ANM já fiscalizou 41 barragens no Pará este ano

Informação foi dada na reunião da Comissão de Barragens da Alepa, em que diretores da agência compareceram em peso enquanto apenas três deputados marcaram presença

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ANM afirma a deputados que todas as barragens do Pará têm plano de segurança. Mas órgão admite muitos problemas para trabalhar.

De janeiro deste ano para cá, 41 barragens de mineração no Pará já foram fiscalizadas pela Agência Nacional de Mineração (ANM). Até dezembro, a projeção é de que outras 29 passem pela fiscalização, totalizando 70 barragens vistoriadas no Estado. Por enquanto, nenhuma anormalidade na estrutura dos empreendimentos foi detectada e todas aquelas de alto risco apresentaram plano de ação emergencial, também chamado de plano de contingenciamento de barragens.

Esses foram alguns dos dados apresentados por diretores nacionais da ANM à Comissão Externa de Barragens da Assembleia Legislativa em audiência realizada no início da noite desta quarta-feira, 29, e que contou com a presença de apenas três deputados integrantes da comissão: Marinor Brito (PSol), presidente, professora Nilse (PRB) e Dirceu Ten Caten (PT), que devido a outros compromissos precisou se retirar antes do final da reunião.

E a ANM mandou representantes em peso para a audiência: Eduardo Souza Leão, Débora Puccini e Tomás Antônio Pessoa Filho, que chegaram acompanhados pelos gerentes regionais Maria do Rosário Costa, do Pará, e Serafin Carvalho Melo, do Mato Grosso; José Antônio Alves dos Santos, superintendente de Produção Mineral da sede em Brasília; e Alex Rodrigues de Freitas, chefe do Serviço de Segurança de Barragens de Mineração no Pará.

Segundo os diretores da ANM, 108 barragens no Pará estão cadastradas na agência, das quais 38 apresentam potencial alto de risco. Dessas, 24 foram construídas pelo alteamento à montante, método em que o próprio material de rejeito é usado para a construção dos degraus, o que desde 2016 é proibido no Brasil, mas que não impediu a tragédia na cidade mineira de Brumadinho em janeiro deste ano.

Alex Freitas informou que das 24 com alteamento à montante, falta fiscalizar somente uma: a da Serabi Mineração, em Itaituba, de potencial médio de risco. O diretor esclareceu ainda que, apesar de a programação de fiscalização neste ano ter catalogado 70 barragens por ordem de prioridade, nada impede que a ANM estenda o trabalho para outros empreendimentos.

Durante a audiência, uma das maiores preocupações manifestadas por Marinor Brito foi com o plano de ação emergencial, para ser usado em caso de rompimento de barragem.  Ela relatou aos diretores a situação encontrada em Parauapebas, onde, na visita às barragens do Gelado e do Geladinho, os deputados constataram o medo que assombra as famílias que residem na área desde a tragédia em Brumadinho.

“As pessoas estão apavoradas”, alertou a presidente da comissão. “A nossa preocupação também é encontrar mecanismos para tranquilizar e/ou tomar providências para que as pessoas se desloquem desse corredor”, acrescentou Marinor, para quem os planos de ação em Parauapebas não oferecem segurança às famílias. “A distância a ser percorrida pela comunidade entre o local do toque da sirene e o espaço teoricamente reservado para a segurança são mais de dois quilômetros. Até lá, já morreu. Estão sendo fiscalizadas essas rotas de fuga?”, questionou a parlamentar.

E foi com surpresa que os deputados receberam a informação de que essa fiscalização não compete à ANM. “Ele (plano) não é analisado por nós”, esclareceu Débora Puccini. A fiscalização das rotas deve ser feita por órgãos estadual e municipal, como secretarias de Meio Ambiente e Defesa Civil, conjuntamente com a mineradora.

“O nosso amparo legal é apenas cartorial”, disse Eduardo Leão. Ele solicitou audiência ao Ministério do Meio Ambiente, para a qual aguarda resposta, com a finalidade de tratar desse assunto. A proposta é criar uma rede, com envolvimento de todos os órgãos, para fiscalização e acompanhamento dos planos de ação das mineradoras.

Mais surpresos ficaram os deputados quando Débora Puccini também esclareceu: “É preciso ficar claro que o monitoramento da barragem é de responsabilidade total da empresa”. Para reverter isso e tantas outras situações expostas na audiência, é preciso mudança na legislação mineral do Brasil, o que deverá constar nas propostas do relatório final da Comissão de Barragens da Alepa.

