“Pode mandar o soro antiofídico”. Era o que dizia o telegrama enviado pelo geólogo Breno dos Santos, de Belém, no Pará, ao geólogo americano Gene Tolbert no Rio de Janeiro. A mensagem, na verdade, era um código usado na época para driblar a espionagem de empresas e avisar sobre a descoberta de jazida de manganês. O ano era 1967 e a jazida também estava presente em Carajás, que se tornaria a maior e mais rica província mineral conhecida do mundo com presença não só de ferro, mas de outros minerais como cobre e níquel.

Um mês antes, a presença de minério de ferro havia sido descoberta. Breno pousava em uma das diversas clareiras avistadas de cima da floresta amazônica no sudeste do Pará. Na época, Breno era o líder de equipe, também composta pelos geólogos Erasto de Almeida e João Ritter, que faziam parte da US Steel, empresa que procurava minério de manganês na Amazônia para suas fábricas nos Estados Unidos. No dia 31 de julho de 1967, enquanto seu helicóptero era abastecido, Breno bateu com o martelo em uma das pedras presentes ali e uma poeira avermelhada saiu. “Percebi que era ferro. Então pensei: ‘Uau, isso é tudo ferro!?'”, relembra.
A descoberta mudaria a história e colocaria o Brasil no mapa da mineração do mundo. “A vida me deu a chance de sonhar, antes de todos, que poderia haver um grande potencial em minério de ferro na região. Ter vivido aquele momento não tem preço. Tenho muito orgulho de ter participado da equipe, que desenvolveu teorias e tecnologias, para a descoberta dos depósitos de minérios em Carajás”, conta Breno.
Dezoito anos depois da descoberta, o Projeto Ferro Carajás seria inaugurado. A iniciativa inédita na região amazônica, no sudeste do Pará, mobilizou mais de 27 mil pessoas para a construção de mina e usina, no sudeste do Pará; porto, em São Luís; e a ferrovia ligando os dois estados. Hoje, 40 anos depois da inauguração do Complexo Minerário de Carajás, a Vale, umas maiores empresas de mineração no mundo, direciona o olhar para a produção de minerais essenciais para a descarbonização, o combate às mudanças climáticas e para um futuro mais sustentável.
A empresa lançou este ano o Programa Novo Carajás, que reúne um conjunto de projetos e iniciativas voltados à retomada e manutenção dos volumes de minério de ferro de alta qualidade e à expansão da produção em cobre. O objetivo é atender à crescente demanda global por minerais críticos necessários à redução das emissões de carbono e ao processo de transição energética. O programa prevê investimentos de R$ 70 bilhões em cinco anos (2025-2030), em linha com as projeções de produção e de investimento já divulgadas ao mercado e atualmente em vigor.
“O material de maior qualidade, com maior teor de ferro de Carajás, aumenta a eficiência do alto-forno das siderúrgicas, o que ajuda em rotas de produção de aço com menor emissão de carbono. A empresa tem como meta reduzir em 15% as emissões em sua cadeia produtiva na siderurgia até 2035”, destaca Gildiney Sales, diretor do Corredor Norte da Vale.
Operação e conservação
Parte das operações da companhia estão localizadas na Amazônia. No sudeste do Pará, o Mosaico de Carajás é composto por seis unidades de conservação em uma área de floresta amazônica que se agiganta por 800 mil hectares protegidos desde a decisão de implantar o projeto Carajás na década de 1980. Por imagens de satélite é possível ver que toda área ao redor do Mosaico foi sendo ocupada, restando apenas as áreas protegidas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) com o apoio da Vale.
O Mosaico se consolidou também como vetor do turismo ecológico e de bioeconomia na região e um dos espaços de maior geração de conhecimento científico no Brasil. As operações da empresa ocupam cerca de 3% deste conjunto. “Celebrar 40 anos de atuação da Vale na região é reconhecer que, no coração da Amazônia, mineração e conservação podem caminhar juntas — com ciência, tecnologia e, acima de tudo, com pessoas que acreditam no futuro”, destaca Gildiney Sales.
