Reintegração de posse da Fazenda Maria Bonita será até 17/9, diz juiz

Ocupada desde 2008, a fazenda fica em Eldorado do Carajás, palco do evento conhecido como Massacre de Eldorado do Carajás, em 1996

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Dia 17 de setembro, até as 9 horas. Esse foi o prazo fixado pelo juiz agrário de Marabá, Amarildo Mazutti, para o cumprimento da reintegração de posse da fazenda Maria Bonita, do grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas.

A área, ocupada em 25 de julho de 2008 por famílias do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) está  localizada em Eldorado do Carajás, palco do massacre de 19 sem terra por PMs, em 1996.

A decisão liminar para reintegração de posse foi tomada em audiência no último dia 11. Para fundamentá-la, Mazutti se embasou na decisão do governo Jair Bolsonaro, logo após a posse, de paralisar o programa de reforma agrária.

Com a suspensão, o Incra interrompeu as negociações com a AgroSB (antiga Agropecuária Xinguara), do grupo Opportunity, para a compra da área, de cerca de 5.500 hectares. Ali o MST distribuiu lotes a cerca de 226 famílias, rebatizando o local de acampamento Dalcídio Jurandir, uma homenagem ao escritor e militante comunista paraense.

A AgroSB negociou com o Incra e, apesar do empenho de ambos, a negociação não avançou para o objetivo proposto, e a AgroSB manteve a decisão de reivindicar na Justiça o cumprimento das liminares de reintegração de posse concedida há mais de dez anos”, afirmou a empresa, via assessoria de imprensa.

O juiz, em sua decisão em favor da AgroSB, afirmou: “O juízo não pode dispor de um direito que só cabe à parte [venda da área] nem tampouco cabe realizar políticas públicas de responsabilidade do governo federal e do Incra”. 

JURISPRUDÊNCIA

Mazutti não foi o único juiz a citar suspensão da reforma agrária para decidir contra os sem-terra. Em março, o colega Haroldo Silva da Fonseca determinou a reintegração de posse da fazenda Santa Lúcia, em Pau d’Arco (PA),palco de chacina de dez trabalhadores sem-terra por policiais civis e militares em maio de 2017

Na decisão liminar, Fonseca aceitou o argumento do proprietário, Honorato Babinsk Filho, que incluiu nos autos a circular do governo Bolsonaro de paralisia da reforma agrária. No último dia 25, em uma audiência, ele suspendeu a reintegração e marcou uma vistoria judicial para este mês.

Segundo estimativa da CPT (Comissão Pastoral da Terra) em Marabá, somente no sul e sudeste do Pará há pelo menos 20 áreas em situação semelhante e, portanto, sujeitas à reintegração de posse. Com isso, cerca de 4.000 famílias correm o risco de ser despejadas nos próximos meses.

Neste ano, já houve duas reintegrações de posse na região. Para setembro, além da fazenda Maria Bonita, há outra reintegração marcada no município de Breu Branco, de acordo com a CPT.

“Durante um tempo, a gente conseguia comprovar que existia um acordo, que as famílias que seriam assentadas eram as mesmas que seriam retiradas se acontecesse a reintegração de posse”, afirma advogada da CPT em Marabá Andréia Silvério, que defende os sem-terra de Eldorado do Carajás. 

“Agora, por causa dessa determinação de suspender a reforma agrária, os juízes estão entendendo: ‘Já que isso não vai ser resolvido administrativamente, então a decisão é de devolver o suposto direito de posse pra pessoa que se identifica como proprietário da área’”, afirma. 

Nem todo o acampamento será despejado. Pela decisão liminar, a vila ficou de fora da reintegração de posse, assim como a fazenda Caroço do Olho, área contígua também de propriedade da Agrosb, empresa ligada ao grupo Opportunity. Com isso, estima o MST, a liminar provocará o desalojo de metade das 226 famílias.

​A fazenda foi tomada pelo MST durante o escândalo da Operação Satiagraha, que prendeu Dantas, acusado de corrupção e lavagem de dinheiro. Em 2009, a Justiça Federal chegou a determinar o sequestro de 500 mil hectares do grupo Opportunity no sudoeste do Pará, área equivalente a pouco mais do que três municípios de São Paulo.

Dois anos depois, porém, as provas que levaram à condenação de Dantas foram anuladas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a justificativa de participação irregular de agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) nas investigações. 

Via assessoria de imprensa, a AgroSB informou que, dos 500 mil hectares, 250 mil hectares estão preservados e outros 70 mil hectares, invadidos. A empresa diz que tem 20 mil hectares de plantações e 170 mil cabeças de gado.