Disputa por território leva 5 travestis para delegacia em Marabá

Elas denunciam que são ameaçadas com facas por colegas para poder fazer ponto em praça pública na Nova Marabá, com cobrança de até R$ 40,00 por dia

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Medo e tensão rondam o mundo das travestis em Marabá. Na madrugada do último domingo, dia 29 de abril, uma delas, Dani Alves Nunes da Silva, sofreu tentativa de homicídio e precisou se fingir de morta para conseguir escapar. Está internada até hoje no Hospital Municipal de Marabá e seu estado ainda inspira cuidados.

Nesta quinta-feira, dia 3, o delegado Vinícius Cardoso das Neves, diretor da 21ª Seccional Urbana de Polícia Civil em Marabá, recebeu um grupo de cinco travestis que foi denunciar ameaças que vêm recebendo de outras colegas. Fernanda Santos, 23 anos, Izabela Ferreira, 18, Giselle Torres, 23, Rakell Silva, 24 anos e Lohane Cavalcante de Souza foram as autoras da denúncia.

O grupo foi acompanhado por Noé Lima, presidente do Grupo Atitude LGBTI Marabá, mas que está residindo atualmente em Belém. Noé diz que veio acompanhar de perto o caso de Dani Alves e, paralelamente, motivou as cinco travestis a denunciarem as ameaçam que vêm sofrendo por parte de outras duas colegas: Nicolly Kidman e Thifanne Sena.

Lohane Cavalcante conversou na noite desta quinta-feira com a Reportagem do blog e explicou todo o drama que elas vêm sofrendo no entorno da Praça Monsenhor Baltazar, na Folha 16, Nova Marabá. Tudo começou, segundo Lohane, há cerca de um ano, quando ela foi denunciada na delegacia por outra colega, que a acusou de estar explorando meninas na rua, inclusive cometendo agressão. “Tudo era mentira. Na verdade, eu estava defendendo as colegas (outras travestis) que precisam da noite da para trabalhar honestamente. Essas duas meninas, Nicolly Kidman e Thifanne Sena, estão tocando o terror na galera”.

Questionada sobre o que é “tocar o terror”, Lohane diz que as duas cobram entre R$ 20,00 a R$ 50,00 para outras travestis poderem fazer ponto no entorno da Praça, onde há a maior concentração delas na cidade durante a noite e por onde clientes em potencial passam.

A ameaça, segundo Lohane, é feita com uso de arma branca (faca ou facão) e ela mesma já foi vítima uma vez. “Agora, não, porque não preciso mais trabalhar na rua. Eu tenho outro negócio, com anúncio através de páginas de relacionamento”, revela.

A motivação para ir à delegacia ocorreu após duas meninas do grupo de Lohane terem sido ameaçadas esta semana por Nicolly e Thifanne, que teriam chegado à praça armadas de facas e exigindo dinheiro. “Ainda bem que elas já estavam preparadas e tinham um facão escondido ali perto e partiram para cima das duas, que queriam cobrar taxa pelo uso do ponto. Minhas amigas, que dependem daquele trabalho para sobreviver, colocaram as duas para correr e depois disso fomos para a delegacia”, diz.

Para diminuir custos, Fernanda, Izabela Giselle, Rakell e Lohane alugaram uma casa e montaram uma república. Além de dividirem as despesas, elas se protegem mutuamente e agora lutam para que não haja cobrança e nem ameaças por atraírem clientes na praça, que é pública.

Procurado ontem à noite pela Reportagem do blog, o delegado Vinícius afirmou que a Polícia Civil está investigando o caso de Dani e ele mesmo ouviu atentamente os relatados das cinco travestis e revela que designou uma investigação de ambas as situações. “Todos os casos envolvendo homofobia ou qualquer tipo de discriminação vêm sendo reprimidos de forma contundente pela Polícia Civil em Marabá”, garantiu.

SOBRE O CASO DANI

Noé informou ontem à noite que visitou a amiga Dani no Hospital Municipal e, embora já tenha melhorado, seu estado de saúde ainda é delicado. Ele reconhece que a Polícia Civil está cumprindo seu papel e espera que os responsáveis pelo crime sejam identificados e punidos.

Ontem mesmo a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis Transexuais e Intersexos (ABGLT) publicou nota de Repúdio à tentativa de homicídio de Dani. Acompanhe parte da nota.

A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis Transexuais e Intersexos (ABGLT) é uma organização brasileira fundada em 31 de janeiro de 1995 com o objetivo e a missão de “promover ações que garantam a cidadania e os direitos humanos de LGBTs, contribuindo para a construção de uma sociedade democrática, na qual nenhuma pessoa seja submetida a quaisquer formas de discriminação, coerção.

 A ABGLT manifesta todo seu repúdio à tentativa de assassinato da travesti Dani, ocorrida na madrugada do último dia 29 de abril. Dani foi espancada a pauladas de forma covarde e brutal e este caso, somado às diversas agressões e assassinatos a LGBT em Marabá e região, representam a face mais cruel da violência sofrida pela população LGBT diariamente.

Segundo a ONG Transgender Europe (TGEU), em pouco mais de seis anos, 604 pessoas travestis e transexuais foram mortas no Brasil, número que lança o país no topo da lista mundial da violência contra essa população. Por outro lado o Brasil também lidera o ranking de acessos a pornografia trans, o que reflete a maneira como a sociedade nos trata: dominando nossos corpos considerados abjetos para o acesso a direitos e objeto para deleite de homens de bem que são os mesmos perpetradores de nossas exclusões.

É inconcebível que pessoas ainda sejam violentadas em razão de sua identidade de gênero e orientação sexual, passados quase 70 anos de vigência da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Em 1948, já se enunciava o direito à igualdade, à vida e segurança pessoal, a absoluta proibição à tortura e ao tratamento desumano.

A ABGLT através de suas representações regionais e afiliadas locais acompanhará os casos exigindo justiça imediata a necessária responsabilização dos perpetradores da brutal e inaceitável violência e continuará bradando aos detentores do poder pelo povo outorgado a promover nosso acesso à cidadania implementando imediatamente o Conselho Municipal dos direitos da População LGBT e em paralelo as politicas publicas a esta população”.

A nota é assinada por Symmy Larrat, presidente da AGLBT.

Beto Paes, gerente de livre educação sexual da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Estado do Pará, além de Bruno Gomes, militante do movimento LGBTI, e membro do Grupo Atitude LGBTI de Marabá, também expressaram repúdio pela agressão sofrida por Dani e pediram investigação e prisão dos responsáveis de forma célere.

Por Ulisses Pompeu – de Marabá

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