Artigo: Revogação da MP 905/19 e as consequências para o trabalhador

A Medida Provisória 905/19, que instituía o "Contrato Verde Amarelo", foi revogada pelo presidente Bolsonaro

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A partir da edição da Medida Provisória nº 905/19, que tinha o condão de criar o denominado “Contrato Verde e Amarelo”, onde o Governo Federal se propunha a reduzir o desemprego no País, principalmente incentivar a contratação de jovens por meio de uma menor cobrança de encargos na folha de pagamento, como: isenção de contribuição previdenciária, de salário-educação e contribuições sociais destinadas ao chamado “Sistema S”, muitas empresas aderiram a esta nova modalidade de contratação, iniciando assim uma nova era no que se refere à aplicação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e legislações de setores específicos.

Entretanto, o Governo Federal não contava com a pandemia desencadeada pelo novo coronavírus, que transformou 2020 em um ano totalmente atípico, onde o mundo já não é mais o mesmo, muito menos as relações de trabalho, emprego e renda.

Não deu outra. Diante do novo cenário estabelecido pela pandemia, a Medida Provisória não foi objeto de votação pelo Senado Federal, obrigando o Presidente da República a revogá-la em sua totalidade antes de sua data limite, qual seja, 20/204/2020, sob pena de se assim não o fizesse, se ver impedido de editar nova regra a respeito do assunto conforme determina o §10 do artigo 62 da Carta Magna.

Com a edição da Medida Provisória 905/19 e a consequente criação do chamado “Contrato Verde e Amarelo”, uma das mais importantes alterações procedida na legislação que rege as relações de trabalho se deu na revogação do artigo 21, inciso IV, alínea “d” da Lei nº 8.213/91, em que, de acordo com a referida normativa, equipara-se a acidente de trabalho todo aquele que ocorrer “no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado, sendo que a partir da revogação da cita MP 905, restabeleceu-se o direito que havia sido suprimido, configurando assim importante benefício em favor do trabalhador, inclusive no que se refere à estabilidade empregatícia.

Destacamos o fato de que durante a vigência da MP 905/19, os direitos trabalhistas e previdenciários relacionados com acidentes ocorridos no percurso entre a residência do trabalhador e seu local de trabalho e vice-versa, não puderam mais ser exercidos, inclusive no que se refere ao auxílio doença, devido a partir do 16º dia de afastamento, situação esta que refletia diretamente nos direitos previdenciários relacionados com os eventos morte, cálculos de benefícios, carências, estabilidade e indenizações, dentre outros.

Fica uma pergunta, cruel, atroz e avassaladora! Quanto aos contratos de trabalho firmados sob a modalidade estabelecida pela MP 905/19 a partir de 01 de janeiro de 2020, com a revogação da medida provisória, eles permanecem válidos?

Ao nosso entender sim. Explico. Segundo o artigo 62, caput, da Constituição Federal, as medidas provisórias editadas pelo presidente da República têm força de lei e, tal como as leis ordinárias, delegadas e complementares, produzem seus regulares efeitos até que sejam analisadas pelo Congresso, sendo que a revogação da MP 905/19 não desconstituiu os atos jurídicos praticados durante a vigência da mesma, vez que não há o que se falar em perda dos efeitos jurídicos e legais por ela (MP 905/19) produzidos durante o período em que esteve vigente.

Entender de forma contrária seria o mesmo que validar a aplicação do efeito da retroatividade dos efeitos, onde com a revogação da norma, todos os efeitos legais por ela produzidos seriam considerados perdidos desde sua edição pelo Presidente da República, o que convenhamos não merece nenhum crédito, pois se assim o fosse, nenhum empresário ariscaria formalizar contratos sabendo que acaso a medida provisória não fosse convertida em lei ordinária, os atos jurídicos celebrados perderiam validade por expressa ausência de previsão legal.

Por certo que as empresas que firmaram os chamados “contratos verdes e amarelos” devem prosseguir cumprindo-os nos seus exatos termos, respeitando assim as determinações legais estabelecidas na MP 905/19, em total respeito ao ato jurídico (contrato) firmado, eis que ao tempo de sua celebração, era perfeito, o que de pronto garante a segurança das relações contratuais firmadas.

Quanto ao cerne deste artigo, ou seja, as implicações decorrentes da revogação da medida provisória 905/19 em relação aos trabalhadores, o entendimento de que os contratos firmados sob a égide da referida norma devem ser cumpridos em sua totalidade, inclusive no que se refere aos chamados “acidentes de percurso”, onde todos os eventos de tal monta ocorridos durante a vigência da citada MP, não podem ser considerados como acidentes de trabalho conforme disposto no artigo 21, inciso IV, alínea “d” da Lei 8.213/91, não estando as empresas que firmaram tais contratos, obrigadas as emitir os comunicados de acidente de trabalho, posto que não se aplica o princípio da retroatividade no caso.

Por fim, ao nosso entender, com a ocorrência da revogação total da Medida Provisória 905/19, restabeleceu-se o direito do trabalhador ter considerado como acidente de trabalho aquele evento (acidente) ocorrido entre o percurso de sua residência e seu local de trabalho e vice-versa, cabendo às empresas, quando for o caso, emitir o competente comunicado de acidente de trabalho, garantindo ao obreiro os direitos daí decorrentes, inclusive aqueles vinculados à estabilidade e benefícios previdenciários.

Por Wellington Alves Valente – Advogado – Sócio do Escritório Valente & Reis Advogados e Consultores Associados.