e-mail, a situação para a Secretaria de Estado de Educação (Seduc). Entretanto, não obteve qualquer resposta da secretaria sobre a questão. Por esse motivo, a alimentação recebida na escola, que deveria ser distribuída aos alunos, tem sido devolvida, por falta de pessoal para prepará-la.

A educadora afirma ainda que já houve vezes em que se recusou a receber a merenda pois, nas vezes em que aceitou, o alimento acabou se estragando. Outro grande problema detectado diz respeito à precária estrutura física do prédio. As salas não têm ventiladores, nem quadro magnéticos, e a iluminação é inadequada para as aulas. O banheiro não possui separação de gênero, ou seja, meninos e meninas utilizam o mesmo espaço. As escadarias da escola não possuem corrimão e nem iluminação no local, colocando em risco os alunos que sobem e descem para assistirem as aulas e se movimentam na hora do recreio.

Outro fato preocupante é a estrutura elétrica do prédio, que também não dispõe de nenhum extintor de incêndio. Para agravar a situação, a fiação da Celpa passa muito próximo das sacadas onde os alunos passam os intervalos das aulas e, como não existe nenhum anteparo físico, muitos estudantes costumam tocar na rede de alta tensão. As salas do segundo e terceiro pisos apresentam goteiras tão grandes que impedem a realização das aulas.

O prédio não conta com sala de professores, de informática e de leitura. Dentre tantos problemas graves, estruturais e de gestão, apenas a falta de professores alegada pelos pais de alunos foi resolvida no ano passado, de acordo com a diretora.  “A situação da escola Eduardo Angelim representa um comportamento estatal de total deslealdade à dignidade humana e aos valores constitucionais mais básicos. Não existe justificativa para este estado de coisas. A precariedade é vergonhosa e fere de morte os indivíduos em formação”, diz o promotor na ação civil.

A Promotoria de Justiça anexou aos autos do processo um CD mostrando salas de aulas completamente alagadas por goteiras. Outro vídeo mostra alunos na sacada da escola, esticando os braços e tocando facilmente na rede elétrica de alta tensão. Segundo o promotor Hélio Rubens, esse tipo de omissão fere frontalmente a lei 11.947/2009. “O Estado não tem a faculdade de fornecer ou não merenda. Trata-se de um dever imposto pelo ordenamento, cujo correspondente recurso foi repassado ao ente federativo pelo Fundo Nacional de desenvolvimento da Educação. Os adolescentes saem de casa para receber educação de qualidade, mas, contraditoriamente, são confrontados com esse tipo de realidade”, afirma.

Um laudo com as inadequações do prédio alugado para o funcionamento da Eduardo Angelim foi anexado à ação, demonstrando o descaso com a situação da escola e a necessidade urgente de providências imediatas para regularizar a situação. O engenheiro do Ministério Público do Estado (MPPA) esteve no local e confirmou o que fora dito pela diretora. O perito certificou ainda a total inadequação do prédio para a atividade de ensino. Ficou registrado que existe real e concreto risco à vida aos alunos, sobretudo por conta da precariedade da parte elétrica interna. Cabe ressaltar, ainda, a inexistência de qualquer sistema de combate a incêndio. Nos dias de calor, devido à falta de aeração natural e artificial a temperatura do prédio aumenta e torna insuportável a atividade escolar.

O prédio onde funciona a escola é alugado pelo poder público, e o valor da locação é de R$ 22 mil, por mês. Devido à situação encontrada, o MPPA, através da 4º PJ de Improbidade Administrativa de Parauapebas requereu ao Juízo a expedição de ordem judicial determinando que o Estado providencie, no prazo de 30 dias, local adequado e na mesma localidade para transferir os alunos; a colocação de anteparo entre a sacada da escola e a rede elétrica, sem negligenciar a iluminação e a aeração do prédio; a lotação de pessoal para o preparo da merenda escolar, e de pessoal para realizar a segurança da escola.

No caso de descumprimento de qualquer das medidas citadas, o MPPA pede o pagamento de multa diária de R$ 3.000,00, com recursos que seriam utilizados à propaganda institucional do Estado. Outro pedido feito pelo MPPA na ação é que o Estado seja obrigado a informar, no prazo de 10 dias, a previsão de gasto com propaganda institucional para o ano de 2018, na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), além de esclarecer quanto já foi gasto até o presente momento pelo Executivo, e pelas pessoas jurídicas descentralizadas que fazem parte da estrutura estadual. Em caso de descumprimento, a multa deverá ser de R$ 500,00 quinhentos reais ao dia, a serem pagos também com as verbas destinadas à propaganda institucional do Estado.

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