Ex-catador de um dos maiores aterros sanitários abre a Semana do Meio Ambiente

Ativista e protagonista do documentário “Lixo extraordinário”, Tião Santos compartilhou um pouco sua trajetória como simples catador até chegar ao glamouroso tapete vermelho do Oscar

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Ele é um carioca de Duque de Caxias que, aos 39 anos, carrega na bagagem uma infinidade de histórias de superação, determinação e exemplo a ser seguido. Filho de mãe solteira, Tião Santos teve seu primeiro contato com o lixo com apenas 11 anos de idade. Desde então, a convivência com resíduos e com outros catadores foi ficando cada vez mais intenso, tanto que, aos 19 decidiu tornar-se definitivamente um catador de recicláveis, como gosta de ser chamado.

Um pouco de sua trajetória foi compartilhada com a sociedade durante uma palestre ocorrida na tarde desta terça-feira (5), no auditório da Casa da Cultura de Canaã dos Carajás, onde um dos objetivos era conscientizar a plateia acerca da importância da valorização do lixo e do uso consciente do plástico. “Quero desmitificar essa coisa de que tudo o que a gente produz é lixo”, disse ele ao iniciar sua fala.

Explicou que o título da palestra – “Lixo ou Desperdício?” – é uma provocação para levar as pessoas a se questionarem sobre o que, de fato, é lixo, e o que não é, e qual é o papel da sociedade enquanto geradora, produtora, consumidora.

“Será que meu papel é simplesmente separar o lixo e colocar na minha porta enquanto o caminhão passa? E qual o impacto social-ambiental disso, para onde o lixo vai?”, questionou Tião.

Afirmou que o lixo não vai para uma galáxia diferente, disse que não existe “jogar fora” e lembrou que tudo fica dentro de um planeta chamado Terra. “Então, eu preciso me questionar ‘qual é o meu papel enquanto consumidor?’”, indagou.

“Eu não sou catador de lixo, sou catador de material reciclável. Porque lixo é aquilo que não tem serventia para nada, eu reciclo um produto que vai virar uma matéria prima e que vai virar um novo produto. Eu sou o cara que faz o trabalho de reciclagem, mas até eu nunca tinha percebido o valor da minha profissão. Tudo se aproveita”, destacou.

Tião Santos protagonizou “Lixo Extraordinário”, um documentário indicado ao Oscar, que retrata o trabalho do artista plástico brasileiro Vik Muniz e mostra o trabalho de catadores de material reciclável em um dos maiores aterros sanitários do mundo, localizado em Duque de Caxias (RJ).

“A indicação ao Oscar aconteceu na minha vida e foi uma coisa surreal. Então, eu vejo muito isso como uma missão. A sociedade não valoriza certas atividades, eu não queria ser catador, minha paixão pela profissão surgiu a partir de um seminário sobre sustentabilidade”, conta ele.

Antes, explica Tião, a visão que tinha de reciclagem sempre foi uma “visão pobre das coisas”. “Uma mãe não leva seu filho para o lixão porque ela queria salvar o planeta, a minha mãe levava os sete filhos para lá por causa da pobreza, da exclusão social”, disse.

Tião Santos afirma que é um catador que vai se transformar em um sociólogo, mas nunca vai deixar de ser um catador. “O que eu aprendi no lixão, faculdade nenhuma vai me proporcionar. Então, eu vou ser catador para o resto da minha vida”, reforçou.

“O lixo é muito mais um preconceito da nossa sociedade do que o que a gente produz. Porque, 40% do que a gente produz é material reciclável, 45% é matéria orgânica que depois será transformado em um dos melhores adubos, por exemplo. Os outros 15%, você pode usar na incineração e transformar em energia”, ensinou ele.

O palestrante afirma que as pessoas precisam entender que todos produzem bilhões de toneladas de lixo e que isso ocupa um espaço físico na Terra, gera impacto social, ambiental e econômico. Porém, aquilo tudo que cada pessoa gerou de resíduos, se for destinado à reciclagem, ao invés de gerar impacto negativo na sociedade, vai se transformar em trabalho, renda, inclusão social, proteção ambiental e economia.

“Isso já deu certo em outros países. O que nós aqui chamamos de lixo, em outros países é chamado de resíduo e movimenta bilhões de reais”, acrescentou.

Aplaudido após a exibição de um trecho do documentário e depois de uma pequena amostra de que o trabalho com lixo lhe proporcionou, o ativista foi aplaudido diversas vezes e aproveitou para deixar uma mensagem para mundo: “Não olhe o resíduo como despesa, olhe como receita. É preciso romper com o paradigma de que reciclagem é coisa de gente pobre, os países mais ricos do mundo são os que mais reciclam”. A presença de Tião Santos em Canaã faz parte da Programação da Semana de Meio Ambiente que iniciou ontem (5).

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