Faepa apela à CNBB que interceda com os governos por solução para conflitos

Carlos Fernandes Xavier, presidente da Faepa, enviou carta ao novo presidente da CNBB, traçando um diagnóstico da situação no campo e relatando que a entidade tem ignorado seus apelos

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O presidente da Faepa (Federação da Agricultura e Pecuária do Pará), Carlos Fernandes Xavier, enviou, na última semana, carta ao novo presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), Dom Walmor de Oliveira de Azevedo. No documento, ele propõe “uma reflexão profunda” sobre as posições que algumas entidades “representativas” da Igreja Católica insistem em tomar, “sobretudo no âmbito dos conflitos agrários”. Xavier, que garante ser católico, afirma que sempre tem procurado o caminho cristão do diálogo e da cooperação e diz já escreveu muitas cartas à CNBB e à sua Regional Norte II, mas nunca teve resposta.

O presidente da Faepa afirma ter, em reiteradas oportunidades, se dirigido às autoridades constituídas do Estado, apresentando propostas concretas objetivando a solução efetiva para assentar as famílias que precisam de terra para produzir e plantar e, dessa forma, garantir a própria subsistência e contribuir, também, com a produção de alimentos necessários ao atendimento da demanda populacional.

Diz ainda que o objetivo dessas providências seria “acabar com os conflitos fundiários, as disputas pela posse da terra, nas quais os alvos preferenciais são os produtores rurais que aceitaram os desafios de desenvolver projetos capazes de gerar empregos, renda e a segurança alimentar do nosso povo”.

Carlos Xavier destaca que, em nota publicada no último dia 16, o jornal “O Liberal”, na coluna “Por dentro”, assinada pelo jornalista Ronaldo Brasiliense, dá ênfase a um levantamento feito pelo historiador Airton Pereira dos Reis, da UFPA, baseado em “dados coletados” pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), órgão da CNBB, sobre os “massacres” no campo, em território paraense sobretudo, no período compreendido entre 1970 e 2018.

O presidente da Faepa lembra, entretanto, que em 2005, o então presidente do Tribunal de Justiça do Estado, desembargador Milton Nobre, resolveu que fossem apuradas todas as denúncias feitas pela CPT e pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetagri) sobre a violência no campo.

Foi criada uma comissão interinstitucional e Milton Nobre, segundo consta na carta, solicitou a ambas as entidades o envio, ao Poder Judiciário, de relatório em que ficassem indicados todos os crimes supostamente cometidos em razão da disputa de terras, que, naquele momento, indicavam ser mais de 700. “Apenas a Fetagri enviou o documento, que apresentava um número infinitamente menor. A CPT, como sempre o fez, se omitiu na hora de ser chamada à responsabilidade”, narra Xavier.

“Da criteriosa análise procedida pela Justiça e acompanhada pelas entidades interessadas, inclusive OAB e Ministério Público, restou a existência de menos de 100. E – pasme – Excelência Reverendíssima — entre os listados como resultantes de conflitos agrários estavam crimes passionais, assassinatos por embriaguez ou brigas de bar, latrocínios não associados às disputas pela posse da terra e rixas políticas”, conta o presidente da Faepa ao presidente da CNBB.

“Tenho solicitado que consultem o site do Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – para que se encontrem os dados indicativos da existência de 109.482 lotes [disponíveis] capazes de abrigar os cidadãos que estejam dispostos a produzir no campo”, lembra Carlos Xavier.

Na carta, ele informa a Dom Walmor de Oliveira que existem 1.132 lotes em Projetos de Assentamentos com uma área total de 22.819.671 hectares, que poderiam receber 316.892 famílias.  Como comparação, ele cita o Estado do Paraná, “o maior no agronegócio nacional”, com apenas 19,9 milhões de hectares.

Nas estatísticas oficiais, ainda segundo o presidente da Faepa, aparecem registradas 207.410 famílias. “Embora seja do conhecimento geral que existe um número expressivo de evasão dos assentados. A área média dos lotes é de 80,54 hectares, superior, inclusive, ao tamanho da média das propriedades no Brasil, que é de apenas 74 hectares”, destaca e indaga: “Como conceber, pois, que, no Pará, existam cerca de 1.500 propriedades invadidas, quando há disponibilidades de lotes?”.

Em outro trecho da carta Xavier assinala que, em 2016, o Tribunal de Contas da União identificou fraudes no programa de reforma agrária beneficiando 578 mil famílias, causando um rombo no Tesouro Nacional superior a R$ 2,5 bilhões. “Havia políticos, ricaços, pessoas falecidas [cerca de 37 mil] e a CPT não tugiu nem mugiu sobre o tema. Mas, nós, expressamos o nosso repúdio a esse novo capítulo da corrupção instalada no governo que a ala esquerdista do catolicismo apoiou”, alfineta novamente a CPT, o presidente da Faepa.

Carlos Fernandes Xavier cita vários episódios ocorridos no campo como a morte da missionária norte-americana Dorothy Stang, a quem acusa de ter sido uma “agitadora no meio rural, incentivando invasões e o confronto armado”; cita a condenação do bispo do Xingu, Dom Erwin Krautler, “por incitamento à violência”; fala do conflito da Curva do “S”, quando, segundo ele, uma tropa fardada foi colocada para correr, por invasores; e, recorda o recente episódio de Pau D’Arco, afirmando que “estão tentando mudar a trajetória dos fatos, trocando os bandidos como trabalhadores. Trabalhadores de que? Do crime?”, indaga.

Ao final da carta Carlos Fernandes Xavier afirma ter certeza de que a violência no campo do Pará é provocada “por este grupo que alega ter o apoio da própria CNBB” e reitera para que, juntos, CNBB, governo do Estado, Iterpa, governo federal/Incra, Judiciário, Ministério Público do Estado e produtores instalem um Grupo de Trabalho.

A finalidade seria “identificar o número de lotes de reforma agrária disponíveis mais próximos dos que realmente precisam de terra, assentem os mesmos com segurança, e que possamos disponibilizar assistência técnica e capacitação pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) de forma gratuita”.

“Desse modo, esperamos que essa proposta seja levada ao Governo do Estado e ao Governo Federal para que possamos chegar ao termo desse cenário que não interessa à sociedade paraense”, finaliza a carta de Carlos Fernandes Xavier a Dom Walmor de Oliveira de Azevedo.