Herança maldita

Na audiência, os diretores da ANM fizeram uma explanação sobre as dificuldades da agência para o trabalho de regulação da mineração no País, e aproveitaram para pedir apoio do Legislativo em âmbito estadual e nacional para fortalecer a agência, criada em dezembro de 2017 pelo então presidente Michel Temer, em substituição ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

Mas na prática a ANM só começou a funcionar neste ano, com o atual governo, segundo os diretores. E o que eles estão enfrentando para a modernização e funcionamento do órgão independe do esforço concentrado da nova diretoria, frisou André Leão. Para começar, a ANM herdou 190 mil processos do DNMP, que estão todos literalmente no papel.

“Nós não temos quase nada digitalizado. Hoje, tudo na agência é papel. São 190 mil processos físicos. Isso é uma grande perda de tempo pra gente”, disse André Leão. E, segundo ele, a digitalização de todos os processos foi orçada em cerca de R$ 23 milhões, para um orçamento anual de R$ 60 milhões. “Vinte milhões (de reais) são só pra gente existir”, garantiu o diretor. Ou seja, são recursos para pagamento de despesas cotidianas, como luz, água, aluguel, e manutenção.

Outro grande problema é o número reduzido de servidores especializados. O Pará, por exemplo, conta com apenas quatro técnicos de barragens. “O déficit de servidor é gritante”, disse André Leão. “Apesar de termos recebido um quadro de servidores altamente experientes e técnicos, nós também herdamos todos os problemas inerentes àquele departamento envelhecido e tão maltratado pelos governos ao longo dos anos”, arrematou o diretor Tomás Antônio Pessoa Filho.

Até 2018, a ANM contava com apenas 12 servidores para fazer monitoramento das barragens em todo o País. Neste ano, conseguiu mais 12, número ainda muito aquém das necessidades.

Em todo o País, a atual diretoria ainda enfrenta dificuldade inclusive para reorganizar os servidores da agência, cuja organização não era unificada, cabendo a cada gerência estadual estabelecer uma linha de ação. Com isso, os resultados eram pouco efetivos, conforme admitido pelos novos diretores.

“Agora que agência está criando seus próprios procedimentos, sua própria estrutura. E é difícil para o servidor entender sua forma de organização. Às vezes, eles se pegam procurando uma estrutura administrativa que nem existe mais”, contou Pessoa Filho, para destacar a necessidade de capacitação dos servidores. “Por mais técnicos que sejam, eles não entendem de regulação”.

Repasse da Cfem

Ao reconhecer que os servidores “realmente têm que desencarnar da cultura do DNPM” e que as melhorias na agência começam a acontecer, a gerente regional da ANM no Pará, Maria do Rosário Costa, citou um exemplo de como o órgão estava praticamente inerte. De 60 acordos de cooperação técnica assinados com prefeituras, apenas 15 estavam em vigor.

Após um trabalho de reaproximação com as prefeituras, os 60 acordos foram retomados. “Parauapebas não estava vigente. Para nós, foi uma surpresa”, disse Maria do Rosário, para informar que o acordo com a cidade dos minérios voltou a vigorar nesta quarta-feira, 29.

A gerente regional informou ainda que as fiscalizações concluídas em 2018 sobre o repasse da Compensação Financeira por Exploração de Minérios (Cfem) detectou o não repasse de R$ 35 milhões para o Pará. “Mesmo que a empresa pague não é corretamente”, assinalou Maria do Rosário.

Pela lei de criação da ANM, compete à agência arrecadar a Cfem, que segundo André Leão “sistematicamente não é repassada à agência”, obrigada a trabalhar com dotações orçamentárias aprovadas pelo governo. As informações sobre o repasse voltaram a chamar atenção de Marinor Brito, que cogita agora desarquivar o pedido para criação da CPI da Cfem.

“Essa questão ou remete para a Comissão de Meio Ambiente ou partirmos para uma CPI porque temos a certeza de que as informações não estão batendo. Já há um pedido de CPI, que está parado porque a mineração tem muita força no Pará”, declarou a parlamentar.

Por Hanny Amoras – Correspondente do Blog em Belém

Fotos: Assessoria de Imprensa/Alepa