Acelera e freia: artigo de L.F. Veríssimo no jornal Zero Hora

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Acontece muito na administração de clubes de futebol. Uma direção gastadora seguida por uma direção austera, uma aceleradora por uma freadora, uma irresponsável – ou “audaz” na sua própria avaliação – por uma realista. A gastadora gasta o que não tem, compra times de sonho e deixa o clube num buraco, do qual a austera precisa tirá-lo. Sacrifica-se então o futebol pela economia e a sensatez . O que geralmente não dá certo e leva a torcida a pedir audácia de novo, e outro acelerador na direção.

A analogia com o Brasil de Lula e de Dilma é quase perfeita. Como a torcida, no futebol, o povo se interessa por resultados, não por contas ajustadas. Os resultados vieram com Lula, as contas ficaram para Dilma. Os resultados foram evidentes – aumento do poder de consumo de quem antes não consumia, mobilidade social inédita, empregos em alta – mas as contas pertencem àquele nebuloso mundo do longo prazo e da estabilidade estrutural, nada menos palpável. Os resultados explicam, em parte, a popularidade de Lula, que ainda crescia no fim do seu governo. Não se sabe como a austeridade afetará a opinião nacional sobre Dilma.

A analogia só não é perfeita porque os ciclos de aceleração e freadas de um clube de futebol afetam o humor passageiro da sua torcida, enquanto a decisão de um governo de gastar mais ou menos mexe com a vida de uma nação inteira, e não apenas sua vida econômica. A opção de investir ou cortar é uma escolha ideológica do Estado, diferente da simples necessidade de evitar a falência ou desmoralização de um clube.

Num país que precisa crescer extraordinariamente, a ortodoxia econômica pode ser uma distração. Um governo cuja prioridade declarada é eliminar a miséria do país não pode fazer isso usando uma contabilidade convencional, ou a calculadora do inimigo. Ou talvez a audácia da Dilma seja fechar o cofre e, ao mesmo tempo, contratar o Ronaldinho Gaúcho.

Ou talvez tenha havido um entendimento, um testa a testa, entre Lula e Dilma na transmissão do cargo.

Lula – Você pisa no freio, sai do governo em desgraça e eu volto em 2014 nos braços do povo para acelerar outra vez.
Dilma – Combinado!

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