Deusimar da Silva Santos, 62 anos, nascido em Marabá, começou a atuar na guarda florestal antes mesmo da inauguração do projeto Ferro Carajás. “Essas áreas de florestas eram ainda áreas de pretensão para conservação ambiental, ou seja, ainda não eram constituídas como unidade de conservação, e eu já estava aqui atuando na guarda contra ações ilegais. Sinto uma alegria imensa por nesses 40 anos ter me dedicado ao trabalho de formiguinha, que resultou nessa preservação”, comemora ele.
Recuperação florestal com sabor amazônico
Dentro do conceito de futuro sustentável está também a Meta Florestal estabelecida pela empresa de recuperar 100 mil hectares e proteger outros 400 mil até 2030. Um dos projetos mais promissores desse compromisso é o da Belterra, start up apoiada pelo Fundo Vale que deverá fortalecer a produção de cacau no Pará, com mais 10 milhões de mudas plantadas e a geração de 60 mil toneladas de produção do fruto.

Reflorestamento é feito com geração de trabalho e renda associando espécies agrícolas e florestais. Registro do projeto Belterra apoiado pelo Fundo Vale. Foto: Divulgação
O projeto deverá recuperar mais de 20 mil hectares no Pará, gerando mais de dois mil empregos, porém o plantio não se resume a plantar mudas, mas adota o sistema de produção que consorcia espécies agrícolas para produção o ano todo com espécies florestais. “É um trabalho dedicado com a premissa de gerar renda e emprego, fomentando cadeias produtivas sustentáveis ao longo do processo de recuperação dos biomas e serviços ecossistêmicos e, também, permitindo, futuramente, o sequestro de carbono da atmosfera”, destaca a diretoria de Soluções para a Natureza da Vale, Patricia Daros.
Na mesma linha da conservação da Amazônia estão empreendimentos sociais que recebem o apoio da empresa. A ideia é contribuir com a diversificação econômica da região, com base na vocação local associada à conservação da biodiversidade. O resultado vem se transformando nos mais variados sabores e formas desenvolvidos por empreendedores locais na apicultura, fruticultura, produção de hortaliças e, ainda, estimulando a valorização do patrimônio cultural, a exemplo da Associação Filhas do Mel (Afma), Diamante Negro da Amazônia (Dinam) e Centro Mulheres de Barro.
“Antes, tudo era um sonho, hoje a Dinam incentiva e produz pimenta do reino de forma sustentável, fortalecendo a agricultura familiar, com produção de pimenta do reino aliada ao cacau e ao açaí. Manter essa floresta em pé representa vida”, diz Thaynara Vasconcelos. O mesmo sentimento tem Rosemir Ferreira da Afma: “As abelhas fazem parte da minha família. É fundamental cuidar e preservar as abelhas, que polinizam e geram florestas e a quase totalidade dos alimentos que vai às nossas mesas, além de nos dar a renda que extraímos do mel que elas produzem”.
Hoje com 85 anos, Breno dos Santos, que pôde acompanhar toda trajetória de Carajás, diz que Carajás segue sendo importante, ressaltando que o desenvolvimento baseado apenas na mineração será sempre temporário. “Tenho a alegria de ser a única pessoa, que teve a chance de acompanhar as descobertas e o desenvolvimento da região de Carajás, de julho de 1967 até hoje e o potencial de Carajás, com a sua diversidade mineral, segue sendo importante para a Vale, para o Brasil com a geração de divisas e para o mundo, como fonte de minério de ferro de alta qualidade. Importante que isso continue de forma equilibrada com o meio ambiente, como é o exemplo das unidades ambientais de Carajás, e com o desenvolvimento, inclusive de outras atividades econômicas junto com governos e sociedade”, conclui Breno.
Breno dos Santos participou esta semana de um encontro com jornalistas e pesquisadores no Instituto Tecnológico Vale (ITV), em Belém. Durante edição especial do Café com Ciência, Breno conheceu os laboratórios e pesquisas conduzidas pelo Instituto sobre desenvolvimento sustentável na Amazônia.
(Ascom Vale. Fotos: Arquivo pessoal Breno Santos e Divulgação)